Onde Deixei o Meu Paletó?

Neoliberalismo quer dizer privatização. Que significa faturamento – da indústria, empresas, conglomerados financeiros. Faturamento quer dizer dinheiro. O liberalismo poderia ser a contrapartida. A convivência harmoniosa e democrática entre a estatização e a iniciativa privada. Sem que a estatização tivesse a necessidade de ser plena.

Mas o que nos trouxe ao neoliberalismo? E suas estratégias ou mecanismos, tais como a terceirização, privatizações em larga escala, o livre comércio, etc?

Houve o tempo em que o funcionário público era caracterizado por não ser encontrado em seu local de trabalho... onde deixava em seu lugar o paletó sobre a cadeira. Não vivíamos o tempo do neoliberalismo, havendo maior presença (mas não absoluta) do Estado quase em tudo. Nossos trens da EFCB (Estrada de Ferro Central do Brasil) transportavam mais de 800 mil passageiros por dia pelos subúrbios do Rio; nossa rede de colégios estaduais (Visconde de Cairú, Brigadeiro Schorcht, Orsina da Fonseca, João Alfredo – do qual me orgulho de ter sido aluno – Ferreira Viana, Bento Ribeiro, etc.) constituía-se das melhores escolas do Rio de Janeiro, sem falar no Instituto de Educação, da Escola Carmela Dutra, do próprio Colégio Militar e do Colégio Pedro II, este o “colégio padrão”, de âmbito federal – todos eles públicos; nossos hospitais públicos, liderados pelo HSE (Hospitais dos Servidores do Estado), onde vinham se tratar lideranças políticas de toda a América Latina, eram de maior eficácia que os de hoje, a julgar pelos inúmeros casos de pacientes que morrem na fila de atendimento ou pelos leitos improvisados pelos corredores das unidades.

Ah, ia mês esquecendo. Neoliberalismo também significa corrupção. No tempo em que havia melhores hospitais e escolas, em que se acertava o relógio pelo horário dos bondes, em que a malha ferroviária era maior, não só no Rio como em todo o país, em que dispúnhamos no Rio de duas Estradas de Ferro (Leopoldina e Central do Brasil), é claro que devia haver também corrupção. Mas não com os índices de hoje. Onde a nossa competência no ramo já é reconhecida até internacionalmente.

Então porque trocar o time que estava ganhando? Será porque alguns setores que teimam em se achar privilegiados não estavam ganhando o que achavam que mereciam? E assim inventaram que o funcionário público não trabalhava, pois não podia trabalhar quem ia embora e deixava o seu paletó na cadeira? Provavelmente atribuíam essa conduta à estabilidade do servidor público. O que tradicionalmente não existe no setor privado. Sim, bastava a empresa falir que as famílias de seus empregados faliam com ela. O que ocorre hoje com maior freqüência. Cadê o Carnet Fatura, o Sérgio Dourado, a Mesbla, a Sears? Reconheço que os dois primeiros são jurássicos. Mas os outros dois não são contemporâneos? E o que dizer das falências fraudulentas? Com os empresários fugindo com a sua grana para o exterior, e os desempregados, muitos com idade avançada, sem ter chance de uma nova colocação?

Então não adiantou toda aquela performance do serviço público, pelo menos nas áreas da educação, da saúde e dos transportes, três setores que ainda hoje funcionam de forma plenamente insatisfatória. Aqui, como no Chile, veio a ditadura e com ela as inconveniências e os males do neoliberalismo. Que fez com que eu acabasse me esquecendo de onde deixei o meu paletó.

Aluizio Rezende
Enviado por Aluizio Rezende em 06/12/2011
Código do texto: T3374750
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