Arnaldo Jabor, Michael Jackson e a Credibilidade da Imprensa

Basta conhecermos um assunto com certa profundidade para percebermos o quanto a imprensa, por vezes, presta um desserviço à sociedade ao desinformar o público sobre determinados temas.

Um perfeito exemplo disso é o comentário feito por Arnaldo Jabor sobre Michael Jackson e a condenação de seu médico a quatro anos de prisão por homicídio culposo, no último dia 29. O que se viu foi uma enxurrada de boatos perpetuados ao longo de toda a vida do cantor por tablóides de quinta categoria, tais como: ele era homossexual, fez plásticas para parecer a Diana Ross, queria ser branco. Todos repetidos assim mesmo, em tom de absoluta certeza, sem o benefício da dúvida, sem o mínimo comprometimento com a apuração dos fatos, da verdade.

O pseudo-jornalista em questão não se deu ao trabalho sequer de ler a autópisia de Michael Jackson onde constataria, em um documento oficial, que esse ser humano sofria de vitiligo, doença que causa a despigmentação da pele. Não buscou fontes que afirmam veementemente que Michael se interessava por mulheres, como seus ex-seguranças, seu falecido empresário Frank Dileo ( Michael Jackson, a vida de um ìcone,2011), amigos próximos,biógrafos. Isso para não citar entrevista concedida por sua ex-esposa Lisa Marie Presley, em 2010 à Oprah Winfrey em que deixa claro que ela e Michael viveram uma tórrida paixão, mantendo um relacionamento amoroso ainda por quatro anos após o divórcio. Bem, talvez Arnaldo Jabor nunca tenha visto um vídeo de Diana Ross, amiga íntima de Michael, negando que ele quisesse ficar parecido com ela, ou a própria entrevista do astro pop, também à Oprah Winfrey, falando sobre seus problemas de auto estima na adolescência, potencializados pelo comportamento de seu pai, ou sobre ser perfeccionista e evitar se olhar no espelho por nunca estar satisfeito. Realmente parece que ele só teve tempo de ler superficialmente algum site de fofocas, desses tantos que existem por aí, fazer um "resumo" e travesti-lo de jornalismo sério. Lamentável... e preocupante!

Para não evidenciar flagrantemente sua total falta de propriedade sobre o tema, ele acaba piorando o que já é horrível e decide incluir suas próprias conjecturas sobre a "tragédia do gênio enlouquecido" e afirma categoricamente: Michael morreu porque queria ser outra pessoa ( lê-se: homossexual assumido) e foi impedido pela indústria da música! Arnaldo Jabor preferiu ignorar a decisão de um júri e as palavras do próprio juíz do caso sobre o quão determinante foi a conduta de Conrrad Murray para a morte de Michael Jackson. " Dizer que se não fosse Conrrad Murray seria outro médico é desonrar toda a classe médica para qual Murray é uma vergonha,disse Michael Pastor ao proferir a sentença do médico, acrescentando que ele representa um perigo para a sociedade, pois abandonou seu paciente e adotou uma postura médica louca e irresponsável por dinheiro, fama, ou qualquer outro benefício que pudesse obter de sua relação com o Rei do Pop. O juíz ainda se mostrou particularmente indignado com a gravação feita pelo médico de MJ dopado, forte indício de sua intenção de tirar proveito financeiro de seu paciente famoso. Mas nada disso foi considerado para fundamentar as opiniões desse senhor que, ao meu ver, tornou-se uma vergonha para a classe jornalística ao adotar postura tão leviana, superficial e equivocada para discorrer sobre a vida e morte de um homem com um legado artístico e humanitário incomensurável para a humanidade. Chega a ser irônico notar que o único momento em que Arnaldo demonstra dúvida é quando diz não saber se Murray é culpado ou não. Isso é a única coisa que ele não sabe ao certo...

Arnaldo Jabor preferiu culpar a indústria musical pela agonia de Jackson e fingiu não saber o quanto a mídia sensacionalista o massacrou,num processo inescrupuloso de coisificação de sua imagem, transformando-o num objeto bizarro, a partir de mentiras deslavadas, pré-julgamentos escandalosos e posicionamentos tendenciosos. Michael foi destituído de sua condição humana e tratado como um animal exposto em um zoológico para ser escrutinado, observado, avaliado. Mais ainda, achincalhado, moralmente linchado. Tudo isso enquanto ele ajudava milhões de pessoas por todo o mundo e realizava feitos artísticos sem precedentes na história. Embora, eu particularmente não acredite que isso tenha diretamente matado Michael, acredito que o feriu profundamente.

Michael não queria ser outra pessoa. Simplesmente queria que soubessemos quem ele verdadeiramente era. E nesse sentido, não faltam apelos feitos por ele: " Não acreditem em tablóides, é lixo" , " Não sou Jacko, sou Jackson. Isso me machuca, eu sou humano" ( Entrevista à Barbara Walters, 1997), " Eu quero que as pessoas me vejam como um grande artista e amem o que faço. Só quero ser amado aonde quer que eu vá porque amo as pessoas de todas as raças em todo o mundo" ( Entrevista à Oprah Winfrey, 1993).

Infelizmente, condutas como a desse comentarista não são excessões na imprensa brasileira, muito menos restritas à Michael Jackson. Temas políticos, religiosos, econômicos e ideológicos certamente são abordados de maneira semelhante. Como disse, esse é apenas um ótimo exemplo de como podemos ser induzidos por maus formadores de opinião e acabarmos como fantoches dos interesses a que servem. É preciso mais do que nunca buscarmos informações, exercitarmos nosso senso crítico e só então chegarmos às nossas próprias conclusões!