Analise do voto do Ministro Ayres de Brito sobre a ADI 4277 – Que trata da União Homoafetiva.

Analise do voto do Ministro Ayres de Brito sobre a ADI 4277 – Que trata da União Homoafetiva.

Introdução:

O julgamento da referida Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI – 4277) deteve-se na analise, para a equiparação entre a união estável e a união homoafetiva, admitindo assim à possibilidade do casamento civil por conversão e à adoção conjunta.

Pode-se dizer que tal julgamento por parte do STF, foi um momento histórico no avanço do Direito de Família, dentro do ordenamento jurídico brasileiro, não apenas para os que fazem parte da população homossexual, mas para a sociedade como um todo, que de agora em diante pode-se dizer que tem um Direito de Família mais completo nos aspectos que visam garantir a igualdade de escolhas, para todos os membros da sociedade. Sendo assim, ficou esclarecido que a união homoafetiva representa uma entidade familiar e que dessa união devem decorrer direitos e deveres, como já acontece com a união estável em uma relação de homem e mulher, como vemos expostas no art. 1723 do CCB/2002 e na CF/88 em seu art. 226, § 3°.

O voto do Ministro:

Em seu enfoque inicial, o ministro Ayres de Brito fala sobre a ADPF 132, que tinha como pedido principal a aplicação por analógia do art. 1723 do Código Civil brasileiro às uniões homoafetivas, com base na denominada "interpretação conforme a Constituição". Foi requisitado que o STF interpretasse segundo a Constituição, o Estatuto dos Servidores Civis do Estado do Rio de Janeiro e declarasse que as decisões judiciais que negativavam a equiparação jurídica das uniões homoafetivas às uniões estáveis, acabavam por afrontar os direitos fundamentais, relacionados na CF/88 e que considerasse descabida, sendo assim, transformando a mesma em ADI, que foi justamente o que ocorreu, pois, segundo o Ministro, as vertentes hermenêuticas, não devem entrar em rota de choque, com a Constituição Federal do Brasil.

Outro ponto a ser demonstrado é que a ADI 4277, é proveniente de um pedido feito em 02 de Julho de 2009, a Procuradoria Geral da República propôs a ADPF 178 que foi recebida pelo Presidente do STF, Ministro Gilmar Mendes, como a ADI 4277. O objetivo principal da mencionada ação constitucional era o de que a Suprema Corte declarasse como obrigatório o reconhecimento da união homoafetiva como entidade familiar, desde que preenchidos os mesmos requisitos necessários para a configuração da união estável entre homem e mulher, e que os mesmos deveres e direitos originários da união estável fossem estendidos aos companheiros nas uniões homoafetivas.

Em seu voto, percebemos claramente a sensatez do Ministro Ayres de Brito em enfatizar que os direitos fundamentais, não poderiam vir a sofrer qualquer tipo de coibição, pois qualquer tentativa contra os mesmos seria um ataque direto a constituição brasileira. O ministro teve ainda a clareza de raciocínio quando aponta que o ativismo judicial, deveria ser utilizado em ultimo caso, no entanto, diante da situação requerida, nada mais poderia ser feito, pois existia um certo medo por parte do legislador no que tange a analisar os pedidos de votação de projetos de lei referentes a união estável homoafetiva, projetos estes que tramitavam desde a década de 90 e até hoje encontravam-se esquecidos, sendo assim, como não ser ativista, como deixar cair no esquecimento, um pedido de reconhecimento, daquilo que já é garantido na constituição federal, a igualdade de todos.

O ativismo judicial deve ser utilizado em último caso, pois legislar cabe ao Poder Legislativo, mas, na situação que se apresentava nada mais parecia poder ser feito. Diversos projetos de lei que se referem aos homossexuais dormem esquecidos nas gavetas dos parlamentares ou foram arquivados de vez e quando ressurgem, para acabarem esbarrando nas Comissões Parlamentares, cuja maioria esmagadora é formada por parlamentares cujo fundamentalismo moral com viés religioso, acaba por sonegar os civis de uma grande parcela da sociedade.

Ponto interessante observado no voto do Ministro é o que se refere à concatenação da estrutura argumentativa, pautando o porquê de seus entendimentos sobre o assunto, procurando deixar claro o que se quer dizer e o porquê de se dizer. Trabalha de maneira convincente usando uma logica de preceitos, baseados e estruturados no simples fato de que a igualdade é para todos e que quando se fere um direito de qualquer cidadão, isto precisa ser revisado, pois a constituição federal não pode vir a ser atacada e sendo o STF o guardião supremo dessa constituição, deve defendê-la de todas as formas demonstrando que a mesma deve ser respeitada e os sentimentos de cada individuo, juntamente com seus direitos, preceituados na mesma, devem ser resguardados a todo custo, até mesmo que para isso se necessite legislar sobre o assunto, quando o poder que deveria faze-lo omitisse.

Demonstra também ilustríssimo Ministro, que o assunto em votação esta arraigado a preceitos de caráter conservador que o torna polemico pelo fato de atingir a parcela heterossexual da sociedade e que acaba por incomodar-se com a preferencia sexual do seu semelhante, demonstrando quem assim age, querer só para si, o direito que é dado a todos, escolher livremente com quem se quer manter convivência de caráter amoroso e familiar.

Outro ponto que merece destaque na tática argumentativa do Ministro, é a citação da desembargadora Maria Berenice Dias, que cita o fato de palavra homossexualismo estar atrelado a doença, por seu sufixo “ismo” e que a mesma foi substituída por homossexualidade, que demonstra um determinado jeito de ser, vindo a amenizar um pouco, porem não pondo fim ao repudio do amor entre iguais.

Mostrando coerência em sua argumentação, mais uma vez o Ministro cita Platão, que afirmava a necessidade da entrega ao amor, para o conhecimento da filosofia, e ainda Max Schler que antes de pensante ou volitivo, o ser humano é um ser amante, isso demonstra que termos usados para definir o amor em suas variadas vertentes, não é um termo de características essencialmente jurídica e sim, algo já usado por pensadores esclarecidos de tempos idos.

Sua fala bem pautada em um raciocínio claro e preciso, faz lembrar o que disse a Doutora Rosaura de Barros Baião em seu artigo intitulado A Fala do Advogado, onde nos lembra a importância da fala, na vida do ser humano e nos contempla com a assertiva de que a mesma deve sempre ser bem clara e harmoniosa, fazendo conjunção perfeita com o raciocínio próprio a cada um, para que ao se usar a fala do outro, não se cometa o ato de vir a não ser interpretado corretamente pelo receptor. Deixar claro o que se quer dizer, é o ponto máximo para ser bem entendido e o Ministro Ayres de Brito, o faz muito bem. È justamente assim, que deve agir o advogado na defesa de suas teses, deve embasar-se de argumentos lógicos, deve organizar seus pensamentos de forma que envolva quem o escuta e assim, fazer com o seu falar, o outro acreditar que o que esta sendo dito é também o que ele pensa, é assim que age o Ministro Ayres de Brito, fala de forma tão convincente, que se você se opõe ao que esta sendo dito, é como se você estivesse fechando os olhos para as verdades da vida, que vez por outra ficam embotadas por discursos alheios a verdade ou de caráter extremamente pessoais.

A argumentação do Ministro no que tange ao termo sexo, também deixa claro que qualquer resquício de discriminação, ira colidir com a carta magna de 1988 e que acima de tudo, esta o bem de todos e deve-se garantir justamente isso. Esse bem de todos, resguarda o cidadão, independente de seu sexo ou sua preferencial sexual, esse bem de todos, resguarda os direitos do ser humano acima de qualquer reação preconceituosa em relação as suas preferencias.

Ponto marcante do voto, diz respeito ao tratamento dado a palavra preconceito, o Ministro declara que o mesmo provem de conceito prévio, uma formulação engendrada pela mente humana, sem qualquer aparato na realidade, logo, por não ser respaldada pelo real, pode trazer enganos, pode gerar desconforto, pode desrespeitar o verdadeiramente correto, pode maltratar sentimentos reais, pode direitos e garantias, pode ferir a constituição, tornando-se, tais conceitos pré-concebidos, perigosos para a harmonia social.

Enfatizando ainda mais seu discurso carregado de logica, Ayres de Brito, utiliza-se de uma variedade de termos como, sexo, órgãos genitais, instinto sexual, libido, todos utilizados de maneira clara, demonstrando as diversas interpretações que os referidos termos, podem vir a ter, tudo dependendo de quem fala, de como são empregados e esse empregar correto dos termos, esse se fazer entender, é que proporciona a perfeita harmonização entre o real e o que já vem carregado de preconceitos.

Ao referir-se ao órgão genital, masculino ou feminino e o modo como usa-lo, Ayres de Brito, utiliza-se da logica Kelsiana, quando cita a norma geral positiva e a norma geral negativa e explica que as leis brasileiras operam por um intencional silêncio, que já é um modo de atuar mediante o saque da norma geral negativa, onde tudo que não for proibido, esta permitido, sendo assim a relação entre pessoas do mesmo sexo, não consta de nenhuma proibição, logo, como proibi-la. A forma como se utiliza ou com quem se utiliza seu órgão sexual, não pode definir o caráter de um ser, principalmente e quando, essa forma de relacionar-se não fere o direito de ninguém e nem esta preceituada como negativa, dentro do ordenamento jurídico.

Verificamos que em todo o voto do Ministro, ele sempre demonstra seu ponto de vista real e fortificado por argumentos e contra argumentos, onde, se o mesmo cita determinado que poderia ser contrario ao seu ponto de vista, sua argumentação vem de encontro ao mesmo, sempre embasada em pontos sólidos da realidade, do pensamento e do agir correto e do ordenamento. Agindo assim, ele consegue através de sua contra argumentação, quebrar frases de efeito por parte de seu receptor, se não as quebra totalmente, porque é difícil quebrar preconceitos, ele com o seu bem estruturado falar e perfeita arrumação do pensamento, acaba por dificultar as interpelações dos adversários do tema em julgamento.

Em sequência ao seu bem harmonizado pensamento e para estruturar ainda mais seu pensamento em bases respeitadas, Ayres de Brito cita Jung, que entende a homossexualidade, não como anomalia patológica, mas como identidade psíquica, e, portanto como equilíbrio especifico, que o sujeito encontra em seu processo de individualização. Mais adiante se vale do seguinte principio: Se as pessoas de preferência heterossexual só podem se realizar ou ser felizes heterossexualmente, as de preferência homossexual, seguem na mesma toada: só podem se realizar ou ser felizes homossexualmente. Isso demonstra a clareza de raciocínio, bem pautada na razão das coisas como elas o são, demonstra que o ministro mais uma vez utiliza-se da argumentação solida e bem construída no plano harmonioso de seu raciocinar, sempre em aparato com o ordenamento, justamente para não deixar falhas que possam vir a servir de base de sustentação, para argumentações contrarias as suas.

Seguindo seu pensamento para a concretização de seu voto, o mesmo demonstra através de simples comparação com os preceitos constitucionais, que em momento algum o legislador vedou a forma de utilização da individualidade humana, respeitando-a nos mais variados aspectos e sempre tendo o cuidado de preservar as características e preferencias de cada individuo. Sendo assim, como votar contra a união estável homoafetiva, como proibir, aquilo que a Carta Magna em momento algum condenou, em seu parecer o Ministro demonstra claramente que em vários Estados do Brasil, as garantias em favor dos homoafetivos, já vinham sendo asseguradas, até mesmo por uma questão de logica ao se analisar a constituição.

A preservação da dignidade e dos direitos do cidadão devem vir em primeiro lugar, como ter uma nação prospera e feliz, se alguns milhões de criaturas estão infelizes, por conta de suas preferencias sexuais, não serem aceita por outros tantos milhões, como compactuar com a quebra da dignidade humana, como pré-conceber valores a esse ou aquele, por conta de sua preferencia sexual, o que o homem ou a mulher faz em sua intimidade, deve ser respeitado da maneira mais digna possível, deve-se entender que o que deve realmente contar, são as atitudes corretas que o ser humano tenha em relação ao seu próximo e não o fato dele, homem gostar de relacionar-se com homem ou ela mulher, gostar de relacionar-se com mulher. O Ministro foi enfático no que tange as garantias sociais e individuais, foi enfático em dizer que elas devem ser respeitadas e que esse respeito só se concretiza, quando se garante igualdade para todos.

Como então dar voto contrario a formalização da união estável, não seria logico, não seria correto, não seria constitucional e acima de tudo seria preconceituoso, seria desrespeitoso com o ser humano.

O que nos caracteriza, é justamente essa capacidade que temos, de sermos diferentes uns dos outros, é isso que nos individualiza, é isso que nos torna especiais, é isso que nos faz gente, nos faz humanos. Sendo assim, porque negar o direito de relacionar-se e conviver-se com quem se bem entende dentro desta ótica de pensamento, que valoriza a pessoa humana, foi que o Ministro Ayres de Brito, deu seu voto favorável a efetivação de garantias de direitos a todos aqueles que desejem relacionar-se de maneira homoafetiva. Seu voto vem em guarida de um grupo social, a muito desmerecido pela sociedade, um grupo a muito espoliado e carregado de pejorativos, que os tratavam como anormais, como um câncer social que deveria ser extirpado, que deveria ser exterminado, pelo simples fato de amarem de maneira diferenciada daquilo que se convencionou chamar de “normal”.

Tony Monteiro
Enviado por Tony Monteiro em 13/04/2013
Código do texto: T4239526
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