OS AMBULANTES NOS ÔNIBUS

Todo dia é a mesma coisa: o sobe e desce de ambulantes no transporte público, oferecendo seus produtos (jujuba, amendoim, pastilhas de gengibre, caneta, bolsa de tactel, adesivos...). Já houve dias de eu saltar do primeiro ônibus para tomar o seguinte, e ter novamente o mesmo vendedor me oferecendo seus doces.

Pode ser que a atividade econômica desses vendedores, cuja renda muitas vezes garante o sustento da casa, não aborreça a tanta gente como a mim. Eu até tento não me incomodar, mas é muito complicado. Explico: no percurso que faço diariamente de casa para o trabalho, apanho pelo menos quatro ônibus. Quando tenho aulas, esse número sobe para cinco. Se usufruir do modelo de integração no transporte público, chego a seis coletivos.

Quando isso acontecia de forma eventual eu até contribuía, mas, agora, meu orçamento não suporta. Há gente precisando de ajuda por toda parte. Problema social gravíssimo! Ainda assim, é difícil não me dar nos nervos quando ouço: “bom dia, pessoal! algum irmão pode ajudar nosso trabalho com uma unidade do ‘passecard’?”

O discurso da moda agora é: “bom dia, amados, filhos de Deus! Eu me chamo fulano, ex-viciado, e estou aqui para ajudar a casa de recuperação que resgata jovens do mundo das drogas... que poderiam ser o seu filho... esse dinheiro vai ajudar a pagar a água, a luz e a comprar alimentos...”

Pode ser que até sejam mesmo dessas clínicas, tenho minhas dúvidas. Mas é possível também que alguns estejam copiando o modelo para sensibilizar a população e ganhar um dinheiro fácil.

- Senhora, o fato de a senhora segurar incentiva o meu trabalho.

Diz o vendedor, entregando-me seu produto. Agradeço, recusando-me a segurar a caixinha de caramelo. E não ouso olhar para o ambulante, que suponho me devorar com um olhar revoltado, pelo que ouço dizer.

As melhores dos últimos tempos: “pessoal, quem é que pode ajudar o irmão a atravessar o mar vermelho, pagando a sua passagem?” e o discurso do tipo ameaçador: “se eu chegasse anunciando um assalto, todo mundo ia prestar atenção em mim, mas como estou pedindo...”.

Meu Deus do céu!

Maria Celça
Enviado por Maria Celça em 14/04/2016
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