O DESMANTELO DA REPÚBLICA E O ADVENTO DA INCERTEZA

Nos tempos de Platão, (cerca de -400 da nossa era) é suscitada uma ideia de sistema político chamado República. A ideia é exaltada como uma forma das mais autênticas e capazes de conduzir as sociedades a um nível satisfatório. Seria esse sistema o mais apropriado para orientar a organização, o encaminhamento ao progresso e ao bem-estar das criaturas humanas. Seria através dele que o mundo se tornaria civilizado.

Séculos mais tarde, entretanto, uma teoria mais acabada veio consolidar-se em prática no vasto Império Romano, muito embora alguns incidentes, naquele período, tenham provocado diversas deformações no plano desejado.

Porém, foi no período do Iluminismo, sec. XVI a XVII que o mundo Ocidental tornou mais concretas as ideias republicanas. Ali em meio a uma sangrenta peleja entre as forças antagônicas a Revolução Francesa inaugura o desejo de mudar os antigos regimes (Ancien Regime), resquícios da Idade Média em que reinava o Absolutismo. Nisso aos poucos o mundo vai aderindo ao sistema.

O Brasil pós-1822, preso ao regime monarquista, herdeiro do colonialismo e ainda arraigado àquela velha barbárie, já aspira por mudanças. Nesse momento, grande parte das nações, inclusive na América Latina, já se preparam para implantar a República.

Em mais de seis décadas, sob um império monarquista, a nação brasileira mal se deu conta que necessitava de um amadurecimento muito mais consistente que fosse suficiente a levá-la a adotar um regime que necessitava de afinco e aprimoramento quanto a República. E a transição se deu de forma intempestiva, através de um golpe. A nação caiu nas mãos de uma Oligarquia organizada apenas nos seus próprios moldes, com apenas um projeto ambicioso de Poder.

O modelo manteve-se de pé por mais de três décadas, só conseguindo ser desmontado em 1930 através de outro golpe, dessa vez deflagrado para confrontar rivalidades políticas e demonstrar qual facção conseguia desferir patadas mais fortes. No decorrer do governo golpista o mandatário demonstraria que seu objetivo era apenas satisfazer interesses pessoais, apesar de inaugurar alguns projetos populares.

Década e meia depois, já não tendo percebido progresso no vago projeto republicano de 1889, que destituíra a coroa, o golpe é interrompido e a República sofre mais uma depressão sem atingir seu verdadeiro objetivo. As metas de progresso idealizadas são acanhadas e se tornam falhas no ínterim da chamada primeira onda democrática (1945-1960), até que os militares, insatisfeitos com a as ameças socialistas resolvem mudar os destinos da nação.

A República sofre mais um tremendo golpe. Aí vão, a partir de 1964, mais vinte anos de sérios desrespeitos às liberdades democráticas, meros avanços sociais, restrição de direitos em que a identidade nacional ficava praticamente invalidada e a República mais uma vez desfigurada.

Observa-se que em todos esses períodos, interrompidos por curtos intervalos considerados democráticos, o conceito legítimo de Coisa Pública permaneceu deturpado, pois jamais o povo exerceu o pleno direito de decisão sobre os destinos dos benefícios públicos que caracterizam um regime autenticamente republicano.

Com o projeto de redemocratização que nasceu com o fim da era militar e a chamada abertura democrática os brasileiros respiram um ar um pouco mais puro e aí renasce a esperança de se restabelecer os preceitos republicanos.

Entretanto, são passadas mais de três décadas, o ideal republicano que nasceu lá na Grécia antiga, ultrapassou a Idade Média, dilapidou nações, venceu o absolutismo ocidental, bem como modificou sistemas milenares nos mais diversos continentes. Permaneceu íntegro nas ideias mais progressistas, porém podemos constatar que, por cá, tornou-se apenas uma mera utopia.

O império, a oligarquia, os golpistas de 1930, os militares de 1964, os politiqueiros do pós-1985 e os corruptos da atualidade transformaram a República num verdadeiro festival de atos nefandos em que quem disputa o poder a qualquer custo pode tudo, menos zelar pela honra da Nação e governar para o povo.

Além disso, pode-se observar que os espaços republicanos estão com bloqueios ou em via de serem interditados. As escolas públicas estão pauperizadas em instrumentação e em instrução. Os hospitais públicos estão destroçados em ferramentas e material humano. As garantias de segurança, previdenciárias e outras assustam com o rumor de que num futuro não muito distante deixem de funcionar. Os velhos se desesperam por que já fraquejam as medidas de amparo e os jovens estão perdidos entre a balbúrdia e a incerteza ao serem conduzidos por um governo antirrepublicano.

Joel de Sá
Enviado por Joel de Sá em 01/08/2017
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