Engolidos pela tecnologia

Não adianta espernear nem reclamar com o bispo. Se quiser estacionar o veículo regularmente na moderna, planejada e arborizada Cidade Canção, belíssima cidade do noroeste paranaense, terá que ser através do aplicativo instalado no aparelho celular ou pelo ticket avulso. Se optar pela primeira alternativa, o usuário deverá baixar o programa, fazer o cadastro e adquirir créditos junto ao sistema digital de estacionamento rotativo. “Perfeito”, como diz o crítico amigo septuagenário, cujas respostas precavidas se resumem a monólogos quase inaudíveis em ambiente externo. A cada dia a modernidade bate às portas do cidadão. E se porventura o usuário tiver mais de meia dúzia de décadas vividas e alguma dificuldade no uso da tecnologia a coisa tende a se complicar, porque hoje em dia praticamente tudo é projetado para o funcionamento através do aparelho celular.

Obviamente a iniciativa municipal tem seus méritos. Versatilidade, eficiência na fiscalização e outros tantos argumentos poderiam seu utilizados na defesa do controle de estacionamento rotativo ora em funcionamento. Optou-se pela inovação e ainda que o sistema permita a utilização do ticket avulso, existe a necessidade do cadastramento da placa do veículo. Pelo sim, pelo não, o usuário motorizado de vias públicas será compelido gradativamente a aderir ao novo sistema, sob o risco de penalização pecuniária e administrativa. Ou a procurar os serviços de estacionamento privado, que se mostra como uma alternativa emergencial viável, mas onerosa.

Os gestores públicos haveriam de direcionar suas iniciativas com objetivos inclusivos, não seletivos como nesse caso específico. Não obstante a intenção primeira em facilitar a fiscalização e o controle de estacionamento regulamentado no município, existem determinadas peculiaridades a serem analisadas, antes de se tomar medidas dessa magnitude. Por ser região metropolitana, Maringá recebe diariamente pessoas de toda a região e de outros estados, que buscam por produtos e serviços de excelência, muitos apenas em uma ou duas ocasiões mensais, por algumas horas.

Alguns garantem que é questão de tempo para a que a população se habitue à nova tecnologia. Outros recomendam que os “mais experientes na vida” façam a reciclagem necessária visando o enquadramento aos ditames municipais. A verdade é que a tendência mundial segrega implacavelmente aqueles reticentes à modernidade alienante da atualidade, seja por restrições naturais da idade ou convicções distintas. O ser humano é impelido cada vez mais a se manter próximo do aparelho celular, que passa a ditar regras e a monitorar a agenda diária de compromissos. Estamos cada vez mais propensos a ser inexoravelmente engolidos e consequentemente, digeridos impiedosamente pela tecnologia. Que o diga o Sumo Pontífice, que em plena audiência semanal na Praça de São Pedro no Vaticano, fez a multidão esperar pacientemente por mais de um minuto para que atendesse a uma ligação telefônica. Mas “até tu, Bergoglio, filho meu”?