Estudo Específico Sobre Metrificação

           na Literatura de Cordel
                           Compadre Lemos

Amigos,

* Face ao grande número de pessoas que, na melhor das intenções, se interessa pela Literatura de Cordel na Internet – principalmente no Orkut;

* Face às dificuldades que todo principiante tem quanto à Metrificação – uma exigência do Cordel;

* E em virtude da absoluta necessidade dos versos serem metrificados, conforme as exigências de cada Estilo de Cordel,

Resolvi escrever este Estudo Específico Sobre Metrificação e postá-lo aqui e em todas as Comunidades de Cordel das quais faço parte.

Assim, quem sabe, os mais interessados possam dele se servir, no momento de postar estrofes nessas Comunidades ou até mesmo, quem sabe, profissionalmente.

Então, vamos ao Estudo:

1 – Metrificação

Chama-se Metrificação a exigência da Poesia – seja clássica ou popular – da contagem de Sílabas Poéticas de cada verso escrito, de acordo com os Estilos de Poesia.

Como qualquer poema é feito para ser declamado ou cantado, o seu conteúdo tem, por obrigação, que “caber” em uma determinada “melodia” ou “ritmo”. Esse “tamanho” exato – para que ele “caiba” nesse ritmo ou melodia é dado, então, pelo número de Sílabas Poéticas de cada verso.

Assim, temos, por exemplo, em uma Quadra ou Trova:

Número de versos: Quatro (4)
Número de sílabas poéticas por verso = Sete ( Exigência do Estilo Trova).

Pra fazer boa poesia,
Põe amor no coração!
Abre teu peito e confia
Na tal Metrificação.

Analisando:

PRA FA ZER BO A POE SI (a) = sete Sílabas Poéticas.
PÕE A MOR NO CO RA ÇÃO = sete Sílabas Poéticas.
A BRE TEU PEI TOE COM FI (a) = sete Sílabas Poéticas.
NA TAL ME TRI FI CA ÇÃO = sete Sílabas Poéticas.

Observações: 

1 – Note que a contagem das Sílabas Poéticas é, em alguns casos, diferente da contagem das Sílabas Gramaticais. Deve-se seguir, na Contagem Poética, o ritmo da declamação ou do “cantar” de cada verso.

Exemplo:

Contagem Gramatical: PRA FA ZER BO A PO E SI A – Nove sílabas gramaticais.

Contagem Poética: PRA FA ZER BO A POE SI (a) Sete Sílabas Poéticas.

Isto se dá por dois motivos:

MOTIVO 1 – Só se contam as Sílabas Poéticas ATÉ A SÍLABA TÔNICA DA ÚLTIMA PALAVRA DE CADA VERSO. ( Sílaba tônica é a sílaba mais forte da palavra) desprezando-se o que vem depois dela.

PRA FA ZER BO A POE SI (a) - A sílaba tônica de poeSIa é a sílaba SI. Portanto, a sílaba “a” que vem depois dela, NÃO É CONTADA. ( por isso está entre parêntesis e em minúscula, na contagem).

MOTIVO 2 – Para se obedecer ao ritmo da declamação do verso, pode-se juntar duas sílabas em uma só, desde que a primeira SEJA OU TERMINE EM VOGAL e a segunda SEJA OU COMECE POR VOGAL.

Exemplo: 

PRA FA ZER BO A POE SI (a) – juntou-se a sílaba PO com a sílaba E, fazendo a Sílaba Poética “POE”, que no declamar do poema, é dita de uma única vez, como se fosse, realmente, uma única sílaba.

Outro exemplo: 

A BRA TEU PEI TOE COM FI (a) - Juntou-se TO com E para fazer a Sílaba Poética “TOE”, que, no declamar do poema, é dita de uma única vez, como se fosse, realmente, uma única sílaba.

Agora, faça um exercício: Fale, em voz alta, ( declame ) a trova abaixo, CONTANDO NOS DEDOS, pela divisão em Sílaba Poéticas, e veja se não são SETE SÍLABAS POÉTICAS, em cada verso.

PRA FA ZER BO A POE SI (a) ( não conte a última sílaba, pois ela está depois da última tônica)
PÕE A MOR NO CO RA ÇÃO ( a última deve ser contada, pois ela é a sílaba tônica de “coracão”).
A BRE TEU PEI TOE CON FI (a)
NA TAL ME TRI FI CA ÇÃO

Contou? Deu sete sílabas poéticas por verso? Então...

Então... acostume-se a fazer isso ( declamar, contando nos dedos ) com todas as estrofes que você escrever. Tenho certeza que você vai errar bem menos!

2 – A Metrificação Nos Diversos Estilos de Cordel

Estilo 1 - A Trova ou Quadra

Começamos este Estudo analisando uma Trova ( ou Quadra).

Portanto, já sabemos que este Estilo é composto por estrofes de 4 versos, cada verso contendo 7 Sílabas Poéticas. ( chamados Versos Heptassílabos). 

Distribuição de Rimas: A B A B ( o primeiro verso rima com o terceiro, e o segundo, com o quarto).

Vejamos, mais um exemplo:

Se metrificar direito
Uma estrofe bem rimada
Fica linda, desse jeito,
Serve até pra ser
cantada!

SE ME TRI FI CAR DI REI ( to ) 7 SP
U MAES TRO FE BEM RI MA ( da ) 7 SP
FI CA LIN DA DES SE JEI ( to ) 7 SP
SER VEA TÉ PRA SER CAN TA (da ). 7 SP

( SP = Sílaba Poética).

Estilo 2 – A Sextilha

Estilo muito popular na Literatura de Cordel. Um dos mais fáceis. Cada estrofe é formada de seis versos e cada verso deve ter sete Sílabas Poéticas ( Heptassílabos).

Distribuição de Rimas: X A X A X A – ( Os versos 1, 3 e 5 não precisam rimar. Os versos
2, 4 e 6 rimam entre si).
Exemplo:

Sem a Metrificação
Não se pode ter
Poesia.
É ela quem vai ditar
O andar da
melodia
O verso fica bonito,
Com ritmo e com harmonia!

SEM A ME TRI FI CA ÇÃO = 7 SP
NÃO SE PO DE TER POE SI (a) = 7 SP
É E LA QUEM VAI DI TAR= 7 SP
O AN DAR DA ME LO DI (a) = 7 SP
O VER SO FI CA BO NI ( to ) = 7 SP
COM RIT MOE COM HAR MO NI (a) = 7 SP

 Estilo 3 – A Septilha ou Setilha 

Talvez o mais popular dos Estilos, a Septilha é composta de sete versos, cada verso tendo sete Sílabas Poéticas ( Heptassílabos )

Distribuição de Rimas: X A X A B B A ( Os versos 1 e 3 não precisam rimar. Os versos
2, 4 e 7 rimam entre si. E os versos 5 e 6 também rimam entre si).

Exemplo:

Poeta principiante,
Eu vou lhe dar uma
dica:
Quem estuda sempre aprende
Quem aprende, melhor fica.
Use a M
etrificação
Use amor, use atenção,
E faça Poesia Rica!

PO E TA PRIN CI PI AN (te) = 7 SP
EU VOU LHE DAR U MA DI (ca) = 7 SP
QUEM ES TU DA SEM PREA PREN (de) = 7 SP
QUEM A PREN DE ME LHOR FI (ca) = 7 SP
U SEA ME TRI FI CA ÇÃO = 7 SP
U SEA MOR U SEA TEN ÇÃO = 7 SP
E FA ÇA POE SI A RI (ca) = 7 SP

Estilo 4 – A Décima de Sete Pés

Sendo um Estilo mais usado em Cantorias ao vivo, ao som de violas, nos desafios entre Repentistas, a Décima de Sete Pés é composta de estrofes de dez versos, tendo, cada verso, sete Sílabas Poéticas (Ainda Heptassílabos).

Distribuição das rimas: A B B A A C C D D C

Exemplo:

A - Meu compadre, veja bem
B
- Que não vai ter confusão
B
- A tal
Metrificação
A - Não barra mesmo ninguém
A
- Seja aqui, ou no além,
C - Só precisa declamar
C
- O verso e verificar
D - Se coube na melodia
D
- Se couber, tá tudo em dia,
C
- Não tem jeito de errar!

MEU COM PA DRE VE JA BEM= 7 SP
QUE NÃO VAI TER CON FU SÃO= 7 SP
A TAL ME TRI FI CA ÇÃO= 7 SP
NÃO BAR RA MES MO NIN GUÉM= 7 SP
SEJAA QUI OU NO A LÉM= 7 SP
SÓ PRE CI SA DE CLA MAR= 7 SP
O VER SOE VE RI FI CAR= 7 SP
SE COU BE NA ME LO DI ( a ) = 7 SP
SE COU BER TÁ TU DOEM DI (a) = 7 SP
NÃO TEM JEI TO DE ER RAR. = 7 SP

Estilo 5 – O Martelo Agalopado

Outro Estilo usado em Cantorias e Desafios, o Martelo Agalopado é formado de estrofes de dez versos, tendo, cada verso, dez Sílabas Poéticas – ( Versos Decassílabos ).

Distribuição de Rimas: A B B A A C C D D C
A mesma da Décima de Sete Pés.

Exemplo:
Vou falar sobre um tal Mané Papão
Dos poetas que fazem Cantoria,
Que tropeçam na tal da melodia,
Quando pecam na Metrificação.
Se contarem com zelo e atenção
Cada verso, vão ver, vai se encaixar
A estrofe, tão fácil de cantar
Vai ficar bem mais bela e mais bem-feita,
De outro modo a poesia é
suspeita
E “Cordel” não vai ser, posso afirmar!

VOU FA LAR SO BREUM TAL MA NÉ PA PÃO = 10 SP
DOS PO E TAS QUE FA ZEM CAN TO RI (a) = 10 SP
QUE TRO PE ÇAM NA TAL DA ME LO DI ( a ) = 10 SP
QUAN DO PE CAM NA ME TRI FI CA ÇÃO. = 10 SP
SE CON TA REM COM ZE LOE A TEN ÇÃO= 10 SP
CA DA VER SO VÃO VER VAI SEEN CAI XAR = 10 SP
A ES TRO FE TÃO FÁ CIL DE CAN TAR= 10 SP
VAI FI CAR BEM MAIS BE LAE MAIS PER FEI (ta) = 10 SP
DEOU TRO MO DO A POE SI A É SUS PEI (ta) = 10 SP
E COR DEL NÃO VAI SER POS SOA FIR MAR. = 10 SP

 Estilo 6 – O Galope à Beira Mar

O mais difícil de todos os Estilos, usado frequentemente em Desafios e Cantorias, por poetas mais experientes. Compõe-se de estrofes de dez versos, tendo, cada verso, ONZE Sílabas Poéticas, sendo que o último verso de cada estrofe termina, obrigatoriamente, com a palavra MAR. 


( Normalmente usam-se os versos-padrão:
 
“Cantando Galope na beira do mar” ou 

“ Nos dez de Galope, na beira do mar”.

Distribuição de Rimas = A B B A A C C D D C – A mesma do Martelo e da Décima de Sete Pés.

Exemplo:

Compadre, me diga o que é que eu faço
Eu sei não mereço tamanha atenção
Meu grande problema é Metrificação
Que pega e me prende, tal qual fosse um laço!
No verso eu quero ocupar meu espaço
Mas sei que pra isso é preciso estudar
Amigo, se achegue, vem cá me ajudar
Depois, como paga, lhe ensino a magia
De ver lua cheia brilhando de dia,
Cantando galope, na beira do mar!

COM PA DRE ME DI GAO QUE É QUE EU FA (ço) = 11 SP
EU SEI NÃO ME RE ÇO TA MA NHAA TEN ÇÃO= 11 SP
MEU GRAN DE PRO BLE MAÉ ME TRI FI CA ÇÃO= 11 SP
QUE PE GAE ME PREN DE TAL QUAL FOS SEUM LA (ço) =11 SP
NO VER SO EU QUE ROO CU PAR MEU ES PA (ço) = 11 SP
MAS SEI QUE PRA IS SOÉ PRE CI SOES TU DAR= 11 SP
A MI GO SEA CHE GUE VEM CÁ MEA JU DAR= 11 SP
DE POIS CO MO PA GA LHEN SI NOA MA GI (a) = 11 SP
DE VER LU A CHEI A BRI LHAN DO DE DI (a) = 11 SP
CAN TAN DO GA LO PE NA BEI RA DO MAR. = 11 SP


Existem ainda outros Estilos de Cordel. Entretanto, como o presente estudo tem como objetivo familiarizar o leitor apenas com a Metrificação, não os descreveremos, o que tornaria este trabalho por demais extenso.

Leia, abaixo, as observações finais, sobre Ritmo e Tônicas:

Observações Finais: O Ritmo e as Tônicas.

Para os dois últimos Estilos estudados ( Martelo Agalopado e Galope à Beira Mar) existe uma melodia tradicional, em que eles são cantados.

Essa melodia, específica para cada estilo, tem um ritmo, ou andamento, para se cantar. Esse ritmo tem “batidas” mais fortes, em determinadas sílabas, chamadas “Tônicas” ou "Cesuras", que devem ser seguidos, para que a pronúncia das palavras não seja alterada, ao se cantar ou declamar a estrofe. 

Deve-se, pois, ao escrever, tentar encontrar as palavras certas, cujas sílabas tônicas naturais coincidam com as “tônicas” da melodia.

Assim, temos:

No Martelo Agalopado
As tônicas devem ser: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 ( Sílabas 3, 6 e 10 ).

Exemplo: 

vou faLAR sobre um TAL mané pa
PÃO

VOU FA LAR SO BREUM TAL MA NÉ PA
PÃO

dos poEtas que FAzem cantoRI ( a )

DOS PO E TAS QUE FA CAN TO RI (a).

No Galope a Beira Mar
As tônicas devem ser: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 - ( Sílabas 2, 5, 8 e 11).

Exemplo:

ComPAdre, me DIga o que É que eu FAço

COM PA DRE ME DI GAO QUE É QUE EU FA (ço)

Eu SEI não meREço ta MA nhaa ten
ÇÃO

EU SEI NÃO ME RE ÇO TA MA NHAA TEN
ÇÃO

Quando não se escolhem bem as palavras, nesses dois Estilos, de acordo com as tônicas da melodia, há uma diferença de pronúncia, quando se canta ou se declama o verso, que chega a doer no ouvido.

Exemplo:

Em Martelo Agalopado:

O visGO da jaCA pegou em MIM.

Quando vamos cantar ou declamar, sai: 

O VIS DA JA PE GOU EM MIM 

Notem que alterou a pronúncia de Visgo e Jaca. Ficou visGU e ja. ( horrível!!!)

Em Galope a Beira Mar:

PasSArin que FAZ um verSO pra ciDA (de)

Quando vamos cantar ou declamar, fica: 

PAS SA RIM QUE FAZ UM VER SO PRA CI DA (de) 

Ou seja, muda “passaRIM" para paSSÁrim e “VERso” para “ver”.

(de novo... horrível!!!)

Terminando, recomendo a todos os interessados, estudarem o tópico “Teoria do Cordel – Você Pode Aprender”, neste mesmo Site, no link "Textos - Artigos", onde estas e outras informações estão disponíveis.

Endereço:
http://www.compadrelemos.com/visualizar.php?idt=1020574

Espero ter sido útil.

Quaisquer dúvidas, contem comigo.

Contatos:

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MSN: luscarlemos@msn.com


Fraterno abraço,