DE ONDE TUDO SE ORIGINOU?

Continuando com o tema tratado no artigo anterior, apenas farei uma breve conclusão. Tendo antes demonstrado que as coisas naturais não têm necessidade de serem geradas, ou pelo menos não há como deduzir isso através de coisas culturais, neste pequeno artigo me proponho a responder a outra parte da questão que me foi proposta: do que se originou tudo?

Desde os primórdios da história do homem que esta pergunta tem sido feita, mas somente com os primeiros filósofos ela encontrou uma resposta coerente. Diziam eles que o princípio de tudo deveria ser eterno, já que não teve um começo. O que não têm começo certamente não terá um fim, o que quer dizer que esta coisa ainda existe. Somente as coisas finitas têm começo e fim, portanto o princípio de todas as coisas tem necessariamente que existir desde sempre. Por isso negavam os deuses como princípio de tudo. Estes não tinham fim, eram imortais, mas tiveram um começo, o que para a filosofia era um absurdo. Tudo que tem um começo certamente terá um fim. Platão e Aristóteles foram os primeiros a admitirem um princípio metafísico para o cosmo, diferentemente dos seus antepassados, que buscavam nos elementos da natureza o principio de todas as coisas.

O cristianismo utilizou os argumentos destes grandes filósofos para afirmarem a verdade do seu Deus. Sendo eterno e metafísico, constituía exatamente o que disseram Platão e Aristóteles. As coisas que têm um começo e um fim requerem como causa algo que não tenha começo nem fim, e só poderia ser o deus cristão. Não nego a lógica do pensamento cristão nem dos filósofos pré-socrátcicos. De fato, o princípio não deve ter começo, senão teria algo antes dele e ele não seria mais o princípio. Também não deve ter fim. Pois não há motivos para crer nisso. Mas afirmar que este princípio é Deus se torna um tanto arriscado. Devemos atentar que quem afirma isso cai em problemas dos quais não se pode escapar. Como explicar, pois, que Deus, sendo perfeito, pudesse ser causa de algo imperfeito? Como explicar que Deus, sendo infinito, pudesse ser causa de coisas finitas? Como Deus conseguiu criar o mundo do nada, sendo que do nada nada provém? E principalmente, como explicar que Deus, sendo imaterial, pudesse ser causa da matéria? Assim como o que sustenta a hipótese de Deus ser o princípio de tudo é a metafísica também é a metafísica afirmando que tais coisas são impossíveis.

Afirmar que Deus é o princípio pode até estar certa, mas quem a afirma não poderá esclarecer as complicações internas desta afirmação, senão apelando para o sentimento religioso, para o dogma e abandonando a razão. Convém então procurarmos uma teoria mais satisfatória onde tudo faça sentido e seja plenamente compreensível pela razão. Não há como negar que o princípio deve ser eterno, mas não é somente um deus que pode ter a propriedade da eternidade. A teoria materialista diz exatamente a mesma coisa que a teológica, só que sem as complicações e paradoxos inerentes a esta teoria. Ela afirma que o princípio de tudo não é outra coisa senão a própria matéria. Ela não teve começo e não terá jamais um fim. Adaptando a uma teoria da ciência contemporânea, a matéria esteve no átomo primordial que resultou no Big-Bang, e existirá por toda a eternidade, sendo que é indestrutível. A matéria é o princípio de todas as coisas. Tudo é composto de matéria ou depende dela para existir. Também não há nenhuma necessidade de achar que a matéria teve um começo. No artigo anterior demonstro que não há porque achar que a natureza necessite de um criador. Muitos fazem a infantil pergunta “e quem criou a matéria?”¹. Mas se a matéria for o princípio, não precisará de nada anterior a ela. O princípio de tudo não possui uma causa, seja este princípio Deus ou a matéria. Assim sendo, a matéria é a origem de tudo.

A matéria existe, é um fato. Lidamos com ela o tempo inteiro, não podemos negá-la. Não precisamos ir até os primórdios do universo para ver se ela estava lá desde sempre – mesmo porque seria impossível voltar a um tempo “sempre” no passado. Para negar a eternidade da matéria só seria preciso mostrar que ele tem um fim. No entanto a matéria é indestrutível, o que mostra que ela sempre existiu. Existem teorias mais elaboradas que negam a existência da matéria. Estas são teorias filosóficas profundas. É inegável que Deus não pode ter criado a matéria – quem entende um pouco de metafísica entenderá por que, então só resta afirmar que a matéria não existe. Esta teoria foi defendida por Berkeley, filósofo irlandês do século XVIII. A teoria é bastante complexa e interessante, no entanto parece muito desespero negar a matéria, que é um fato, para afirmar Deus, algo tão incerto.

Muitas vezes temos duas teorias que parecem de igual valor, mas temos que ir a fundo nelas. Temos que escolher aquela que não possui complicações internas, ou para os menos céticos, as que possuem menos aporias. Penso que a origem de tudo é a matéria, por não se poder provar que ela tem fim e não ter como mostrar que necessite de um começo. Se tudo necessita de um começo, então Deus também necessita. Se não é tudo, então talvez a matéria não necessite. E se de fato ela necessitar, não há como mostrar ou entender como Deus poderia tê-la criado, nem como conseguiu tira-la do nada, pois se uma coisa sempre vem de outra coisa, a matéria só pode vir da própria matéria, e sendo ela eterna, todas as coisas materiais dela provém.

1. sinto muito estar colocando uma coisa tão infantil em um artigo filosófico, mas é para facilitar a compreensão de algumas pessoas.

Igor Roosevelt
Enviado por Igor Roosevelt em 07/07/2008
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