Estupro Coletivo

Não é novidade o processo de duplicação pelo qual passa a Rodovia Raposo Tavares, especificamente o trecho que liga Assis a Maracaí. Também não é novidade que será cobrado pedágio após o término das obras.

Embora constitucionalmente assegurada, a cobrança de pedágio é ilegítima. Pedágio é como estupro.

No estupro, a mulher geralmente não sabe o perigo que corre. Atraída ou levada a algum lugar ermo, transforma-se em objeto de sevícias. Ao fim da relação, traumas psicológicos e uma eventual gravidez são resultados que a perseguirão vida afora.

No pedágio o processo é semelhante. O motorista sabe que corre perigo, que será violentado, sabe em que lugar será coagido a entregar parte de seu dinheiro e, por mais que grite, proteste ou se exaspere de nada adiantará.

No estupro, a violência é contra a mulher. No pedágio, explode contra qualquer pessoa.

Sou contra o estupro assim como sou contra o pedágio. Ilusoriamente o pedágio defende a melhoria das estradas, dotando-as de infra-estrutura e proporcionando bem-estar aos motoristas. Conversa Fiada!

Se pagamos pedágio, não precisamos pagar IPVA (Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores), nem emplacamento ou transferência de titularidade, nem o seguro obrigatório, nem licenciamento, nem as dezenas de impostos que recaem sobre os combustíveis. Mas, se pagamos pedágio, por que temos de continuar pagando todos estes impostos?

Precisamos, na medida em que pedágios são instalados tanto nas estradas estaduais quanto nas federais, discutir qual o papel dos Departamentos de Estradas de Rodagem (DER) e dos Departamentos de Trânsito (DETRAN) no âmbito estadual e nacional.

Na página na internet do DER paulista (http://www.der.sp.gov.br/institucional/missao.aspx), consta a definição da missão da instituição: “É missão do Departamento de Estradas de Rodagem administrar o sistema rodoviário estadual, sua integração com as rodovias municipais e federais e sua interação com os demais modos de transporte, objetivando o atendimento aos usuários no transporte de pessoas e cargas”.

Se temos um departamento que cuida das Estradas de Rodagem paulistas, que prevê uma integração com as rodovias municipais e federais e que, por fim, tem a missão de atender aos usuários no transporte de pessoas e de cargas, por que precisamos de pedágio?

Para onde vai todo o dinheiro arrecadado com os impostos, taxas e contribuições que pagamos de nossos veículos ou que pagamos quando usamos um ônibus circular, intermunicipal ou interestadual? Não pagamos impostos para manter os serviços do DER, do DETRAN e de outros órgãos de finalidades conexas?

Se pagamos uma contribuição à iniciativa privada pelo uso das estradas, por que manter ativo um departamento que cuida das estradas? Neste caso, melhor seria fechar tal departamento e transferir seus agentes administrativos qualificados, preparados, experientes e competentes para outros órgãos.

Instalado o pedágio, a viagem entre cidades e estados encarece, afetando diretamente o bolso do passageiro, que terá de pagar pelo acréscimo de despesa na compra da passagem. Os produtos essenciais encarecem, pois mais caros ficam os fretes cobrados pelos caminhoneiros que, sem culpa do aumento, invariavelmente levam mais prejuízo do que lucro. Os únicos a lucrarem com os pedágios são os sócios dos próprios pedágios.

Apenas para ilustrar, faço uma pequena conta. O carro de minha família percorre dez quilômetros com um litro de álcool. Em nossa região, o litro de álcool custa em média R$ 1,30. Se quisermos percorrer mais ou menos 600 quilômetros da Rodovia Raposo Tavares, vamos gastar 60 litros, que vão custar R$ 78,00. Se os seiscentos quilômetros viajados concentrarem-se entre São Roque e Caiuá, teremos de pagar seis pedágios que vão nos custar R$ 28,70.

Esse valor de R$ 28,70 representa 36,8% do que gastaremos para abastecer o automóvel. Onde já se viu ganhar dinheiro tão fácil assim? A maior escala de cobrança de Imposto de Renda é 27,5%. O custo médio do cheque especial é de 15%. Os juros médios cobrados nos empréstimos são 10%. O IPVA do carro é de 4% sobre o valor total do bem. O financiamento estudantil patrocinado pelo governo federal não ultrapassa 2% mensais. Os juros da poupança não rendem em média mais do que 1%. Nem os impostos cobrados pelo governo federal em um ano, nem os juros selados pelos bancos em um mês dão tanto lucro quanto os pedágios. No exemplo que damos, o pedágio ganhou 36,8% em menos de dez horas. Para onde vai todo esse dinheiro?

Quanto mais pedágios, mais o turismo e o comércio da região saem perdendo. Dezenas de consumidores renunciaram às compras em Londrina (PR). Não vale a pena pagar quase R$ 20,00 exclusivamente de pedágio para chegar à segunda maior cidade do Paraná.

Assim como mudaram seus hábitos em conseqüência do ajuste no orçamento proporcionado pela instalação de pedágio abandonando Londrina, dezenas de consumidores deixarão de procurar Assis se tiverem que pagar pedágio para entrar na cidade.

Se tem de pagar mais caro, o consumidor procurará supermercados, farmácias, sapatarias, lojas de roupa, de material para construção etc em outras cidades. E, em momento nenhum, o consumidor estará errado em buscar novas alternativas de economia.

Os candidatos a prefeito de nossa região que defenderem o pedágio, uma investida contra o bolso do consumidor – do cidadão, do trabalhador assalariado, do aposentado, do estudante –, devem levar paulada nas urnas nas próximas eleições municipais.

À nossa região, pedágio é sinônimo de prejuízo, de desemprego, de falta de crescimento para o comércio e para o turismo, de ausência de oportunidades para todos. Um verdadeiro estupro coletivo contra toda a região de Assis.

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Em meu blog (vicentonio.blogspot.com) há uma pesquisa: “Você concorda com a roubança dos pedágios nas estradas brasileiras?”. Se quiser, passe lá e dê seu voto.

*Artigo publicado originalmente no Jornal de Assis (Assis – SP) de 15 de julho de 2008.