A origem da tradiçom pagã dos Magustos, e do Halloween

Para os celtas, o primeiro de Novembro marcava a data do fim do ano, a passagem do verao ao inverno, da época na que a vida se realizava no exterior à época na que a vida se fazia no interior da morada ao pe do lume da lareira.

Esse dia era chamado polos gauleses Samónios e polos irlandeses Samhain ou Samhain e era umha festa à qual acodiam todas as pessoas dos povoados celebrando-se umha série de rituais relacionados com a justiça, o direito e a política à vez que dum ponto de vista religioso acreditava-se que a porta do Sidh, do além, do lugar onde moravam os mortos, era aberta para que aquelas pessoas que tinham deixado este mundo pudessem comunicar mais outra vez com aquelas outras que ainda nom o tinham deixado.

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Esta última característica do Samhain implicava umha série de rituais e crenças relativas aos mortos que perdurárom em muitos povos da Europa os quais de algumha forma herdárom qualquer cousa, por mui pouco que esta fosse, de aquel espíritu celta que chegou a cubrir o nosso continente.

A chegada do cristianismo provocou umha grande adaptaçom das velhas crenças à nova situaçom e à nova filosofia que tivo que botar mao do sincretismo fazendo das ilhas Britânicas, partes da Gália e da velha Gallaecia focos de resistência espiritual, surgindo um cristianismo autóctone e singular que foi denomiado polos historiadores “cristianismo celta” gerador de figuras como Sam Patrício, Sam Columbano, Prisciliano, Columba, Egéria …

O Cristianismo viu-se na obriga de adaptar as crenças celtas entre as que se encontrava a festa do Samhain, que derivou na festa que nós conhecemos com o nome de Todos os Santos, onde o culto à morte muda de forma mas nom de fundo.

Assim o druída ou druidesa passa-se a ser considerado um bruxo ou bruxa do novo ponto de vista, servidor das forças do mal, vilipendiado polo novo poder enquanto os novos sacerdotes dirigem as crenças populares em outras direcçons embora a antiga filosofia perdurasse nos cultos esotéricos, perseguidos posteriormente pola inquisiçom mas nunca totalmente eliminados podendo ter sobrevivido até o dia de hoje.

Originariamente o ritual celta do Samhain implicava a exposiçom de cabezas cortadas dos inimigos com a finalidade de afogentar os espíritos malvados. Esta prática perdurou durante toda a Idade Média vendo-se substituida a tétrica cabeza cortada do inimigo por cabezas de animais num princípio e posteriormente outras simbólicas feitas de pedra que acabaram sendo a origen, séculos mais tarde das gárgolas que aparecem em monumentos religiosos com funçons protectoras para além das cucurbitáceas ou cabaços da festividade britânica do Halloween mas também presentes na tradiçom galega actual, sobre tudo em certos lugares da Costa da Morte, Rias Baixas e Regiom Británica ou das Marinhas.

A chegada dos povos germânicos ao occidente europeu com a queda do Império Romano provocou a passagem das velhas crenças ao novo tempo histórico da Idade Média e tanto os anglo-saxónicos, como os francos ou os suevos fôrom os protagonistas nos três territorios da adequaçom à aquela nova era tam diferente da anterior, das tradiçons célticas necessitadas agora dumha nova adaptaçom ao recém incorporado domínio filosófico cristao sobre qualquer outra manifestaçom política ou religiosa existente na altura.

Os primeiros, os anglo-saxónicos, encontrárom umha sociedade puramente celta e mesmo sem romanizar onde as tradiçons dos celtas britânicos se tinham manifestado como impossíveis de eliminar. Tal é assim que ainda hoje é ali onde os últimos povos de língua celta pervivem com certa vitalidade.

Os segundo, os francos chegárom a umha Gália muito romanizada do rio Loira para Sul, mas também fácil de germanizar do Loira para Norte deixando os últimos elementos célticos no centro do país e na península Armoricana que recebe aliás umha forte migraçom de elementos britânicos que fogem dos anglos, jutos e saxons da vizinha Britânia. Aliás, na nossa Gallaecia, pouco romanizada nos seus costumes e no seu espírito, absorve e adapta o elemento suevo à vez que também experimenta a chegada dos povos británicos provenientes das Ilhas, sobre tudo na costa cantábrica guiados polo seu bispo Maeloc.

Os Suevos acabariam aceitando o catolicismo e figuras quase de lenda como o rei Carriarico seriam protagonistas de actos de sincretizaçom do antes chamado Samhain para a nova festividade de Todos os Santos numha transiçom que seria vista polo povo como umha continuaçom por adaptaçom aos novos tempos dos seus rituais pagaos originados na sua idiosincrasia particular.

A chegada dos mussulmanos à península em nada vai modificar as crenças dos galegos que eram cada vez mais cristás nas suas manifestaçons, quiçá por oposiçom ao islamismo do Sul penínsular, enriquecendo-se tanto no cultural, no económico como no demográfico das achegas provenientes polo Caminho de Santiago, autêntica porta aberta à reafirmaçom europeista da Gallaecia da época ao existir comunicaçom directa por terra, mas também por mar com os territorios trans-pirenaicos da Gália, agora França, com a que nos uniam fortes vínculos étnicos e nesta altura políticos.

Mas é no ano de 1582, passada já a Idade Média, quando se produz a mudança no que diz respeito da festividade do 1º de Novembro, sendo nesse ano quando se leva a cabo a reforma do calendario juliano em vigor para outro mais adaptado à época.

O Papa Gregório XIII decidiu entre outras cousas que o dia seguinte ao 4 de Outubro de 1582 fosse dia 15 eliminando polo meio dez dias. Os países católicos em plena contra-reforma aceitam imediatamente a mudança enquanto os outros, entre eles a Gram-Bretanha fazem-na efectiva no 1752. Isto traz conseqüências para a evoluçom da festa do 1º de Novembro já que esse 1º de Novembro passou-se a ser o 11 do novo calendario gregoriano, dia que continuou sendo o da celebraçom da festividade tradicional da qual estamos falando e que na Galiza se vinha denominando Magusto com umhas características próprias devido também à própria evoluçom da festa nos territorios da velha Gallaecia dos quais tanto Portugal como a Astúria som também herdeiros e nos que o Magusto ou Maguestu também está presente. Por tanto o dia 1º de Novembro do novo calendario gregoriano corresponderia ao velho 25 de Outubro do velho calendario juliano mas era o dia no que a igreja católica celebrava o dia de Todos os Santos.

Na Inglaterra, umha vez imposto o calendario gregoriano no século XVIII celebrariam a festa do “All own een” a véspera desse novo 1 de Novembro no que ainda perdurava o costume das cabeças cortadas da tradiçom Samhainica na que agora mais civilizada e cristianizada incluía cabaços -e nom cabeças- vazios no seu conteúdo e arremedando um crânio com olhos, nariz e boca incluídos. Na Galiza em troca, a festa perduraria no 11 de Novembro gregoriano, velho dia 1º do calendário juliano e conservando umha também velha parafernália pagá incluída Santa Companha -procissom dos mortos que lembra a apertura do Sidh-, comida com castanhas implicando a salvaçom dumha ânima por cada castanha ingerida, e cabaços simulando crânios com os quais os rapazes metiam medo aos adultos colocando-as nos campossantos com umha velinha acessa para causar impressom aos caminhantes. Enquanto esta velha tradiçom conservava a sua data originária do dia 11, a festividade de Todos os Santos cristá cindiria-se da festa pagá para ser celebrada o dia 1º .Como objectivo das ânsias “universalizadoras” do cristianismo católico o dia do Magusto pagao foi dedicado ao Bispo bracarense Sam Martinho de Dúmio primitivo patrom da Galiza e velho adail cristao contra o paganismo.

Mas ainda há mais outro elemento: A noite dos rituais de mágia druídicos, agora convertido em noite das bruxas era tradicionalmente a véspera do Samhain/Magusto, dia do fim do ano céltico que agora, esquecidas as tradiçons proto-históricas seguirá a ser também o dia de fim de ano, mas desta vez segundo criterios modernos já que o novo fim de ano nom vai ser nem o velho 31 de Outubro nem o novo 10 de Novembro, mas o 31 de Dezembro dia de Sam Silvestre, um dos primeiros papas da época do Imperador Constantino e também velho defensor do cristianismo face o paganismo. Foi ele que proibiu os rituais de mágia herdados da tradiçom pré-cristá.

Ao nome de Magusto têem-se-lhe dado várias orígenes etimológicas dentre elas a de “MAGNUS USTUS” que vem significar al assim como “grande fogueira” donde MAGNUS é grande e USTUS, queimado, ardido, o participio passado do verbo “Uro”, arder, queimar. Pode ter umha certa lógica mas nós quigêramos propor outra desde aquí que tem a ver com as palavras “MAGUS” feiticeiro, bruxo, mago e “USTUS”. A maioria das palavras em galego-português provêem do acusativo latino que neste caso seria “MAGUM USTUM” donde seria mais fácil explicar a deriva para “Magusto”, e mesmo em dativo “MAGO USTO” literalmente “…ao ou para o mago queimado” querendo falar quiçá dumha fogueira para queimar magos segundo criterios anti-pagaos medievais? Quiçá se refira à fogueira onde os magos faziam as suas queimadas entendidas como rituais com fogo? Pode derivar daí a queimada galega com o seu ritual hoje vulgarizado e desprovido de qualquer conotaçom esotérica?

A tradiçom do “Halloween” é conhecida últimamente pola extensom dos costumes norteamericanos favorecidos pola hegemonia cultural e económica dos Estados Unidos onde se extende esse tradiçom europeia transladada polos emigrantes ao novo continente e exportada desde ali ao resto do mundo. Aquí na Galiza está tendo umha certa popularidade nos últimos anos em certos centros de ensino primário e secundário quiçá por mimetismo com os costumes anglo-saxónicos popularizados pola TV ou também por um conceito do celtismo mal entendido. Se bem é em origem britânica e celta esta festa, também é certo que nom todos os países celtas repetem as suas tradiçons da mesma forma.

Na tradiçom galega com toda segurança o Magusto provém do Samhain celta empobrecido últimamente polo pouco conhecimento dos guias culturais e pedagógicos do Nosso País e reduzido a umha simples tradiçom gastronímica com castanhas, vinho e chouriço como protagonistas, mas também a tradiçom dos cabaços é própria e autóctone tendo-se manifestado nas datas das que levamos falado durante todo este trabalho em lugares da Galiza preferentemente marinheiros onde o temos registado como por exemplo Cangas, Mugia ou Cedeira.

Quero reivindicar, portanto, desde aqui a festa do Magusto galega com o seu nome tradicional e histórico: Magusto, nom Samhain, como certos pseudo-etnógrafos tentam popularizar. Nom somos mais celtas por chamarmos-lhe Samhain em vez do nome galego tradicional “Magusto”. Quero reivindicar a festa dos cabaços como também galega, mas nom anglo-saxónica nem com nome inglês “Halloween”, desejo pureza nas nossas tradiçons, nom contaminaçom norteamericana; quero aliás um Magusto como tradiçom a recuperar para todo o nosso país, reinvindicar tudo isto para o dia 11 de Novembro, data histórica, herdeira do primeiro de ano céltico e quero reivindicar um Magusto de origem celta, mas nom celta de qualquer lugar, nom, celta, mas galego, ou melhor galaico, já que existe também em Portugal e na Astúria, polo qual com características próprias embora com parentescos nas ilhas britânicas e na velha Gália.

Nota: Artigo da autoria de José Manuel Barbosa e publicado no jornal “La Región” em 11 de Novembro de 1997, e nesta altura reformado e ampliado para a sua publicaçom no PGL em Novembro de 2004.

Jomaba
Enviado por Jomaba em 17/08/2008
Reeditado em 02/12/2008
Código do texto: T1132045