O herói imprudente

Se vivêssemos na ética de Platão e Thomas Moore, o caso da menininha assassinada pelo próprio pai e madrasta, seria tratado com toda probidade e discrição possível para se resguardar o infortúnio de todos os envolvidos.

Em contrapartida, o surfista que após salvar quatro e não salvou a si próprio do afogamento, seria idolatrado nacionalmente e honras de herói coroariam seu funeral.

Possivelmente não existe uma sociedade utópica, mas com certeza ambos casos em poucos lugares dessa nossa Terra, seriam assim tratados.

Gosto de ler os cronistas mais do que os poetas. Os poetas porque dizem o que deveria ter sido. Os cronistas me acordam. Os poetas me fazem sonhar.

Crônicas mil foram escritas, muitas vezes no puro intuito de satisfazer a morbidez humana, coisa que deveria ser discreta e individualizada. Mas, aqui na nossa terrabrasilis, esses cronistas mil fazem dessa antivirtude humana um comportamento banal e carnavalesco.

Nelson Rodrigues escreveu que o brasileiro só era solidário na dor. Eu diria que dependendo do tamanho da dor, carpidas brasileiros vão de um lado pro outro.

O que interessa é fazer caras e bocas de sofrimento e indignidade. Formarmos um cordão solidário de apoio falso uns aos outros. No cérebro de cada um, endorfinas são descarregadas, alimentando esses neurônios dessa obscura parte da índole humana. Isto nos torna viciados, procurando cada vez mais pela banalidade da violência, coisa prevista por Hanna Arendt, já nos anos cinqüenta.

Toni Villela, morreu aos trinta e dois anos (nenhum religioso fez alguma analogia sobre a idade de Jesus ou pediram sua beatificação), deixa esposa e filhinha de onze anos.

Ele não era político nem celebridade que merecesse os quinze minutos warholianos de fama para justificar o luto nacional. Toda Guarujá faz caras e bocas e seguem com a caravana

Toni foi simplesmente um herói.