Os Médicos e a Interiorização

Vez por outra se lê, se ouve, e se assiste nos meios de comunicação reportagens apresentando estatísticas onde se observam que a maioria dos médicos encontra-se nas grandes cidades, em detrimento do interior do País.

Neste momento surge uma pergunta. Qual ou quais são os motivos que levam estes profissionais a fazer esta escolha? Por que esta é a opção mais selecionada? Irei avaliar, sob minha ótica, emitir uma opinião de mais de 20 anos trabalhando no Interior deste maravilhoso Brasil.

Sou do sul do Ceará, nascido em Aurora, cidade com aproximadamente 35.000 habitantes. Meu pai era fotógrafo e minha mãe funcionária pública. Quando resolvi fazer Medicina, as opções de cursos médicos eram poucas ou quase nenhuma nas cidades do interior nordestino. Escolhi Recife onde fui aprovado na Universidade Federal. Porém colei grau na Universidade Federal do Ceará. Já neste período a carência de médico era preocupante.

Eu tinha como propósito, desde que decidi ser médico, morar e trabalhar na minha cidade e nos municípios circunvizinhos. E assim o fiz logo após minha formatura. Hoje estou vivendo no estado do Tocantins onde luto e pretendo continuar lutando por uma medicina de qualidade, porém com muito respeito e consideração aos profissionais da área, em especial, os médicos.

Eu era do sertão e já, como muitos na minha situação, iam estudar fora para depois voltar. Porém não era o que acontecia. A ampla maioria via no grande centro urbano mais opções em termo de lazer, melhor qualidade de vida e, claro, mais opções de capacitação e educação médica continuada. Ou seja, estava no meio da ciência, e não era importante se afastar. O que é fundamental para uma boa vida profissional. Tinha na cidade grande o inconveniente dos baixos salários e o elevado número de médicos.

Ao retornar ao interior nos deparava-se com melhores salários, um trabalho mais ameno, e uma vida menos agitada. Além de estar no meio dos familiares, que era muito salutar. Porém era muito pobre a agenda cultural e científica, além da dificuldade para receber o salário dos serviços públicos.

Nas metrópoles onde praticamente todos se formavam, continuava sem alteração a questão laboral. Evoluindo, naturalmente, o nível da formação e da educação continuada devido ao desenvolvimento tecnológico. Os proventos cresceram não motivados por aumento salarial, mas pela estabilidade econômica estabelecida pelos governos que se sucederam, ainda assim continuando muito aquém dos soldos pagos no interior.

A avaliação hoje em dia, apesar da evolução legal e tecnológica, é que mudou pouca coisa para contornar esta situação. Aliás, mudou para pior as perspectivas para os que estão nas cidades menores.

No interior apesar dos melhores salários, o desrespeito as leis trabalhistas, os atrasos, e até calotes nos pagamentos são expedientes normalmente usados. Isto é um desincentivo à migração para o interior.

Uma grande maioria dos gestores desprovidos de amor ao próximo, sem compromisso com a população que os elegeu, e alguns analfabetos mesmo, não honram os acordos assumidos. Primeiro por falta de pacto com a saúde e, na maioria das vezes, por serem irresponsáveis. Isto causa um sentimento de profunda desconfiança.

É natural que com este tipo de incentivo, os médicos que estão percebendo menos, porém com a certeza de embolsar seus proventos nas cidades maiores, deixem de migrar. Eles têm a convicção de que o alto salário prometido no interior não será repassado no dia do vencimento. Sem se falar nas dificuldades que se colocam para permitir o médico para uma capacitação.

Para que ocorra a inversão, e, por conseguinte, a resolução deste problema, necessário se faz que tenhamos leis severas e sumárias para quem não cumprir os contratos com os interioranos.

Os CRMs e Sindicatos Médicos passem a desempenhar seus papéis com altivez. Estas entidades conjuntamente deverão desenvolver ações no sentido de se fazer cumprir os acordos existentes entre os médicos e as prefeituras. Além de, em último caso, mobilizar os colegas para deixarem de atender, literalmente, nas cidades onde não forem cumpridos os acordos de trabalho. Se possível, até como uma medida extrema, divulgando nos meios possíveis uma lista de prefeitos e prefeituras que não são confiáveis ou não recomendados.

Trabalhar no interior é exeqüível. Tanto é que o PITS (Programa de Interiorização do Trabalho em Saúde - MS) foi uma experiência exitosa, pois capacitava e pagava rigorosamente em dia.

Ir para o interior do Brasil hoje é uma questão meramente legal. Pois os salários e a qualidade de vida, que era um empecilho, têm melhorado sobremaneira nas pequenas e médias cidades.

Este profissional que for morar em qualquer local, por mais longínquo que seja, precisa de garantia que receberá seus proventos, terá avalizada a oportunidade de capacitação, bem como tudo que estiver sido acordado previamente. Esta é a chave do problema.

José Arimatéia de Macêdo

Médico – CRM TO 666

Sítio: www.arimateia.com