O GOSTO DOS HOMENS

Há uma semana, em entrevista concedida à imprensa, o senador pernambucano Jarbas Vasconcelos resolveu bombardear a política partidária brasileira. Entre diversas coisas, disse que todos os partidos estão impregnados pela corrupção. Dissidente do PMDB, não poupou seu próprio partido, aliás, contra ele, dirigiu fala áspera: que o que tem motivado o gigantismo do PMBD é o fisiologismo, e que todo mundo sabe da corrupção que há em seu meio.

Disse isso e se recusou a apontar nomes. Justificou sua recusa com o esclarecimento de que estaria “combatendo práticas” e que não iria ficar “puxando listas, o que seria muito volumoso.” Segundo ele, para que isso fosse investigado, deveria haver uma pressão, mas que não iria comandar esse processo; apenas teria aberto o debate dando o pontapé inicial.

Depois desse esclarecimento, foi ao ataque novamente: “O PMBD é uma confederação de interesses regionais. Não tem uma liderança nacional para disputar [a eleição presidencial], não tem um líder para empolgar o partido.”

Disse tudo isso e não foi molestado, uma vez que o PMDB silenciou-se sobre suas acusações e preferiu divulgar “uma nota que trata como mero ‘desabafo’ as acusações feitas por seu senador.”

Com a nota, o PMDB demonstrou claramente que não revidaria ao ataque e que se postaria na defesa, ou melhor, que se aquietaria dentro de seus domínios enquanto buscasse um meio de remediar os estragos que vieram, bem como de impedir a chegada de novos, minimizando a visão dos escombros de sua hoste. Quanto ao senador, ao que se sabe, não teria tido maiores aborrecimentos. Se os não teve, a imaginação dos motivos não deve ser muito difícil, posto que, noutras circunstâncias, certamente, ouvir-se-ia falar em processos etc. Não se ouviu, e o silêncio, enquanto perdurar, dá a vitória ao senador.

Disso tudo, é possível fazer uma analogia: se um evento assim ocorresse numa partida de futebol, terminada ela, depois de tão fragorosa derrota e intenso olé, seria a hora do “bate-boca” entre jogadores, técnicos etc., cada um querendo livrar-se da própria culpa. Mas não foi partida e não houve bate-boca. Pelo menos, ou não houve ou não chegou a conhecimento público.

De qualquer forma, o certo é que a cúpula do PMDB encontrou na receita “desabafo” um modo de minimizar a crise. Minimizar, mas não de dirimir as dúvidas que envolvem a Nação a respeito da afirmação senatorial. A Nação, atualmente, tem mais raciocínio crítico que outrora, e enxerga os motivos desse tipo de solução, principalmente se o raciocínio é alimentado por um sem número de processos sobre cujas razões de ser a opinião pública faz pelo menos alguma idéia. Não só contra os do PMDB, é claro, como nas palavras de Jarbas Vasconcelos: “todos os partidos estão impregnados pela corrupção”.

Diferentemente das monarquias, que têm na Honra seu pilar central, as repúblicas têm-no na Virtude, segundo alguns ensinamentos de Montesquieu (1689 – 1755), que vigoram desde 1748.

Então, visto o fato tal como ele se afigura e em nome da virtude da república brasileira, coerente seria que a fala do senador fosse colocada a limpo; e que o “jogo” não terminasse imediatamente depois do “pontapé inicial”.

Se a razão estiver com a fala, que se limpem os partidos. No caso de o senador não ser molestado e os partidos não limpos, cumpriria citar Leibniz (1646 – 1716): “é que os homens gostam muito de enganar e ser enganados”. Há, porém, uma certa gradação nesse gosto; e, acima de se levar em conta o gosto dos homens individualmente, há o gosto da Nação.

José Izidro Manoel é graduado em Letras.

izidro.jim@hotmail.com