NOSSA ESTRELA CAI?

Sérgio Martins Pandolfo*

Verdadeira aberração geográfica, astronômica e cívica poderá ser perpetrada contra um dos símbolos pátrios, seguramente o mais significativo e reverenciado deles, a Bandeira Nacional, caso venha a ser aprovada no Plenário da Câmara e, a seguir, sancionada pela Presidência da República. É que a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) vem de aprovar, no dia 23 de junho p.p., por unanimidade (o que faz crescer o perigo), emenda do Senado Federal ao Projeto de Lei 350/99, do Poder Executivo que trata das formas e da apresentação dos símbolos nacionais. Por essa emenda, proposta pelo senador Marcelo Crivela (PRB-RJ), entre outros itens propõe-se a troca das estrelas correspondentes ao Pará e ao Distrito Federal no círculo azul da bandeira nacional.

Como é sabido, em nosso "lábaro estrelado" a única estrela situada acima da Eclíptica - faixa branca com o dístico Ordem e Progresso - é a chamada “Spica” - Alfa de Virgem, representativa do Estado do Pará, a patentear que temos terras nos hemisférios Norte e Sul. Aponte-se, ademais, que o projeto original do Poder Executivo mantinha essa situação, advinda aquando da instituição de nossa Bandeira Republicana, criada pelo decreto nº 4, de 19/11/1889, quatro dias somente, portanto, após a Proclamação da República que se deu em 15/11/1889.

O projeto vencedor da Bandeira Nacional foi o de autoria de Raimundo Teixeira Mendes, assessorado tecnicamente pelo astrônomo Manuel Pereira Reis e, artisticamente, pelo pintor Décio Vilares. Já no Diário Oficial de 24/11/1889 o autor fez a exposição de motivos, alegando, entre outras coisas, que a posição relativa das estrelas, na bandeira, obedecia ao aspecto do céu, na cidade do Rio de Janeiro, às 8h e 30 min. do dia 15/11/1889. À época ainda não tinham sido criados os atuais estados de Roraima nem o do Amapá (que integrava o Pará), sendo assim o nosso Estado o que se situava mais ao Norte, em grande parte acima da linha do Equador (representado pela faixa branca de nossa flâmula), daí a razão de ser da única estrela locada acima dela. Nosso símbolo maior tem, portanto, a autenticá-lo, o início do regime republicano que soberanamente adotamos.

Julgamos que não há dentre todas as flâmulas dos atuais 218 Estados soberanos do mundo, um pavilhão em que se haja aplicado tamanho esmero, precisão e significância na sua constituição, a ponto de merecer por parte do grande Rui Barbosa, o Águia de Haia, a extasiada exclamação: “Ufa! É a bandeira mais linda do mundo”. Mexer nesse “símbolo augusto da Paz” é incidir, para além da aberração geográfica e astronômica, em crime cívico de lesa-pátria. O que é tão-somente permitido é acrescentar ou suprimir estrelas se novos estados forem criados ou extintos, nunca na arrumação delas, em suas constelações, que é preciosa.

Se aprovada a supradita emenda haverá simplesmente uma permuta das estrelas representativas: nossa atual, “Spica” (a de situação mais alta), passará a representar o Distrito Federal e o Pará terá a exprimi-lo a que hoje simboliza o DF, a mais inferiormente locada, configurando verdadeira incongruência geográfica, eis que o Pará situa-se no Norte e o DF no centro do País.

Este é mais um dentre os estapafúrdios projetos de alteração de nossos símbolos maiores: a Bandeira, o Brasão d’Armas, o Hino Nacional e o Selo da República. Símbolos nacionais são coisas sagradas, a expressar a soberania do País, e que nos identificam como nação, como pessoas que compartilham uma mesma terra e uma mesma língua. Não podem, nem devem, ser mexidos, alterados açoradamente, ao sabor das vontades de insipientes “representantes do povo”, que certamente não compartilha com essas peripécias legiferantes nem as abona. Cabe aos nossos representantes no Congresso pugnar pela repulsa e rejeição desse projeto inoportuno, desqualificado, despropositado, infeliz enfim, contra mais esse esbulho que se delineia contra o povo parauara em particular e contra a Nação como um todo.

--------------------------------------------------------------------(*) Médico e Escritor. ABRAMES/SOBRAMES

E-mail: serpan@amazon.com.br

Sérgio Pandolfo
Enviado por Sérgio Pandolfo em 09/07/2009
Reeditado em 10/07/2009
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