Perdas e ganhos

Certa vez, em uma de suas tantas andanças, um sábio e seu discípulo encontraram uma família muito pobre e numerosa, que morava numa pequena casa na zona rural. O único bem que possuía era uma vaca, que fornecia leite para seu próprio sustento e para a troca básica por outros poucos alimentos. Apesar da pobreza, o dono da casa – um pequeno lavrador – era extremamente generoso; ele e sua família ofereceram ao sábio e a seu discípulo tudo o que dispunham naquele momento.

Assim que resolveu prosseguir viagem, o sábio pediu ao seu discípulo que jogasse a vaca num despenhadeiro. Indignado e intrigado com aquele estranho pedido, o discípulo questionou: “mestre, o lavrador e sua família nos receberam com tanta hospitalidade. É assim que o senhor retribui?” O sábio insistiu no seu pedido, dizendo apenas que um dia ele entenderia a sua atitude.

Anos depois os dois retornaram ao mesmo local e, para espanto do discípulo, no lugar do casebre havia uma casa ampla e bonita, um curral com muitos animais e uma plantação viçosa. O lavrador – agora um próspero fazendeiro – reconheceu os viajantes e os recebeu com ainda mais hospitalidade e fartura. Explicou que sua prosperidade começou no dia em que descobriu que sua vaca havia morrido e que nada mais poderia fazer senão trancar a casa e tentar a sorte na cidade. Lá todos da família tiveram que trabalhar e aprender novos ofícios. Parte do dinheiro que ganhavam foi guardado e utilizado para um recomeço mais digno na antiga propriedade.

Essa lenda oriental traz uma mensagem bem simples: muitas vezes perdemos algo que nos é muito valioso para que saiamos da acomodação que nos impede de pensar e agir. Uma perda qualquer pode nos possibilitar ganhos impensáveis; um erro pode nos proporcionar a não repetição de outros ainda piores.

Nesse processo de aprendizagem o erro (o dos outros e o nosso!) é, sim, muito instrutivo. Ele nos ensina de uma maneira seca, dolorosa e até cruel. Deixa cicatrizes e, às vezes, traumas que precisam ser resolvidos a muito custo. No entanto quando entendido como mola propulsora, pode nos impulsionar a conquistas inimagináveis.

Perdas e ganhos podem estar interligados, em se tratando de crescimento existencial, de amadurecimento ao longo da vida. Não é uma questão de azar ou sorte, mas de observação e entendimento. Quantas experiências negativas se repetem em nossas vidas simplesmente porque não nos atentamos para elas? A morte de alguém querido, a perda do emprego, o fim de um relacionamento amoroso são, por exemplo, situações universais e passíveis de acontecerem muitas vezes. Há quem desmorone com elas todas as vezes em que ocorrem; são os que nunca ou pouco têm o hábito de refletir sobre a própria trajetória. O preço disto é terem sempre que lidar com as perdas só perdendo...

Roberto Darte
Enviado por Roberto Darte em 24/07/2009
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