Budismo: Mente x Prosperidade

Budismo: Mente x Prosperidade

Uma frágil e diminuta semente contém a frondosa floresta. Como alerta o Venerável Mestre Hsing Yün, “um simples pensamento contém o céu ou o inferno.”

Quando um operário da construção civil é contratado para derrubar um velho prédio, após concluída a tarefa, ao direcionarmos nossos olhos para os escombros talvez seja difícil acreditar que apenas um homem, munido de uma simples marreta pudesse causar tamanha destruição. O pedreiro constrói uma casa e também pode destruí-la. A mente constrói o corpo e também pode danificá-lo e causar sua destruição.

O corpo e nossa existência (nossa vida depende dele) são como uma construção, que se submetida a constantes golpes, pode resistir por certo tempo, mas terminará arruinada. O impacto de um pensamento impuro sobre o corpo e a nossa existência como um todo, não é diferente de um golpe de marreta contra uma parede. Manter a mente pura é meta de todo praticante budista, porém, qualquer ser humano, mesmo não budista, pode conservar sua saúde e sua vida, evitando doenças variadas, envelhecimento precoce e mortes prematuras, assegurando também uma próxima existência próspera e feliz.

Enquanto não atingimos a iluminação é natural termos instantes de raiva e apego, estes instantes se repetem com freqüência formando um estado mental confuso. Podemos reduzi-los evitando gerar a ganância de querer sempre mais, a cobiça e a inveja, e a raiva. Estarmos conscientes deste fato e aceita-lo com verdade ajuda, mas ainda não resolve a questão. Por isso o C´han (Zen) enfatiza que sem praticar o que aprendemos não nos tornamos melhores em nenhum aspecto da existência.

Os pensamentos repercutem no cérebro e no corpo físico, o tipo de pensamento determina a natureza desta influência (neutra,benéfica ou maléfica). Muitas pessoas aflitas padecem sofrimentos morais, físicos ou materiais intensos e perguntam-se confusas e apavoradas “por que isto foi acontecer logo comigo?”, elas ignoram por completo ou têm teorias fantasiosas acerca da verdadeira causa de seus problemas e assim, por ignorarem ou fantasiarem, tendem a renovar e agravar seus padecimentos indefinidamente. Muitos crêem que os dramas que vivemos são castigo divino, obra do acaso ou uma perseguição demoníaca, contudo Buda ensina que os males que nos atormentam foram criados por nós mesmos na mente.

Pensamentos negativos que criamos dia após dia permanecem incubados por algum tempo, em futuro próximo ou remoto manifestam-se produzindo males abundantes que se irrompem de forma aparentemente repentina, na verdade, estavam mesmo em processo longo, lento e silencioso de gestação.

O gotejar de uma torneira danificada não é tão significativo se comparado ao fluxo das águas caudalosas de um grande rio. Não esqueçamos, entretanto que mesmo a vastidão dos oceanos resulta do conjunto de inumeráveis gotinhas.

Imagine quantos trilhões vezes quintilhões de pensamentos um homem adulto ou idoso acumulou e ainda segue acumulando em sua mente? Pensamentos de toda uma vida, se pudessem ser listados, um a um, verificaríamos, no caso dos pensamentos nocivos, uma torrente de forças destrutivas atuando sobre o cérebro e o corpo das pessoas. Estes pensamentos nascem e se acumulam na mente inquieta, e depois, feito uma desgastada e envelhecida represa que não comporta nem mais uma miserável gotinha, eles se irrompem com grande força para o corpo, impregnando de sofrimento a existência do individuo, causando-lhe todo tipo de dano. Imagina o fardo que trazemos de vidas passadas! Contudo, isto tudo pode ser interrompido. Basta que nos não ignoremos ou menosprezemos um simples pensamento, nele está a possibilidade de firmamos nossa fé e sabedoria ou enraizamos mais profundamente nossa ignorância tornando ainda mais difícil a tarefa de remover o sofrimento de nossas vidas.

É impossível ao ser humano deixar mente numa gaveta, na garagem, na caixa do correio ou esquecê-la em algum lugar, a mente é nossa única e inseparável companhia diária, está conosco antes do nascimento e conosco continuará após a morte. A Atividade mental, ou pensamento, está para mente, como calor está para o fogo. Já que a atividade mental é contínua, (mesmo quando dormimos, pois os sonhos são formas de atividade mental) devemos considerar seriamente o teor ou a natureza dos nossos pensamentos. Não damos importância a um instante de raiva, inveja, tristeza e cobiça, por que são pensamentos fugazes, vem e vão rapidamente feito um relâmpago, agravando o fato, em geral vivemos absorvidos em distrações ou preocupações excessivas frente às quais este tipo de assunto soa estranho e como perda de tempo nesta sociedade composta por homens e mulheres apressados e agitados.

Se conseguirmos perceber que estamos, por exemplo, com raiva, conscientes que este pensamento é um dos germens de estados mentais infernais, podemos evitar que estes instantes se repitam, evitando o mal, no entanto, a maioria de nós não vê prejuízo num simples pensamento. Preocupa-nos detalhes como a cor do novo carro que desejamos comprar, odor do perfume que nos é oferecido numa loja, a combinação de roupas que pretendemos usar,e com tantas outras superficialidades, mas não temos o mesmo zelo e preocupação com o que realmente nos torna felizes ou infelizes, nos arremessa aos reinos superiores ou inferiores da existência: o pensamento, o embrião de tudo que se vive. Por isso alastram-se doenças, dores, mortes infames, miséria,fome, guerras, espíritos famintos, seres em estado bestial e infernal.

Em geral somos especialistas em algum assunto ou vários, por necessidade profissional ou mesmo por hobbye, precisávamos estudar com igual afinco a lei de causa e efeito e nos tornamos peritos no autocontrole mental. Sem controle mental toda riqueza, saúde e vida podem ser arruinadas. O próprio planeta, onde a maioria de nós continuará renascendo já está sendo incendiado por bombas e sacudido por catástrofes de todo tipos devido a falta da preocupação com a purificação mental.

O que nasce na mente humana dirige as ações humanas!O destino de cada ser humano e da raça humana em si é traçado por instantes de atividades mentais solenemente desprezados.

Como tentar vivenciar estes ensinamentos?

A pergunta pode ser respondida assim: com desapego gradativo, pacificação da mente (extinção da raiva) e decisão de não praticar o mal e praticar o bem, na medida das nossas possibilidades, em jamais desistir desta decisão. Convém salientar que desapego não é auto-abandono e desleixo, é o não agarramento.

Pacificação da mente não é estado de alienação e indiferença. É desprender-se da agitação mental derivada da raiva e da ganância e cuidar dos outros seres, sem oprimi-los com cobranças de retribuição ou humilhá-los ao ajudá-los.

Um ensinamento cristão muito valioso e familiar a todos, ajuda a clarear a questão: a exortação de “amar ao próximo como a si mesmo” pode nos indica por onde começar.

Onde está este próximo? Na vastidão do espaço sideral, nas profundezas dos oceanos, nos outros países? São os desconhecidos de outros povos distantes, com os quais não temos a mínima relação? A resposta, obviamente é não. Eles estão em casa, no local de trabalho, e na nossa vizinhança. Os ambientes que habitamos ou freqüentamos rotineiramente está repleto de “ o nosso próximo”, ou seja, aqueles que convivemos.

Essa convivência não se dá por um acaso, trata-se de bons e maus vínculos formados a partir de existências passadas. De pouco adianta nos preocuparmos com os problemas sociais do mundo, se ”não queremos fazer a lição de casa”. Esforçando-nos nesta prática, estaremos em treinamento para beneficiar todos os seres, de forma que não haja mais a distinção de “eu” e o “outro”, paises, raças e povos, animais racionais e irracionais, seres orgânicos e inorgânicos. Tudo isso tenderia a desaparecer diante de uma compaixão sem limites.

O amor que se recomenda nesta máxima , é apenas um outro nome que se dá para a compaixão e a generosidade (intenção e ações puras e benéficas). Mesmo que elas eventualmente nos obriguem a alguma cota de renúncia e sacrifício, estas duas forças serão meios poderosíssimos para limpeza do mau carma e remoção dos venenos mentais que poluem e degradam a mente e o mundo. Além da doação a estes seres, podemos contemplar a natureza da existência dos seres sencientes e de todas as coisas, que devotamos imenso apego ou aversão. Podemos contemplar o fato que as coisas e pessoas que julgamos serem nossas são impermanentes, murcharão e desaparecerão diante dos nossos olhos, como uma flor num vaso, linda pela manhã e extinta à noite. Meditar no fato de que a juventude não é eterna, e a velhice ganha espaço dia a dia é igualmente benéfico para aquietar a mente. Podemos olhar nosso corpo pela manhã refletido no espelho e dizer com toda certeza: não é o mesmo de ontem! Amanhã também estará diferente.

A beleza desaparece. Há um vai e vem infinito. Toda arrogância se desfaz diante destas verdades. A ganância e a raiva tendem a se enfraquecer diante de um exame profundo da transitoriedade dos fenômenos. Existe algo a que se agarrar neste mundo, que justifica a noção de “isto é meu” ?

Não podemos evitar certas doenças, o envelhecimento e a morte. Então por que não tornar os seres, enquanto eles e nós perambulamos por este mundo, menos sofridores?

Estas constatações não são motivos para negligenciar ou negar cuidados às pessoas e ocupações diárias alegando a temporalidade e deles, que são “vazios”. Pelo contrario, nos faz ver que cada ser e oportunidades são raros e especiais. Todos ingressam neste mundo sem nada e sozinhos e partem dele em idêntica situação. Não há garantias de estarmos vivos após inspirarmos um pouco mais de ar. Logo, não há razão para tanto apego ou ganância, raiva e angústias. Todos os seres são dignos de nosso cuidado. Isto nos faz direcionar a atenção à única “coisa” que vem conosco, de existências passadas para este mundo e segue conosco para as existências futuras, neste ou em outros mundos: a mente.

Na mente colhemos do nosso passado e plantamos para o futuro. Por isso o budismo chinês associa a mente a um campo de cultivo de méritos. Infelizmente a maioria de nós planta deméritos. Relegar a mente a indiferença, menosprezar as conseqüências do pensamento é torna-se escravo do sofrimento. Se o mal nasce gradativamente na mente impura e descontrolada, nossos passos na pratica espiritual seguem o mesmo princípio. Todo um dia um pouco, no dia seguinte, se possível, um pouco mais. Nem precisamos forçar oportunidades e ficarmos obcecados por isto, é no dia a dia, isto, mudando a forma de viver a rotina, que lenta e silenciosamente a transformação espiritual acontece.

Dar atenção a um simples instante é saber que uma frágil e diminuta semente contém a frondosa floresta e que um simples pensamento contém o céu ou o inferno, como alerta o Venerável Mestre Hsing Yün.

Purificação da Mente e do Corpo

Para interromper a degradação da mente, de imediato deveríamos observar os Cinco Preceitos, que são: não matar, não roubar, não mentir, não ter má conduta sexual e não se intoxicar. Os benefícios são extensivos ao corpo, pois ele próprio é uma expressão da mente.

Vale lembrar que palavra, ação e a retribuição cármica são resultantes de pensamentos Tudo nasce na mente, assim deveríamos conter ímpetos mentais que nos fazem ter maus pensamentos e atitudes neles nascidas.

Precisamos não encarar as recomendações de Buda de forma simplista e superficial. É difícil delimitar a profundidade dos Cinco Preceitos.

O matar não significa apenas afligir ou ferir mortalmente outros seres vivos. Matar esperança alheia, matar o tempo, matar a paz de espírito das pessoas e dos seres é transgredir primeiro preceito Não matar. Afinal, tudo é vida!

Não devolver ou devolver danificados objetos emprestados, explorar as pessoas sugando-lhes seu tempo e saúde é uma forma de roubo, podemos roubar a comida de um faminto quando injustificadamente jogamos restos de comida, que deixamos no prato, no lixo - o excesso num lugar, é escassez em outro.

Não mentir vai além de simplesmente falar mentiras. Tem haver com o bom uso da faculdade da fala. Promover boatos, ofensas, intrigas, instigar a violência, falar “verdades” com má intenção ou irrefletidamente, confundir ouvintes propositalmente para obter vantagens pessoais, além da ofensa gratuita tudo isso é um grande engano no uso da fala.

Não ter má conduta sexual está para além da violência sexual ou traição conjugal. Brincar com os sentimentos alheios, o egoísmo, abusar do corpo, como se fosse mero brinquedo também traz más conseqüências.

Não se intoxicar não se restringe ao não uso de bebidas, cigarros e entorpecentes. Toda forma de fuga da realidade é uma maneira de entorpecer a mente. Todo excesso pode extraviar a mente e produzir danos, mesmo coisas feitas de forma ética, porém excessiva ou inoportuna são prejudiciais: a atividade sexual excessiva, viciação no trabalho, TV e internet, alimentação excessiva e fora de horário, viagens excessivas e desnecessárias, pratica esportiva, quando feita de forma obcecada ou com intuito de fuga, nos prejudicam ou nos a levam prejudicar outras pessoas .

Se refletirmos detidamente e com profundidade em cada item exposto, chegaremos a conclusão se estamos ou não em dia com os Cinco Preceitos e por extensão, com a lei de causa e efeito. Vivenciando os preceitos, criaremos causas e condições que no futuro nos protegerão de:

1- Doenças de gravidade variadas, agressões, mutilações, mortes violentas ou prematuras;

2- Limitações físicas, roubo, miséria e exploração de todo tipo;

3- Doenças do aparelho vocal, fraudes, ofensas, perseguições e frustrações;

4- Doenças de gravidade variada, solidão, abandono;

5- Confusão mental, demência, má formação ou mau funcionamento de órgãos.

Perguntas semelhantes a “como isso foi acontecer comigo?” ou ” por que estas coisas não acontecem aos outros?”, seja em se tratando de pequenos dissabores ou grandes tragédias, se repetirão indefinidamente ao longo desta e das próximas existências, pois ignorando ou desdenhando do valor e das implicações da recomendação de Buda a respeito de ser cultivar a mente pura, que mais poderíamos esperar? A maioria expressiva dos males que assolam os seres humanos e o meio ambiente nascem da transgressão destes preceitos a solução está igualmente embutida neles.