A MENSAGEM EXPRESSA DA NATUREZA: RELATOS, DIÁLOGOS E REFLEXÕES

A MENSAGEM EXPRESSA DA NATUREZA: RELATOS, DIÁLOGOS E REFLEXÕES(1)
Marta Cosmo(2)

RESUMO: O presente trabalho configura-se numa reflexão sobre a natureza e a ação humana que culminou com a situação desesperadora em que vivemos agora: num desequilibrio das forças do nosso planeta . O que podemos fazer? Qual a mensagem da natureza para conosco? Que principio ético precisa ser seguido? Perguntas que se desenvolveram-se em movimentos que, ora partiam de um olhar geral para o particular, ora do particular para o geral, expressando-se na busca de um diálogo, de um compartilhar e refletir comigo mesmo e com o prezado leitor. Misturaram-se a essa reflexões as idéias filosóficas dos seguintes pensadores: Martim Buber, Emmanuel Lévinas, Hans Jonas e Paul Ricouer.
ABSTRACT: The present work configures in a reflection on the nature and the action human being who culminated with the despairing situation where we live now: in a disequilibrium of the forces of our planet. What we can make? Which the message of the nature stops with us? What I begin ethical needs to be followed? Questions that if had been developed in movements that, however left of a general look for the particular one, however of the particular one for the generality, expressing themselves in the search of a dialogue, of one to share and to reflect exactly with me and the readingdear. These reflections had joined it the philosophical ideas of the following thinkers: Martim Buber, Emmanuel Lévinas, Hans Jonas and Paul Ricouer.

PALAVRAS-CHAVES: natureza, ser humano, diálogo, consciencia, responsabilidade.
WORD-KEYS: nature, human being, dialogue, conscience, responsibility.



INTRODUÇÃO
Relatos, reflexões e diálogo: essas palavras formam o tecido dos objetivos presentes nesse artigo. Relatos de um sentir com a natureza que leva à percepção de sua mensagem expressa numa linguagem imponderável, além do ouvir e do ver. Relatos que se configuram como um caminho em que convido o prezado leitor a comigo trilhar as entradas, as trilhas e vielas do pensamento e da reflexão que é um caminhar em estrada infinita. Refletir nossa visão sobre a natureza, nossas ações (éticas e não-éticas), e o que a humanidade tem feito e o que pode ainda fazer para com a mesma.
Na primeira parte apresento uma visão geral dos nossos gestos diários em relação à natureza uma tentativa de entender nossa ação firmada numa ideologia de discursos vazios, não-vividos; na segunda, relatos de acontecimentos, a respeito do assunto em questão, que presenciei e vivi como um meio de refletirmos sobre a linguagem da natureza que se apresenta diante de nós e quase sempre não a percebemos; e por fim um diálogo sobre nossa relação com o meio ambiente os supostos motivos de nosso comportamento e a reflexão sobre a nova ética proposta por Emmanuel Lévinas sobre o compromisso com a natureza, seguidas de minhas considerações finais. Assim Natureza, o ser humano, o diálogo, responsabilidade e consciência, são as centelhas de luz que iluminarão o presente trabalho.



01. CANÇÃO DA TERRA : A BUSCA DE UM DIÁLOGO ENTRE O SER HUMANO COM A NATUREZA E CONSIGO MESMO.

Junho de 2009. Uma música espalhava-se pelo ar e tão docemente quanto a voz que a cantava. Seu tom expressava-se como um diálogo, outras vezes num apelo ou clamor. A letra da música, pronunciada em inglês, falava sobre a Terra, os mares, a chuva, os animais, os seres humanos, enfim, sobre a natureza como um todo. Seu título era “Earth song”(3) (Canção da Terra) de Michael Jackson que, com o falecimento inesperado do mesmo, tocava exaustivamente juntamente como outros seus sucessos. Confesso que não a conhecia, mas por tratar sobre a natureza logo me interessou. Procurei sua melhor tradução e me encantei com o material conseguido. Além da tradução, encontrei um vídeo sobre a música que retratava fielmente a intenção de seu idealizador: a preocupação com o destino da natureza e consequentemente da humanidade. Preocupação esta de que também compartilho. Além disso, li sobre a vida do referido artista e percebi, sobretudo, que utilizou sua arte para divulgar uma mensagem importante comprometida com o mundo e seus habitantes, num discurso que alertava sobre a destruição da natureza, as guerras, a fome nos paises subdesenvolvidos, dentre outros. Só então pude perceber o ser humano que o mundo havia perdido e sofri ainda mais essa perda. Antes o achava excêntrico e estranho, por não o conhecer. Hoje o vejo humano e sensível.
Tal fato me interpelou as seguintes reflexões: será que não se percebe ou não se sente a dor de se perder a natureza por não a conhecermos verdadeiramente? Será que só se perceberá o valor da mesma depois que não mais existir, talvez juntamente conosco, e no instante último? E estas também são indagações que o referido artista fazia através de sua música em frases como estas: “Você já parou para pensar que a Terra, os mares estão chorando”; “O que fizemos com o mundo?”; “E o valor da natureza?”; “A gente se importa?”.
Respondendo à ultima pergunta, o que se pode dizer? Observa-se nos dias atuais que a consciência em se preservar a natureza na maioria das vezes limita-se a um mero discurso. Muitos dos que falam em defesa da natureza pouco ou nada fazem de concreto sobre o que apregoam. Assim todos, e principalmente o foco da educação que são as crianças, futuros herdeiros da Terra, aprendem uma cultura de palavras sem atitudes. Aprendem que discursos são apenas para serem falados e não vividos. Dentro do pensamento de que cada um de nós deve fazer a sua parte para melhorar o mundo em todos os sentidos, quantos de nós pratica com perseverança o exemplo de separar adequadamente o lixo doméstico? Quantos de nós economiza água? É possível ver até mesmo funcionários de escolas varrerem a calçada da mesma com uma mangueira a jato. Sobre a nossa fauna, quem a protege? O que se vê em jornais impressos e televisiveis são flagrantes da caça predatória e o contrabando desmedido de animais silvestres. É comum inclusive a venda de adereços feitos de penas de aves em processo de extinção, serem vendidos por indígenas e outros. Adereços estes que inúmeras pessoas compram sem a menor preocupação de saber sobre sua origem, mas tão somente com a questão do belo e do exótico. Sobre o desmatamento das florestas, é comum muitos de nós comprar móveis feitos de madeira sem investigar a procedência, outros consumem carne vermelha indiscriminadamente, compram carvão para realizar churrascos e assim financia indiretamente os rebanhos de gados que aumentam progressivamente e requerem mais e mais espaço. Seu avanço e crescimento é diretamente proporcional ao recuo e destruição das florestas. Ainda sobre a poluição, são presenciadas ações de pessoas físicas e jurídicas jogando seus dejetos no leito dos rios. Eu sei, prezado leitor, que reproduzo um discurso repetitivo que se torna até mesmo desgastado. No entanto, independente do seu credo, mas dentro do que acredito, há um discurso que me chamou a atenção dentro do catolicismo expresso num momento em que uma jovem vidente pergunta à Nossa Senhora por que sempre em suas aparições ela dizia a mesma coisa, ainda que com outras palavras. Sua resposta foi esclarecer que o motivo era muitos não a terem ouvido ainda. Então esta também é a minha posição e de tantos outros que possuem o mesmo ideal. Assim, o que fazer diante de tamanho desconcerto? Por onde começar? Como diz a música “Earth Song”, referindo-se à destruição que o ser humano causou à natureza até o momento e as conseqüências catastróficas desse ato: “Já não sei onde estamos embora saiba que já fomos longe demais.”
Tal frase expressa, misturada às imagens do vídeo e a voz suplicante de Michael Jackson, foram capazes de arrancar-me lágrimas da alma, enquanto lembranças relampejavam em minha mente remetendo–me a fatos: alguns mundialmente conhecidos como o Tsunami em Kalutara, Sri-lanka (2004), o terremoto em Bagh, Paquistão (2006); outros particulares que marcaram minha vida, os quais compartilharei a seguir, com o prezado leitor, como um meio de reflexão.


2.0. A LINGUAGEM DAS ÁRVORES: DOIS RELATOS
2.1. Criar raízes: ser árvore sem ser.

Março de 2008. Deviam ser umas treze horas e trinta minutos da tarde. Estava numa parada de ônibus esperando condução para retornar para casa. O tempo passava e nada de consegui-la. Pensei então: “Daqui a pouco criarei raízes, aqui, de tanto esperar”. Ao pensar aquelas palavras, subitamente senti algo estranho. Uma sensação diferente que me conduziu a olhar para uma árvore que estava do meu lado. Já a havia notado, bem como outras ali perto, mas daquela maneira que estava acontecendo, não. Aproximei-me mais ainda dela e a toquei. Que bela árvore era! Parecia ser antiga pela largura de seu caule e a aspereza que possuía em sua casca. Continuei tocando-a. Sentia vontade de abraçá-la. Fechei os olhos e espiritualmente abracei-a. E que abraço pleno de eternidade e paz pude dar e receber! Mas o acontecimento não parou por ai. De repente, e pouco a pouco, senti como se me tornasse ela própria. Meus pés aprofundavam-se nas entranhas da terra e podia sentir todo o aconchego e frescor que emanava desta. Que sensação agradável! Podia sentir as águas sob o solo que penetravam-me percorrendo meu corpo por inteiro. Dos meus braços e cabeça pareciam pender galhos e folhas. Inexplicavelmente passei a ser aquela árvore, sem deixar de ser eu mesma. Estaria delirando? Estaria enlouquecendo? Pus-me a pensar, então, em coisas que conhecemos lógicas para testar minha sanidade, como cálculos matemáticos (as raízes de números, por exemplo). Olhei em volta e tudo estava e continuava normal. Reconhecia tudo e a mim mesma. E aquela sensação de sentir a árvore em toda a sua dimensão perdurava em minha espera pela condução. De volta, dentro do ônibus, refletia sobre aquele acontecimento. Nunca havia vivido aquilo antes. O que poderia ter motivado aquele fato? Que portal invisível e imponderável poderia existir no ar capaz de levar-nos inesperadamente a um lugar, um sentir paralelo desconhecido? Aquilo não cabia em nenhuma lógica. Poderia aquilo repetir-se algum dia? Nenhuma resposta conseguia me responder.
Passado alguns dias, trafegava pela mesma estrada. Quando ia me aproximando do lugar, onde estava aquela árvore, fiquei atenta para que não passasse sem que a visse. Ao vê-la, subitamente senti-me sem braços, sem cabelos... Mutilada inesperadamente. Ela havia sido podada severamente. Sem palavras ou ação segui imóvel. Apenas os pensamentos diziam-me que eu deveria ser uma voz. Uma voz que levasse aquela mensagem.

2.1. Pavor na mata: um testemunho

Final de maio de 2008. A Faculdade de Artes Visuais, em uma de suas disciplinas, pediu-me um trabalho, em imagens, que transmitissem uma mensagem. Pensei; era minha oportunidade de falar de alguma forma o que vivera e sentira naquele dia. Viajei ao interior do Estado do Pará com o objetivo de concretizar as idéias de meu projeto artístico, intitulado: A quinta essência da natureza. Sabia que não seria nada fácil, mas segui em busca de meu ideal. Chegando à cidade escolhida, segui para uma região onde havia corte de árvores. Segundo o informante, ali apenas se cortava as árvores que caiam naturalmente, pelo menos em seu terreno. No entanto, confessou que na alta madrugada ouvia barulho de motos-serra, indicio de roubo de madeira, ao qual ele disse que combatia. Minha intenção era demonstrar através de fotos que a natureza é uma só e que o ser humano é parte integrante dela. Dessa forma, destruindo-a, estará destruindo a si próprio (ver F.1). Depois de várias fotos que resumiam esse objetivo, foram surgindo outras idéias, como fotografar a encenação do passo a passo do corte de árvores, mas inserindo nelas uma característica vital da vida humana: em vez da seiva das árvores uma simulação da seiva vital humana. Não iria corta nenhuma árvore para isso, porém somente aproveitar as já cortadas ou com cicatrizes de cortes em seus troncos. Pedi então ao informante que encenasse as seqüências de tal ato.
Este então foi buscar um moto-serra enquanto eu o aguardava na mata. Naquele momento, ali sozinha, pus-me a fotografar o que via: insetos (pernilongos com inúmeras asas que pareciam dentes de leões) que nunca havia visto, flores silvestres dentre outros. Ás vezes parava para sentir a natureza em toda sua dimensão física e espiritual. Havia tranqüilidade ali: uma paz feita de infinito. A brisa soprava às vezes suave, outras fortes fazendo com que algumas folhas caíssem silenciosas e suaves. Senti-me no céu pleno de infinitude. Mas, subitamente, o ar se estagnou, uma tensão espalhou-se à medida que um som de uma dueto medonho e macabro estrondava em meio à floresta: era o grito daquele homem misturado ao do moto-serra. Inexplicavelmente uma chuva de folhas caia sobre mim por todos os lados, pela floresta. Senti-me desmoronar por dentro como feita de vidro, estilhaçada em pedaços incontáveis. Era como se me desfolhasse juntamente com elas. Conseguia, não sei por que meios, sentir o pavor que elas (as árvores) sentiam. Pensei que se aquele homem me representasse um perigo poderia ao menos correr, mas aquelas árvores não. Por mais pavor que sentiam seus pés estavam profundamente fincados à terra e seus braços erguiam-se imóveis em direção do céu. Nada poderiam fazer. Estavam indefesas. Uma forte emoção apoderou-se de mim numa dimensão que meus olhos quase não conseguiram conter. Porém, mais que nunca precisa concluir meu trabalho.
No entanto, ficava meditando entre um flash e outro: O que significaria aquilo? Como, sem nenhum vendaval ou brisa qualquer, ou coisa (conhecidamente) que implicasse, caíra aquela chuva de folhas? Sentiriam medo as árvores, assim como os humanos, ao ponto de demonstrarem de alguma forma, no caso, perdendo as folhas instantaneamente? Não, havia alguma coisa ali que deixavam as minhas hipóteses em silêncio. Fiquei perplexa. Nunca vira acontecimento igual. Senti algo profundo e triste.
Quando saia da mata por outro caminho, deparei-me com algo que também nunca havia visto: um forno de carvão (Imagem F.2.). Diante dele estava uma pilha de árvores. Estavam empilhadas de tal forma que me remeteram a uma fotografia que havia visto sobre os campos de concentração e extermínio, fábricas da morte construídas pelo Nazismo, em que corpos esqueléticos, como galhos secos estavam igualmente empilhados esperando serem incinerados. Fiquei estática. Tive novas idéias e realizei novas fotografias. Ao deixar aquele local, olhei para trás e o que percebi apertou-me de dor o coração. Aquele forno de carvão, a uma certa distância, adquiria um relevo como que de um túmulo clandestino e mal escondido (Ver imagem F.3.). Senti como que a perda de um ente querido. Cabisbaixa, fui para a estrada, após agradecer a hospitalidade do informante e de sua família. Já na condução, sentei-me de costas para o motorista e de frente para o fim da estrada. Olhando para trás, diante dos meus olhos, a estrada se fechava em uma mata densa que se estendia nas laterais do caminho. Pareciam dois braços que me suplicavam. As imagens que vi emudeciam-me. Saia dali como quem deixava num cemitério o túmulo de um ente querido.



3.O CONTATO COM A NATUREZA: PRINCIPIO DE UMA RELAÇÃO

Lendo a obra de Antoine Sainty-Éxupery “O Pequeno príncipe”, percebe-se que toda a obra possui uma áurea filosófica grandiosa. Algums trechos são bem especiais, como os seguintes:
“- (...) Que quer dizer ‘cativar’?
- É uma coisa muito esquecida, disse a raposa. Significa ‘criar laços’...”(pg.66)
Criar laços: algo essêncial para se construir uma relação seja com quem quer que seja. Fico pensando em nossa vida contemporânea. As crianças de hoje crescem confinadas em apartamentos, cercadas por coisas de uma beleza fria e triste. Quando possuem um quintal, é acimentado. Seus únicos laços geralmente são com tecnologias, principalmente os jogos eletrônicos. Suas vidas escapam-lhe pelos olhos vidrados, sem que percebam, enquanto sentados e imóveis parecem brincar. E amam essas coisas, guardam-nas com zelo e fazerm das mesmas até quase o centro de suas vidas, enquanto os pais trabalham como escravos longe dos mesmos. Eis os seus laços que não alcançam seus pais, visto que muitas vezes estes lhe parecem “velhos chatos” que nunca estão presentes. Aonde estão os quintais das casas de outros tempos, onde a natureza possuiam braços que nos embalavam, onde as flores sorriam e os pequenos animais aproximavam-se mais confiantes. Depois de muito brincarem, as crianças descançavam sob as sombras das árvores, saciadas de seus frutos. A natureza parecia nossa mãe: eis a dimensão de laços que se costruia. Amava-se porque se conhecia a fragilidade de um inseto “qualquer”, uma borboleta, um vaga-lume, uma joaninha. Lembro-me, que em minha infância amava a natureza de tal forma e a tal ponto que um dia, ao ver um galho de ávore cortado por um adulto da casa, para deixar um pouco mais de sol ao quintal, fiquei indignada. Deixei até mesmo de almoçar em protesto. Sentei-me ao lado do galho duas vezes maior que eu, e lá fiquei, o dia todo, sem falar com ninguém. Só entrei dentro de casa quando escureceu.... tinha medo do escuro.
O que quero dizer com isso é que só amamos aquilo conhecemos. Não posso amar algo, um ser ainda não descoberto, por que nem informações tenho a seu respeito. E como Saint-Éxupery disse em sua obra: “_ Agente só conhece bem as coisas que cativou (...). Os homens não têm mais tempo de conhecer coisa alguma.”(pg. 68); e mais à frente: “Foi o tempo que perdeste com tua rosa que fez tua rosa tão importante.”(pg. 72). E atualmente, que tempo temos destinado a estar perto da natureza, conhecê-la e amá-la. É comum não percebermos nenhuma reação de angústia diante de imagens de desmatamentos, queimadas, ou a morte de milhares de animais, presos em caixotes para serem exportados clandestinamente, em pessoas que cresceram longe de pelo menos, um quintal. Mas sei que também há os que vivem e viveram em lugares cercados pela flora e fauna e sem nenhum escrúpulo as destróem. Assim, não basta estar perto é preciso estar presente, como nos diz Buber(4) (1974, p.14.): “o instante atual dá-se somente quando existe presença, encontro, relação.” “Relação é reciprocidade”. Lévinas (1984, p.14) também nos fala sobre o mesmo assunto e explica que presença é a “exposição na franqueza absoluta do ser, significando também reunião e sincronia sem falha, nem fuga, nem sombra. Um aparecer e um dar-se.” Conceitos que a meu ver assemelham-se visto que “sincronia sem falha” expressa o mesmo sentido de reciprocidade. Assim, precisamos estar presentes para poder encontrar, sentir e perceber a linguagem da natureza. Tal atitude é sempre movida pelo amor. Como nos diz ainda Buber (1974, p.17):
O amor é uma força cósmica. Aquele que habita e comtempla no amor, os homens se desligam do seu emaranhado confuso próprio das coisas; bons e maus, sábios e tolos, belos e feios, uns após outros, tornam-se para ele atuais, tornam-se TU(5) , isto é seres desprendidos, livres, únicos, ele os encontra cada um face a face. A exclusividade ressurge sempre de um todo maravilhoso; e então ele pode agir, ajudar, curar, educar, elevar, salvar. Amor é responsabilidade de um EU para com um TU.”
Dessa forma percebe-se que o amor é princípio de todo o bem expresso na atitudes humanas. Ações não somente para com seus semelhantes (o TU), mas também para com toda a natureza (outro TU) que segunda a Bíblia Sagrada, Deus confiou à humanidade, visto que é composta de únicos seres dotados de consciência. Amor, consciencia e responsabilidade: estas são palavras que nortearam o capítulo a seguir.


4.0 RESPONSABILIDADE: O PRINCIPIO HUMANO COM A NATUREZA

“_ Os homens esqueceram dessa verdade, disse a raposa. Mas tu não deverás esquecer. Tu te tornarás eternamente responsável por aquilo que cativas. Tu és responsável pela rosa...” (pg.72)

Responsabilidade. Esta é a palavra chave para a construção, segundo Jonas (1979) de uma nova ética capaz de conscientizar a humanidade do seu papel diante da natureza. No entanto ter ou usar a consciência é coisa muito rara. E isso em todos os níveis sociais. Quantos de nós parece viver ao nivel da subconsciencia, comportar-se como meros fantoches de ideologias que lhes são passadas desde o nascimento, sem jamais despertar para a consciencia. A ideologia, segundo Ricouer, é operatória porque sucede anteriormente a nós; é também temática por não podermos pensá-la como um “lugar” mas como o ponto de partida ou seja, “é a partir dela que pensamos mais do que, podemos pensar sobre ela”. Somente a reflexão e o conheciemento são capazes de libertarnos dos labirintos escuros da ignorância e do comando secreto das ideologias sedmentadas em nosso subconsciente. E acredito até mesmo que a reflexão está acima do saber, pois muitos sabem o que deve ser feito, como lhes falei na primeira parte desse trabalho, mas não praticam. É comum observarmos em caminhada sobre o meio ambiente que debatem sobre a recilagem e cuidados com o lixo, alguns participantes, que deveriam agir como falavam, subtamente deixarem seus copos descartavéis, papeis de bombons e outros pelo mesmo caminho em que defendiam a preservação da natureza. Estes ainda parecen não terem despertados do inconsciente. Possuem o saber, mas não o refletem. Refletir significa, no sentido mais simples, “reproduzir a imagem de”, ou seja, se aprendo algo bom, se sei determinado conhecimento devo refletí-lo em minhas ações. Um espelho que não reflete não serve como espelho. Um ser humano que não reflete, não despertou para a consciencia de si, do mundo que o cerca, e de sua responsabilidade. Por conseguinte não se transformou num ser humano em toda a sua potencialidade. Como nos afirma Jonas (1979, p.41) “o saber tornar-se um dever prioritário, mas de tudo o que anteriormente lhe era exigido, e o saber deve ter a mesma magnitude da dimennsão causal do nosso agir”. E isso é responsabilidade que deve ser a guia da nova ética apresentada pelo referido autor, visto que “nenhuma ética anterior vira-se obrigada a considerar a condição global da vida humana e o futuro distante, inclusive a existencia da espécie”(p.41), isto é, uma nova mentalidade que se expressem em direitos e deveres. Dessa forma, o novo principio humano para com o nosso planeta chama-se: Responsabilidade.

5.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS

“Eu tenho ouvido as sinfonias das plantas”(6) dizia Eça de Queiroz em seu tempo, sentindo-se por isso “um visionário”, ou talvez “um sábio apedrejado”. Mas acrescenta “A espada da Teoria, o austero Pensamento, não mataram em mim o antigo sentimento, Embriagam-me o Sol e os cânticos do dia...”
E nos diz Martim Buber (1974, p.7)" Eu considero uma árvore. (...) Posso sentí-la como movimento: filamento fluente de vasos unidos a um núcleo palpitante, sucção de raízes, respiração das folhas, permuta incessante de terra e ar, e mesmo o próprio desenvolvomento obscuro.(...)Entretanto pode acontecer que simultaneamente, por vontade e por graça, ao observar a árvore, ou seja, levado a entrar em relação com ela, ela já não é mais um ISSO. A força de sua exclusividade se apoderou-se de mim."
Lindas palavras de Buber, palavras que descobertas no segundo semestre do ano passado me deslumbraram e me deram coragem de falar minhas experiências com a natureza. Coragem de não temer ser considerada louca, visto que alguém antes de mim sentira o mesmo.
No entanto, não acredito em que se seja sábio ou visionário por ouvir a sinfonia das plantas, nem que seja por “graça”, como nos diz Buber, que esse acontecimento ocorra. Graça pressupõe merecimento e isso é dificil. Talvez alguém apedrejado sim, visto que as palavras de alguns e até mesmo seus olhares muitas vezes nos apedrejam por falarmos coisas que parecem fugir da normalidade, do usual-lógico. Prefiro acreditar que tal fato acontece por uma disponibilidade de cada um. Se abrimos os braços é mais provável ocontecer que o “TU” presente (ser humano ou outro) entre em reciprocidade conosco. Um Encontro dentro das idéias de Buber. Estar disponível é estar atento, numa presença que ouve, vê e sente o apelo silenciso que a natureza faz pela preservação de sua integridade” que ‘parece escapar da plenitude ameaçada do mundo vital"(7). Acredito que todos os seres vivos possuem uma linguagem, uma forma de se expressarem que lhes são próprias. Pesquisando sobre isso, descobri que um cientista conseguiu perceber, por acaso, que as plantas possuem sensibilidade tão apurada que podem inclusive capitar os sentimentos que emanam das pessoas. Tal fenômeno ficou conhecido como Percepção primária ou Efeito Backster, sobrenome de Cleve Backster, cientista descobridor. Tal fato foi comprovado por outros cientistas. Não me aprofundarei sobre esse assunto nesse momento. Talvez em outro artigo. O fato é que sendo comprovado ou não, olhando para a natureza não é preciso tentar ouví-la, mas apenas visualizá-la e perceber que os danos que causamos a mesma são monstruosos e que devemos reparar isso de forma urgente e séria. A canção da terra (seja em sinfonia alegre ou triste) “devemos ouví-l(a), reconhecer sua exigência como obrigatória (...) ou ver nel(a), pura e simplesmente, um sentimento nosso”, fazermos a nossa parte para preservá-la. Assim encerro aqui minhas reflexões (em outro momento em outro texto as retomarei). Deixo o prezado leitor, com o seguinte pensamento expresso por um lider pele-vermelha, Chefe Indio de Seathes, nação Sioux (1855):
“ O que vier a acontecer com a Terra recairá sobre os filhos da Terra. Não foi o homem quem fez o tecido da vida. Ele é simplesmente um de seus fios. O que quer que faça do tecido estará fazendo a si mesmo.”



6.0 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BUBER, Martin. Eu e Tu.Introdução e tradução, Newton Aquiles Von Zuben. 2ª ed. Editora Moraes, 1974.

JONAS, Hans. O princípio responsabilidade: ensaio de uma ética para a civilização tecnológica. Trad. Luiz Barros MONTEZ. Rio de Janeiro. Contraponto. Ed. PUC- Rio, 2006.

LÉVINAS, Emmanuel. Entre nós: ensaios sobre a alteridade. Trad. Pergentino Stefano Pivatto. Petrópolis, Rio de Janeiro. Vozes, 1997.

LÉVINAS, Emmanuel. Transcedência e inteligibilidade.Tradução de José Freire Colaço. Rio de Janeiro. Edições 70, 1984.

SAINT-EXUPÉRY, Antoine de. O pequeno príncipe: com aquarelas do autor. Trad. Dom Marcos Barbosa. 46. ed. Rio de janeiro. Agir, 1998.


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Notas:
1. Artigo apresentado ao Programa de Pós-graduação em Ciências Sociais.
2. Marta de Lourdes Cosmo Macedo. Professora de Língua Portuguesa (SEDUC) e Acadêmica em Artes Visuais.
3. Música de Michael Jackson publicada em 1995.
4. Filósofo, escritor e pedagogo, judeu de origem austríaca, apresentado a mim pela Profª. Dra. Kátia Mendonça, através da Disciplina de Pós-graduação em Ciências Sociais (Mestrado), “Tópicos avançados sobre Hermenêutica”, em agosto de 2008.
5. Segundo a idéia do referido autor o TU expressa algo ou alguém que não se percebe como um objeto, mas como um ser único, assim ao se proferir “o TU, coisa alguma existe” o único foco do instante é o TU presenciado, percebido.
6. O trecho citado pertence ao poema “O visionário, ou som e cor” do referido autor.
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Imagem de minha autoria: Projeto: EU-TU