A Disseminação do Crack

O Crack é uma droga por demais perigosa. Provoca acelerada degradação física e mental e causa rápida dependência. Com seu uso regular, desencadeia a Paranóia, a sensação de estar em constante ameaça. A reação a esse quadro é extremamente violenta. O Crack brutaliza a intimidade do seu consumidor, põe em risco quem se vicia e, frequentemente, as pessoas que estão à sua volta. Por conta desses resultados, as famílias que enfrentam esse drama sofrem agudamente com a precariedade da rede pública de atendimento, onde é difícil conseguir vaga para internação e são raríssimas as unidades ambulatoriais preparadas para lidar com viciados nessa droga.

O desafio é mundial. Na Inglaterra, que tem programas bem sucedidos no atendimento a dependentes de heroína e outras drogas pesadas, os resultados das políticas públicas voltadas para o crack são modestos. No Brasil, o atendimento à saúde mental, que já apresentava problemas, ficou ainda mais caótico com a enxurrada de vítimas de crack. A epidemia se alastrou num momento de mudança na política de saúde mental no país. Desde 2001, com a aprovação da lei nº 10216, a internação deixou de ser encarada como pilar do tratamento de distúrbios psiquiátricos. A idéia é apenas internar pacientes com quadro agudo, que precisam de cuidados especiais e atenção constante por determinado período. E, superada essa fase crítica, transferí-los para uma rede ambulatorial externa. Faz todo sentido. No entanto, em decorrência dessa nova política, fecharam-se 16.000 leitos psiquiátricos no Brasil, mais de 30% do total. E o sistema ambulatorial ainda não engrenou. O número de unidades destinadas a dependentes de alcóol e drogas é ínfimo, apenas 200, de um total de quase 1400. Com precárias e escassas possibilidades de internação ou tratamento ambulatorial, os pacientes ficaram entregues à própria sorte. " A simples eliminação de leitos de internação deixou um rombo na rede de atendimento", diz o psiquiatra Mauro Aranha, da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.

O Efeito desse colapso é que os dependentes químicos acabam empurrados para centros de reabilitação que, em muitos casos, não têm nem autorização para funcionar. O alto preço da internação leva famílias a se desfazer de seus bens para custear o tratamento. Em geral, os planos de saúde, cobrem apenas quinze dias de internação, salvo apenas alguns poucos, disponíveis apenas às classes prioritárias, visto os seus altos custos de aquisição. Subproduto da cocaína em forma de pedra, que estala quando queimada, daí o nome de Crack, chegou ao Brasil na Década de 90. Durante um bom tempo, ficou restrito a indigentes que perambulavam pelo centro da grande São Paulo. Hoje, a situação é bem diferente. As pedras se espalharam pelo território e por todas as classes sociais.

Ainda não há estatísticas. O Ministério da Saúde está concluindo o primeiro estudo voltado especificamente para o Crack. Mas o aumento de dependentes em consultórios psiquiátricos e em clínicas de reabilitação espalhados por todo o país, mostra que a epidemia se alastra assustadoramente. No Núcleo de Estudos e Pesquisas em Atenção ao Uso de Drogas (NEPAD), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, até dois anos atrás não havia usuários de Crack. Hoje, eles representam quase 30% da demanda. Para enfrentar a epidemia, o Ministério da Saúde anunciou investimentos de 117 milhões até o ano que vem em melhorias na rede de saúde mental, espera-se que a ajuda chegue a tempo, ou mesmo, que seja devidamente utilizada para esse fim.