INTERVENÇÃO IMPERIALISTA*

Com o pretexto de defender a “sua democracia”, voltam (e s t a m o s em 1 9 9 4) os EUA a exercitar a contumaz e velha prática intervencionista, desta feita no Hait

De popularidade quase zerada, o presidente Bill Clinton aproveita-se da oportunidade que lhe sorri para tentar reaver a ‘performance’ perdida. E investe felinamente contra o pobre, mas altivo povo haitiano, acusando de ditadores os dirigentes ilhéus.

Não estou aqui a dar penadas por ditadores, a quem nunca se deve estimar, ainda mais se eles são tiranos militares. No Brasil, também já sofremos o tacão de condoídas experiências. Assim, com o ferrão na pele, tenho sobradas razões para não fazer a apologia dos déspotas, nem lhes colocar panos quentes.

Mas não acredito um milímetro na sinceridade política ou de paz da nação mais poderosa do mundo, useira e contumaz invasora de territórios alheios. Todos têm vivo na memória o passado belicoso e de rapina dos EUA, nas tristes e sucessivas invasões ao México, à Cuba libertária de José Martí, Coreia, Vietnã, Laos, Camboja, Panamá, Granada, ao próprio Haiti e tantas outras possessões estrangeiras.

Quem não se lembra da selvageria recente (1991) no Iraque? Para não ficarmos apenas por aí, como esquecer as intervenções – ainda hoje em curso – no Paquistão e no Afeganistão? E o dedo ianque, que usa Israel como seu representante agressor, na aniquilada Palestina? E as ameaças imperialistas contra a soberania do povo iraniano?

Não toco nos inúmeros golpes de estado que, direta ou indiretamente, os norte-americanos ajudaram a fomentar, com armas, homens ou dinheiro, sob o signo da fobia ao socialismo. Aqui, merecem nota os exemplos do Brasil, em 1964, e da Nicarágua; inclusive, também, o sangrento e vergonhoso capítulo do Chile, em 1973, tudo capitaneado pela mão ardilosa e invisível da CIA e do Pentágono.

Há fome e miséria no Haiti? O sofrimento dos milhões e milhões de desvalidos do nosso planeta representa também o contributo da fome imperialista dos EUA, num holocausto sem trégua e sem quartel contra os miseráveis e explorados povos do Terceiro Mundo. Força é que se declinem – sempre com atualidade – os antipáticos e clássicos chavões d’antanho.

Não e não às invasões armadas e pela força. Pela não-intervenção às nações aviltadas pela gula expansionista do imperialismo ianque, aliado a seus lacaios do G-7, FMI & artimanhas afins. Contra as unhas de abutre no Haiti, agora muito afiadas com a cumplicidade da ONU.

Parabéns, Brasil, por não teres embarcado na canoa furada de Bill Clinton, este indigente de popularidade, que a quer conquistar regada a sangue. Cumpriu-se, aqui, pelo menos, este princípio basilar da não-intervenção, legado de maioridade política conforme o Art. 4º, inciso IV, da nossa Constituição.

Fort., 05/02/2010.

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(*) Os fatos que decorreram da intervenção de Bill Clinton, no Haiti, em 1994, iriam culminar com outro golpe mais desavergonhado: a derrubada do presidente Jean-Bertrand Aristide, em 2004, o qual, além de deposto, foi sequestrado e expatriado por tropas norte-americanas, a mando do calhorda George W. Bush. Esses dois fatos citados são o verdadeiro marco das devastações política, social e econômica do Haiti, e não o recém-terremoto, que o devastou fisicamente. O artigo em questão não é novo, contudo atual, por isso que o estou a reprisar, aqui. Originalmente foi publicado no jornal TRIBUNA DO CEARÁ, Fortaleza, 06/set/1994, p. 4.

Gomes da Silveira
Enviado por Gomes da Silveira em 05/02/2010
Reeditado em 05/02/2010
Código do texto: T2070817
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