ECA!!! *

ESTE ARTIGO É UM ENSAIO SOBRE AS MUDANÇAS PROPOSTAS NO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (ECA) QUE ESTÁ COMPLETANDO 20 ANOS DE VIGÊNCIA COM INCLUSÃO DE PENAS PARA PAIS QUE DEREM PALMADAS NOS FILHOS.

Pouco a pouco o estado vai assumindo aquela condição do fantasma do monstro abominável de um passado não muito distante. Representaria o comunismo no seu estágio mais extremista. Ele seria as mãos e os pés dos homens e mulheres para que estes pudessem se dedicar a seu serviço. Um monstro do tamanho de um bairro, de uma cidade, de um estado, de um país.

A ameaça campeava solta pelo imaginário popular disseminada pelo seu inimigo mais temido: o outro lado do maniqueísmo que representava o capitalismo, onde o estado era apenas um agente regulador de pequenas normas de conduta gerais e o resto era a liberdade plena, absoluta. Tanto a liberdade de ir e vir como a de estabelecer meios de se ganhar a vida como cada um achasse melhor. Tanto que os mais radicais desse lado, na sua anti-propaganda diziam que comunistas comiam cabeças de crianças. Não era mais o “vou chamar tutu pra você.” Era vou chamar um comunista pra você, se não se comportar.

O comunismo sequer chegou a ser implantado tal como foi preconizado pelos seus teóricos. Foi uma aventura onde a sede de poder do homem tomou o lugar dos princípios de igualdade ampla geral e irrestrita. Os modelos que o mundo experimentou foram um mal sucedido engessamento das liberdades individuais e uma igualdade onde quem mandava era mais igual do que quem obedecia. Foi tentando se manter a ferro e fogo e não podia dar em outra coisa: a resistência interna nos respectivos países e uma pressão externa que o tornou insustentável. Chegaram a construir muros para tentar isolar-se das tentações do mundo maravilha do capitalismo também desigual, mas onde o homem era livre. Livre pelo menos para poder escolher a qual dono ia se submeter. Lá atrás dos muros era um só dono, o estado totalitário.

Nas suas teorias, Marx** chegou a dizer que a idéia era uma sociedade onde o homem pudesse caçar de manhã, pescar à tarde e fazer crítica literária após o jantar, numa metáfora da suma e perfeita liberdade, das possibilidades de escolhas e da associação do trabalho com o prazer naquilo que não ultrapassasse as necessidades de sobrevivência. Não haveria riqueza extrema nem pobreza absoluta em termos materiais. O prazer viria como consequência, ao final de cada jornada, quando o tempo seria dedicado ao ócio que alimentasse o espírito. Bonito, né? E eu ainda acrescento aqui o que ele esqueceu de dizer: poderia namorar também nas horas livres, afinal, ninguém é de ferro!

Nessa queda de braços, estruturas vão se rompendo na marra. Na contra-propaganda, pelo terror psicológico e em último caso, através da violência. Isso altera significativamente o ritmo da vida de todos e a vida doméstica, principalmente. As relações se pautam no que acontece de fora para dentro e não o contrário. E tudo o que resulta de ruptura drástica, deixa perdido um rastro que seria o guia para o novo e deixa um caminho desconhecido à frente. Acho que os valores tradicionais que tanto foram questionados foram rompidos a pretexto de se criar um novo padrão comportamental e não houve um necessário e saudável debate com a comunidade envolvida. O rompimento é executado por rebeldes e a ordenação pelos “iluminados” ou gente de boa intenção que tenta a todo custo colocar as coisas nos eixos e se vê impotente. Não incapaz, mas impotente por que no meio do caminho há pragmatismos e interesses os mais variados. Os pais ficaram literalmente perdidos diante de tantos direitos sem a contrapartida da autoridade que lhes foi de certa forma subtraída pelo clamor geral de liberdades. Hoje até para um cachorro temos que fazer deferência em público sob pena de sermos execrados como maus. Corrigir um filho rispidamente na rua, é risco de linchamento. Nesse vazio psico-pedagógico, surge a figura do especialista. Hoje há especialista até em unha encravada. Gente que se arvora em aconselhar educação de filhos sem nunca ter tido um elabora manuais que são seguidos até mesmo por causa da falta de tempo dos pais de se dedicarem aos filhos. É, creio, uma forma também de expiação de culpas (seguindo-se o que manda o manual e em concordância com o senso comum, está se fazendo o certo). Acho que é nesse vácuo que nascem as leis feito o ECA. De um lado, há abusos, de outro, há incapacidades pedagógicas. O estado num esforço de equilibrar as tensões age. É certo? É errado? Acho que são iniciativas. Ainda vamos passar por uma longa transição (que a meu ver vai deixar seqüelas em toda uma geração), mas é o preço que pagamos por acreditarmos mais nas coisas do que pensarmos nelas.

O tapa passou a gozar de um status da maior violência que se pode cometer contra uma criança. Acho que há violências piores, sem que se encoste um dedo numa criança. Abandono, fome, chantagem, castigos no escuro, palavras de rejeição, enfim, é realmente polêmico e não quer dizer com isso que eu defenda uns tapas. Também sou contra toda espécie de violência. O que eu acho estranho é o legislador não se preocupar com o tecido social inteiro. Vai fazendo remendos que podem não resultar em uma bela colcha de retalhos. É temerário deixar que o estado tome conta de assumir de forma tão acintosa a educação dos filhos. Pode resultar em frangalhos. Esta é uma opinião ainda em ebulição.

* O título com exclamação é um trocadilho infame.

** Karl Marx, A Ideologia Alemã, ed. 1976, pg. 46.

josé cláudio Cacá
Enviado por josé cláudio Cacá em 30/07/2010
Reeditado em 30/07/2010
Código do texto: T2407726
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