Presunção da interpretação a posteriori



Presunção da interpretação a posteriori
 
Esta ideia acompanha a maioria de nós. Ela parece tão real, tão simples, e por isto nos parece tão verdadeira. Olhamos para trás, para o nosso passado, e temos a quase certeza de que o passado atuou, conspirando silenciosamente para que cada ato tenha ocorrido com o único propósito de possibilitar o nosso presente. Destino, direção, plano maior, muitos e diferentes nomes são de alguma forma atrelados a esta ideia.
 
Esta presunção humana é muito comum e atua tanto no nível histórico quanto a nível biológico (dando aparente direção e sentido a evolução).
 
Muitos de nós observamos a evolução como uma simples fila de ancestrais, desde os simiescos com seu andar desajeitado, vivendo um após o outro, em uma crescente esteira de outros animais, até que no seu final, figura de forma majestosa um, com sua forma de andar ereta, corpo vigoroso, mente inteligente: O Homo Sapiens Sapiens. (alguns sequer acreditam na evolução, e preferem crer no criacionismo.)
 
O homem, nesta visão, é tido como a última palavra, o estado da arte em evolução. Nossa forma pedante de nos observarmos, faz-nos crer que somos o alvo de todo empreendedorismo evolutivo. Na mesma linha, alguns físicos aplicam a mesma lógica mental e acreditam que nosso universo teve suas variáveis e constantes universais sabiamente calculadas, ajustadas com precisão, para que nosso mundo permitisse que um dia existíssemos.
 
“Obviamente, nós, que aqui nos encontramos refletindo sobre tais questões, temos de estar em um universo, por mais raro que seja, cujas leis e constantes são capazes de PERMITIR nossa evolução.” Dizia Richard Dawkins.
 
Permitir nossa evolução, destaco eu, é diferente de que as constantes universais, e as leis naturais foram ajustadas para nos criar. Somos filhos de uma aleatoriedade absurda.
 
Infelizmente bons homens sucumbem a tentação arrogante de interpretar nossa existência pelo viés a posteriori.
 
Pelo menos neste assunto, a versão dos biólogos permite mais facilmente aplacar nossa presunção, pelo menos depois de Darwin e principalmente depois da genética.
 
“A evolução biológica não tem uma linha de descendência privilegiada, muito menos um fim projetado. A evolução alcançou muitos milhões de fins provisórios (o número de espécies sobreviventes no momento de qualquer observação), e não há nenhuma razão, além da vaidade - vaidade humana, diga-se de passagem, já que somos nós que estamos falando – para designar qualquer um mais privilegiado ou mais culminante que o outro.” Richard Dawkins.
 
Assim, deveríamos ser mais humildes e amar nossa existência, rara, linda, complexa e humanamente imanente. Desta forma precisamos nos precaver contra construir qualquer narrativa cuja impressão, por mínima que seja, tenha como alvo o clímax humano.
 
Somos importantes? Sim. Entretanto somos apenas mais uma espécie natural, e no geral temos muito o que melhorar, e não falo somente biologicamente, falo social e pessoalmente também. 

Arlindo Tavares
Enviado por Arlindo Tavares em 22/11/2010
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