Indignar-se, para quê?

Mais uma vez diante de uma barbárie o Brasil se indigna, a televisão, a internet, os jornais mostram constantemente notícias sobre o assassinato trágico de uma família em Bragança Paulista. Pai, mãe e filho de cinco anos cruelmente queimados vivos após um assalto.

População chocada, juristas discutem sobre o nosso moderno Código Penal Brasileiro, que senão me engano, data de 07 de dezembro de 1940. Mas não podemos querer cobrar dos nossos pobres deputados, afinal, a maioria quando não está ganhando uma comissão em alguma negociata, está se defendendo das acusações injustas de mensalão, de máfia da ambulância, como eles vão ter tempo para realizarem uma reforma no Código Penal, afinal eles têm apenas quatro dias por semana e nove meses por ano para trabalhar.

Uma semana, um mês de indignação e daí? Depois da comoção nacional tudo volta ao que era antes.

Quantas vezes não nos indignamos com latrocínios, estupros, seqüestros e tantos outros crimes hediondos. Podemos citar apenas alguns: O assassinato do casal Felipe Café e Liana Friedenbach, em

Embu-Guaçu, em São Paulo, em que a menina passou três dias subjugada à tortura, estuprada e seviciada várias vezes; um menino de três anos que foi violentado sexualmente pelo padrasto, com anuência da mãe, e tinha marcas de queimaduras pelo corpo; um ônibus queimado com pessoas dentro; uma estudante assassinada e enterrada sob a escada dentro da própria casa; assassinato do jornalista Tim Lopes. Cada um de nós, com certeza, tem um caso para relacionar nessa terrível lista.

Mas a nossa indignação é inversamente proporcional às atitudes tomadas por aqueles que tem o poder. Enquanto nos indignamos as leis vão ficando mais branda.

Menores matam, estupram, assaltam e cumprem penas brandas e com 18 anos são colocados em liberdade. Na contra-mão da nossa indignação os juizes do nosso Supremo Tribunal Federal, aquele mesmo que teve sua presidente assaltada na segura cidade do Rio de Janeiro, imaginando que estamos na Suíça, no Canadá, aprovam a progressão de pena para crimes hediondos, isto é, esses assassinos dessa família, podem ser condenados a noventa anos de cadeia, mas como a pena máxima no Brasil é de 30 anos, com a progressão de pena, esses animais, aliás animais não, animais não são traiçoeiros, podem cumprir apenas um sexto da pena, então três vidas cruelmente tiradas valem cinco anos de prisão neste mar de tranqüilidade chamado Brasil.

Alguém uma vez já disse que jamais devemos deixar de nos indignar, mas se indignar no Brasil não adianta muito. Nos indignamos com corrupção e elegemos Paulo Maluf, nos indignamos com milhões de reais desviados dos cofres públicos, mas só quem vai para cadeia é uma desempregada que rouba um pote de manteiga, nos indignamos com as situações das nossas estradas e a cada feriado dezenas de vidas são tiradas nas nossas conservadíssimas rodovias, nos indignamos com a violência e a cada dia mais bandidos são sendo soltos.

Mas para que pensar nisto agora, afinal não com a gente e a cidade onde moramos não é tão violenta quanto a insegura Bragança Paulista, não temos seqüestros relâmpagos, roubos, furtos, assassinatos, estamos muito bem protegidos e, além disso, está chegando Natal, reveillon, carnaval, Páscoa, na próxima barbárie, que com certeza não acontecerá nem na nossa cidade, nem com conhecidos nossos, a gente dá aquela “indignadazinha” de novo.

Parodiando aquela música que fazia menção ao Romário que não gostava de treinar, neste nosso lindo país tropical, “indignar-se para quê”?