Conhece-te a ti mesmo

Os personagens da série “Star Trek - Jornada nas estrelas ” encontram-se em missão para explorar formas de vida e novas civilizações, e estão num futuro bem à frente da época em que vivemos. Há pouco tempo passou um episódio que retratava o homem no século 24. Os tripulantes da nave Enterprise encontraram homens que acabaram de acordar da criogenia, ou seja, permaneceram com os corpos congelados após a morte na intenção de um dia reviver.

Mais que um tema de ficção, a criogenia é uma prática que já tem adeptos pelo mundo. Os conhecimentos da ciência ainda não garantem trazer de volta à vida um cadáver congelado, mas os adeptos certamente esperam que no futuro alguém o faça.

O fato é que os humanos da série acordaram e, vendo toda a mudança dos séculos que passaram e o modo como viviam atualmente, temiam voltar à Terra. Os terráqueos daquela época viviam bem, social e politicamente, e não buscavam riquezas.

Conversando sobre dinheiro e coisas materiais a que damos importância agora, um deles perguntou ao capitão “qual é o desafio?” O capitão respondeu que o desafio era “melhorar a si mesmo, enriquecer a si mesmo”.

Programas atuais mostram como a ficção científica antecipa o futuro muitas vezes quando usa a imaginação para criar o que ainda não existe. O progresso científico visa primeiramente a um futuro melhor e as ficções futuristas pretendem falar das sociedades pós-modernas e seus avanços científicos e tecnológicos que permitam essa melhora. Na literatura, nos quadrinhos, nos videogames, no cinema, falamos sobre clonagem, andróides e robôs. Mas no futuro não seremos máquinas, ainda seremos (será?) humanos.

A fascinação pelo futuro é flagrante nos altos índices de bilheteria do gênero ficção científica. Nossas previsões são suposições, são sabemos o que acontecerá, mas elas dizem muito sobre nossos medos. O futuro da ficção científica é contemporâneo enquanto crítica do presente, como exemplo, nos filmes que mostram os receios sobre as funções das novas tecnologias e seu impacto nos homens que a utilizarão.

Frankenstein questionou seu feitor, ainda não tivemos máquinas que nos questionassem, e espero que filmes como Matrix, em que as máquinas revolucionam e dominam o mundo, não sejam as inquietações que mais nos amedrontam. Todas as previsões sobre o fim do mundo falharam até agora. E se alguém acertar, não saberemos. Mas nem os escritores de ficção, nem os videntes sabem de todos os destinos, porque quanto mais vivemos, mais descobrimos que o futuro é construído através de nossas ações.

Do Oráculo de Delfos, a frase “Conhece-te a ti mesmo ” influenciou o filósofo Sócrates e continua nos influenciando. Jung disse no prefácio do livro “Psicologia do Inconsciente” que “o autoconhecimento de cada indivíduo, a volta do ser humano às suas origens, ao seu próprio ser e à sua verdade individual e social é o começo da cura da cegueira que domina o mundo de hoje”.

Várias religiões há tempos apontam a busca de si mesmo como princípio de sabedoria e encontro com a divindade. Por isso manuais de auto-ajuda sempre fazem sucesso. O poeta Carlos Drummond de Andrade falou no poema “O homem; as viagens” que, depois que o homem colonizar vários planetas, restará a “dificílima dangerosíssima viagem/ de si a si mesmo:/ Pôr o pé no chão/ do seu coração... ”

Se no século 24 já tivermos superado a ganância, a pobreza, a desigualdade social e a guerra, só faltará o autoconhecimento, que, se estivesse em primeiro lugar, excluiria todas as outras coisas que deixamos por último.

A todos os leitores da Orkultural, um bom futuro e uma boa busca, é o que desejo em 2007 e em todos os anos futuros que ainda tivermos pela frente. Sugiro também a leitura dos textos “Carpe diem ”, na Orkultural de dezembro de 2005 e “Para onde você olha?”, Orkultural de janeiro de 2006.

Texto publicado na Coluna Orkultural da segunda quinzena de dezembro de 2006, em Blocos online.

Link do texto "Carpe diem":

www.blocosonline.com.br/literatura/prosa/colunistas/cherrmann/ch0008.htm

Link do texto “Para onde você olha?”:

www.blocosonline.com.br/literatura/prosa/colunistas/cherrmann/ch0010.htm

Solange Firmino
Enviado por Solange Firmino em 28/12/2006
Código do texto: T329624