Mendigos são humanos?

Não! E mudo minha opinião apenas se alguém, com um grande poder de persuasão vier me contrariar, ou se realmente as pessoas começarem a olhar para si. Primeiro que morar na rua, implorar por dez centavos e ser frequentemente retratado como um perigo à sociedade, não é nada compassivo de alguém incluído nesse mundo tão ‘correto’.

E para confirmar a minha tese, fatos são concretos, porém nem sempre divulgados, como seriam se um desses moradores de rua espancasse algum político, por exemplo.

Por aqui, interior paulista, as coisas andam como no restante do país, mas a veracidade dos fatos e a compaixão de pessoas civilizadas são meramente maiores do que a dos brutos da capital.

Recentemente, um dos moradores de rua de Assis foi vítima de chacotas e ofensas morais, por alguns garotos mimados. Os moleques, com skates na mão e bonés para trás, diziam absurdos e gozavam da cara suja do homem.

O mesmo mendigo foi motivo de revolta entre moradores que até fizeram uma campanha para expulsá-lo da cidade. A alegação dos habitantes burgueses era de que o rapaz é muito agressivo e representava perigo à população. Pois é, quiseram expulsá-lo das ruas.

Mas o homem simpático e com um sorriso no rosto não é discórdia entre a maioria. Grande parcela de habitantes de Assis não o considera um perigo e sim um morador de rua simpático e, surpreendentemente, de bem com a vida.

Mendigos não são humanos, não podem ser.

No dia 27 de fevereiro, na capital nacional, um mendigo morreu após ter mais de 60% do corpo queimado, e outro permanece em estado grave no hospital. Os dois dormiam na rua, na cidade-satélite de Santa Maria, na periferia de Brasília. Sete pessoas foram ao local e queimaram primeiramente o sofá que os dois usavam para dormir. Depois, duas ou três pessoas voltaram e atearam fogo nos dois homens, usando provavelmente gasolina.

Os rapazes, um de 26 e outro de 42 anos, foram tratados como algo que não sei descrever, tratados como tantos mendigos espalhados por aí, e que se camuflam em meio dessa sociedade hipócrita e cruel.

Não me venha com essa de ONGS, bolsa família, bolsa carência, assistência social, etc. O que essas pessoas precisam é de civilização, desenvolvimento, progresso, cultura. Aquele mendigo de Assis, cuspiu no rosto da assistente social quando ela foi oferecer ajuda, mas não pense que ele foi mal educado ou que se deixasse ele a mataria. Ele cuspiu na hipocrisia, na divergência, ele se revoltou com um sapato de salto alto e um sorriso amarelo oferecendo comida e abrigo, por mera obrigação, como acontece sempre no nosso país.

Mendigos são humanos? Não!

Eles passam frio, calor, fome. Comem terra, lixo e restos. Bebem água da chuva, ou sua urina. Não tomam banho, nem conhecem uma escova de dente. Humilham-se, suplicando por alguma moeda, são tratados como selvagens soltos no meio da civilização. E ainda assim, nos dão bom dia, boa noite, boa tarde, e sorriem com um aperto de mão.

Acho que os mendigos somos nós, e eles é que são os humanos.

Kallil Dib - Jornalista

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Kallil Dib
Enviado por Kallil Dib em 14/02/2014
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