SANTO DE PAU OCO

Francisco de Paula Melo Aguiar

[...] Antes tratava a todos com muito acolhimento. E por esta causa entravam e saiam sem reserva, sendo sua casa para todos franca [...].

Padre Francisco de Aguiar Coutinho

(Vila Rica/MG,26/05/1789)

Nossa gente desde o tempo colonial tem saída para tudo, principalmente para evadir nossas divisas econômicas e financeiras. É a ganância contra o povo sofrido e honesto brasileiro. Arranjam diversas saídas para se praticar direta e indiretamente crimes. É comum ouvirmos nos noticiários policiais de que “Fulana de tal” e ou “Fulano de tal”, tentou entrar no presídio “A” e ou “B”, escondendo drogas, celulares, armas de fogo, etc., as mais diversas possíveis nos órgãos genitais, anais, em bolos de aniversários, etc., etc. São tantas as criações surrealistas das famosas mulas a serviço do crime que nos faz rir, verdadeiro desafio ao popular “raio x”, amplamente usados nos aeroportos, nas cadeiras, presídios, reformatórios, etc., para evitar o ingresso de tais objetos facilitadores para as mais diversas práticas autorizadas pelo crime organizado, que desafiam os poderes constituídos do Estado Nacional. E isso não é coisa nova não, vejamos, por exemplo, o caso do santo do pau oco que nasceu e ou teve origem diante da compra e venda de ouro brasileiro, segundo Houaiss (2001) e Coelho (2005, p. 123-132), pois, as imagens sacras eram feitas de madeira oca para que no seu interior fosse escondido o ouro para ser enviado do Brasil para Portugal sem pagar os impostos devidos a Coroa Portuguesa. Isso é crime privado e público ao mesmo tempo, o famoso lesa pátria, desvio de renda pública e ou privada, o que não deixa de ser corrupção, por analogia e em sentido ampliado para as denuncias e processos diversos atualmente concluídos e a ser concluídos em nosso País. O ouro foi encontrado pela primeira vez no pé do pico Itacolomi, em Ouro Preto, Minas Gerais, pelo colonizador Antônio Dias Oliveira, ainda no século XVII. Tal fato é registrado na gravura de rugendas: lavagem de ouro, segundo Bueno (2003, p. 107). Assim sendo, nasceu o ouro brasileiro, registrado em versos e prosas, ainda que por analogia. A corrida a procura de ouro no território mineiro foi grande enquanto durou, despertou a ideologia poética e história na visão dos inconfidentes mineiros, tendo como expressão maior na literatura Claudio Manoel da Costa e do desembargador Tomás Antônio Gonzaga e na história Tiradentes, um dentre os poucos de origem popular em tal rebelião, o padre Carlos Correia de Toledo e o coronel Joaquim Silvério dos Reis, o delator do movimento que pretendia proclamar a independência e a república em Minas Gerais. Assim a historia e a literatura brasileira, volume 2, registra a inquisição e ou autos de devassa da Inconfidência Mineira (1978) e ou também conhecida como devassa de Minas, tendo a participação direta como testemunha ocular no processo da devassa e ou Inconfidência o ilustre paraibano o Padre Francisco de Aguiar Coutinho, na “ASSENTADA, Casa do Ouvidor, 26 -05-1789”, conforme sua qualificação pessoal “[...] XXVI 1.5 – O PADRE FRANCISCO DE AGUIAR COUTINHO, natural da Paraíba do Norte, freguesia de N. Sra. Das Neves, bispado de Pernambuco; residente nesta Vila Rica, onde vive de uso de suas ordens, de idade que disse ser de cinqüenta e dois anos, testemunha a quem o dito ministro deferiu o juramento dos Santos Evangelhos num livro deles em que pôs a sua mão direita, sob cargo do qual lhe encarregou que jurasse a verdade do que soubesse e lhe fosse perguntado o que assim prometeu cumprir como lhe era encarregado”, bem assim respondeu sumariamente as perguntas que lhes foram formuladas, dentre as quais que “[...] e do mesmo modo se persuade que o dito ministro não tinha amizade ou correlação alguma com o Alferes do Regimento Pago desta Capitania, Joaquim José da Silva, por alcunha de Tiradentes, o qual nunca viu, nem tem noticia que procurasse alguma vez o dito desembargador – o que ele, Testemunha, deveria saber e ainda mesmo presenciar, por ir todos os dias à casa do referido ministro – onde estava quase sempre, não só por ser o sacerdote que lhe dizia missa, mas também por lhe haver amizade”, isso é fato e contra fato não tem argumento.

Quando Portugal começou a cobrar o quinto do ouro, o imposto e ou tributo, ou seja, vinte por cento de todo e qualquer ouro e ou metal precioso, a titulo de represália os mineradores ficaram revoltados e ou indignados, criaram o artifício da fabricação de santo do pau oco para ser preenchido internamente com tais metais, verdadeiro jogo de mestre para driblar o erário português e não pagar tal imposto nas transações de compra e venda de ouro e seus derivados. O ouro para ser purificado tem que ser queimado, embora que não queimasse também as pessoas dissimuladas de origem mítica e ou religiosa derivada dos aspectos primitivos da fé cristã e histórica do povo brasileiro nascente. Isso era contrabando de ouro, diamantes, etc., algo muito mais valiosos do que comprar cigarros no Paraguay, por exemplo, e adentrar no território brasileiro sem pagar impostos. Assim sendo, as imagens construídas de pau oco dos santos da devoção popular era a armadilha apropriada para esconder tais metais valiosíssimos. Antes da artimanha ser descoberta o fisco português era enganado, porque jamais os fiscais e ou cobradores de impostos iriam imaginar de que uma imagem de Nossa Senhora do Rosário, do século XVIII, semelhante a que se encontra no Museu da Inconfidência Mineira, originária de Paracatu – Minas Gerais, fosse usada como instrumento de praticar sonegação fiscal, portanto, pratica de crime contra o poder público. Dentre os outros santos e santas da devoção popular. Assim sendo “estão entre as narrativas da cultura ibérica mais difundidas no Brasil, oficialmente ou através da religiosa leiga”, pois o povo durante séculos viveu lendo as hagiografias e ou história e não estória da vida de cada santo e ou santa, “sobrelevam aspectos de devoção [...] e terão sido os únicos livros que, durante séculos, muita gente leu” (CUNHA, 1993, p. 30). Disso não se tem dúvida, pois, ainda atualmente, a vida e a obra de Padre Cícero do Juazeiro, Frei Damião e Frei Vital, dentre outros que ainda não receberam a glória dos altares, porém, já são venerados pela população leiga como santos do povo.

Devemos mencionar que a religiosidade católica de nossa gente provoca respeito ainda em pleno século XXI, quanto mais no século XVIII, onde o povo jamais ousaria fazer qualquer tipo de atentado contra uma imagem sacra, o que vale registrar de que tal disfarce permaneceu durante muito tempo. O lesa pátria, via o santo de pau oco (atualmente isso se chama propina, corrupção passiva e ativa da riqueza), enricou muita gente do colarinho branco português e brasileiro durante o período colonial, presente no período imperial e bem assim no período republicano brasileiro, tendo em vista que “a memória, a inteligência e a hereditariedade fazem parte da Virtude”(CAMINO, 2004, p. 404). Atualmente é dispensado o santo do pau oco, porque e engenhosidade criminosa brasileira chegou ao ponto de adaptar as novas tecnologias, através de crimes cibernéticos e se não bastasse o uso de rogas, pedras preciosas, dinheiro, etc., na cueca, nas partes íntimas, etc. É o Brasil de mãe Preta e pai João.

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REFERÊNCIAS

AUTOS DE DEVASSA DA INCONFIDÊNCIA MINEIRA. Brasília; Belo Horizonte; Câmara dos Deputados; Imprensa Oficial de Minas Gerais. 1978. 10 volumes. Disponível em: < http://www.literaturabrasileira.ufsc.br/_documents/autos_de_devassa_02-1.htm >. Acesso em 08 de fev. de 2016.

BUENO, Eduardo. Brasil: Uma História - A Incrível Saga de um País. Rio de Janeiro: Ática, 2003.

CAMINO, Rizzardo da. Dicionário Maçônico (1918). São Paulo: Madras, 2004. p 404.

COELHO, Beatriz. Materiais, Técnicas e Conservação. In: COELHO, Beatriz (Org.). Devoção e Arte. 1a edição. São Paulo: Edusp, 2005. p.123-232.

CUNHA, Maria José Assunção da. Iconografia Cristã. Ouro Preto: UFOP/IAC, 1993. p 30.

HOUAISS, Antônio. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Verbete santo - locução santo do pau oco. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001.

FRANCISCO DE PAULA MELO AGUIAR
Enviado por FRANCISCO DE PAULA MELO AGUIAR em 08/02/2016
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