A GAIA CIÊNCIA DE NIETZSCHE: OS QUATRO PRIMEIROS AFORISMOS

BREVE COMENTÁRIO ACERCA DOS QUATRO PRIMEIROS AFORISMOS DO LIVRO A GAIA CIÊNCIA DE NIETZSCHE

Sebastiana Inácio Lima (Diana)

O presente trabalho trata acerca dos primeiros quatro aforismos da obra de Nietzsche A Gaia Ciência. Nesse texto pretende-se compreender esses aforismos através da interpretação filosófica e de estudos feitos no intuito de conhecer um pouco acerca da obra nietzschiana.

Nietzsche inicia o primeiro aforismo “A doutrina do objetivo da vida” afirmando que os homens em particular estão empenhados na tarefa de “tornar-se úteis à conservação da espécie” e isso não se deve ao amor, mas segundo ele aos instintos. Os instintos para ele são a essência da nossa espécie. Outro ponto que ele critica é a distinção dada pelos homens de que existem seres bons e maus, úteis e prejudiciais; ele diz que às vezes esses homens classificados de prejudiciais são exatamente aqueles que carregam consigo instintos que impedem a humanidade de enfraquecer e se corromper, vejamos:

O homem mais prejudicial pode ser ainda, no final de contas, o mais útil à conservação da espécie, pois sustenta em si mesmo, ou nos outros pela sua influência, instintos sem os quais a humanidade estaria há muito definhada e corrompida. O ódio, o prazer com o mal alheio, a sede de tomar e de dominar e, de uma forma geral, tudo aquilo a que se dá nome de mau, não passam de um dos elementos da assombrosa economia da conservação da espécie [...].

Muitas vezes os instintos funcionam como a mola propulsora que faz os homens andarem para frente em busca das próprias realizações, portanto, negá-los não vai torná-los seres humanos melhores, no mínimo pode torná-los mais covardes ou acomodados diante da vida.

Nietzsche fala que o mal não são os elementos instintivos de conservação da espécie, o mal é o que domina os outros, o que coloca o outro ser humano como membro do rebanho. A pessoa que vive no rebanho não tem força para chegar à verdade. Para o homem encontrar a verdade e sobreviver sem estar preso ao rebanho é necessário o equilíbrio entre a razão e os instintos. Porém a razão não pode dominar sobre os instintos de modo a ocultá-los ou negá-los. Em Nietzsche os instintos não podem ser negados, visto que como falamos no parágrafo anterior, os instintos ajudam ao homem a buscar sair das amarras impostas a ele, tornam-no forte e capacitado para romper com a sua própria realidade.

É interessante ressaltar que Nietzsche também valoriza o riso e defende a necessidade de rirmos de nós mesmos e ainda fala que “talvez haja ainda um futuro para o riso” . Ele segue sua crítica dizendo que enquanto os homens estão esperando a comédia da existência ainda não ganharam a consciência de si e continuam na “idade das tragédias, das morais e das religiões” . Observamos nessa primeira parte do texto que ele trata acerca da maneira, do valor e da relação entre os instintos e a razão.

Nietzsche se colocou contra a educação e a moral de sua época, a educação segundo ele, nos moldes tradicionais era uma educação de tartaruga. No que tange à moral ele defende uma nova moral, a moral de Zaratustra. Os instintos são parte dos seres humanos e segundo ele todos têm o instinto de conservação (sobrevivência).

Ainda referente ao aforismo primeiro, observamos Nietzsche falando sobre a importância de amar a vida e da importância do riso. É possível afirmar que essa posição dele influenciou os filósofos existencialistas. Ele critica a pessoa que não rir e vive dessa maneira, que além de não rir ainda tenta proibir o riso do outro. Em seguida, faz uma crítica a falta de preocupação com a natureza por parte dos filósofos. Não a natureza no que concerne a proteção dos aspectos físicos e recursos naturais (água, árvores, animais...), porém ele afirma que todas as éticas até o seu tempo foram loucas e “contra-natureza” , ou seja, éticas que defendiam a negação dos instintos, da oposição ao riso.

Quanto ao uso da razão, Nietzsche vai dizer que o homem tornou-se paulatinamente um “animal quimérico” e com uma existência que se diferencia dos animais apenas no aspecto racional. Para que haja uma evolução da humanidade é necessária uma confiança periódica na vida. Para ele, o trágico traduz a realidade da vida, ele difere do drama, que é o dramalhão, nesse sentido o trágico é mais importante.

Agora falaremos sobre o aforismo segundo “A consciência intelectual”. Nietzsche diz que a consciência intelectual quando a possuímos e quando a usamos, muitas vezes nos tornamos solitários e mal vistos pelos outros. Também quando agimos sem refletir sobre as nossas ações podemos cometer enganos.

Nietzsche critica a superficialidade do refinamento e a educação repressora, nesse tipo de moral e educação, estão presentes todos os elementos de negação dos instintos e é algo que o filósofo critica veementemente. Esse tipo de educação é a tradicional e ainda hoje existem muitas pessoas que são submetidas a ela e os seus valores ainda são reproduzidos.

A nobreza e a vulgaridade é o aforismo terceiro e nesse aforismo Nietzsche fala que há uma verossimilhança em ser nobre e ter ideias elaboradas. Mais uma vez reforça a ideia da alegria pela vida e para alcançar essa condição de alegria é necessário que a pessoa não seja só razão, “a natureza superior é mais desarrazoável” . Vejamos esse trecho:

O ser que se sacrifica e sucumbe aos seus instintos há uma pausa na sua razão nos seus melhores momentos. Um animal que para proteger os filhos arrisca a própria vida, ou que, em período de cio, acompanha a fêmea até a morte, não pensa nesse perigo e nessa morte; a sua razão faz uma pausa, também, pois, que o prazer que lhe dão a sua ninhada ou a sua fêmea e o temor de ser privado desse prazer o dominam inteiramente, torna-se ainda mais animal do que habitualmente, assim como sucede com o homem nobre e magnânimo.

É possível compreender que Nietzsche defende a necessidade de usar os instintos em momentos oportunos sem a preocupação de supervalorizar a vida, ter a capacidade de arriscá-la para proteger aquilo que o homem defende, seja a sua ninhada ou a sua causa, o que importa é não negar os instintos por causa da mesquinhez humana de colocar a própria vida como a coisa mais importante.

Mesmo defendendo o uso dos instintos e afirmando que o homem faz uma pausa na razão, não significa dizer que a razão é desprezada por Nietzsche, em seguida ele afirma que não podemos usar somente os sentimentos (coração) mais, a razão e os instintos de forma equilibrada, mesmo assim, ele vai dizer que os fracos não conseguem compreender como alguém pode se render a paixão pelo conhecimento.

Sobre O que conserva a espécie Nietzsche defende que foram os espíritos fortes e os malignos os causadores do maior progresso da natureza, essa forma de ação que desperta o gosto pela contradição, o novo e o arriscado. Ações malignas muitas vezes através das armas; derrubaram fronteiras, violaram crenças e criaram novas morais.

Essa é uma maldade que faz parte de todos os “professores do novo”8, todos os que pregam coisas novas e propõem novos paradigmas. As pessoas que se arriscam a quebrar antigos limites são consideradas o mal, pois o mal é o que quer conquistar e abater as antigas crenças, só o antigo é tido como o bem. Nietzsche termina esse aforismo afirmando que os instintos são na verdade vitais à conservação da espécie e assim como os bons, são indispensáveis; apenas com uma diferença no seu funcionamento.

Podemos fazer as considerações finais dizendo que é necessário conhecer sempre mais da obra de Nietzsche e as leituras da obra, A Gaia Ciência, ajudaram a compreender um pouco acerca do pensamento dele (Nietzsche) no que se refere a concepção de homem nietzschiana. Sem dúvida nenhuma temos ciência que foram apenas leituras introdutórias e não podemos concluir muita coisa devido à superficialidade da investigação.

REFERÊNCIAS

NIETZSCHE, Frederico. A Gaia Ciência. Lisboa. Guimarães & Cª Editores, 1977. (p. 32-45).

______. A Gaia Ciência. Tradução de Jean Melville, 2. ed. São Paulo: Martin Claret, 2010, (p. 1-50).

Diana Inácio
Enviado por Diana Inácio em 04/02/2017
Reeditado em 04/02/2017
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