Meus dois amigos e a CPMF

Meus dois amigos e a CPMF

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Quem segue meu blog sabe que adoro andar de bicicleta. Aproveito para colocar a conversa em dia com vários amigos “bikers”. Outro dia estavam dois deles comigo. Um deles dono de padarias e lojas de alimentos e o outro médico de um hospital público, aqui no estado de São Paulo.

O dono da padaria falava da dificuldade de ter bons funcionários, porém estava exultante porque a CPMF ia acabar... Ele contou que era o rei da sonegação, “ninguém agüenta tanto imposto”. Logo em seguida falou, debochando, que só o Chicão (eu) não sonega. Normalmente eu levo na brincadeira, mas, por algum motivo fiquei puto e falei: “você pensa que não faz mal para as pessoas? Você vai ficar com o dinheiro para você. Mas, o Dr. ... vai ficar sem aumento do seu salário”.

Meu amigo doutor levantou sua orelha, afinal mexi no bolso dele. Ele não entendia porque a CPMF ia impedir o aumento do seu salário. Tem gente que acha que o dinheiro cai do céu...

Eu disse: “como é que o governo vai poder aumentar a tabela do SUS se perder o dinheiro da CPMF? São 15 bilhões por ano que vai para o SUS. 15 bilhões é muito dinheiro”. Basicamente se não há aumento na tabela do SUS o faturamento do hospital não aumenta, com isto médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, etc. ficam sem aumento. É básico e é lógico.

A CPMF acaba e a situação fica assim: quem sonega ganha, mais ainda. Quem trabalha perde. As grandes multinacionais vão poder mandar mais dinheiro para as suas matrizes. As grandes fortunas vão poder aumentar mais ainda.

Ou seja, o dinheiro em uma sociedade roda e roda, quem fica rico é aquele que consegue que o dinheiro pare no bolso dele.

É por isto que os grandes empresários e os donos milionários das grandes redes de TV e jornais fazem tanta campanha contra a CPMF. Porque o grosso do dinheiro vai parar no bolso deles.

Não seria muito mais lógico manter a CPMF e aumentar o desconto por dependente no IR ou aumentar o desconto para os gastos com educação (que são mais importantes para o Brasil)? Para a classe média é muito melhor, mas para os grandes investidores não. Portanto, a solução deve ser aquilo que é melhor para eles. E os bobos de classe média ficam repetindo aquilo que vai encher os bolsos dos bem ricos e das grandes empresas de dinheiro.

Do painel do Leitor, FSP, 01/10/07

"Não vejo motivo para que alguns berrem tanto contra a CPMF -há outros impostos muito mais onerosos. Pensando bem, a CPMF é um imposto relativamente justo: quem movimenta muito dinheiro paga mais, quem movimenta menos paga menos. Parece-me que todos pagam. Os outros impostos caem de preferência na conta dos trabalhadores. A burguesia e a classe alta fazem todo o possível para ludibriar o governo e não pagar o devido imposto. Nós, os trabalhadores, não temos escapatória: o imposto já vem descontado na folha de pagamento. Se é para lutar contra os impostos, por que não combater o imposto pago pelos trabalhadores? Quem deveria pagar imposto é a burguesia e a classe alta. A gritaria contra a CPMF ocorre porque ela incide sobre o dinheiro da burguesia. A vontade dessa classe é não pagar nada, deixar tudo para os trabalhadores pagarem. Esta é a ética possível no regime capitalista."

J L C (Guaratinguetá, SP)

Nota do Chicão: o ponto central não é um pagar e o outro não. Isto é um pensamento simplista. A questão é: uma sociedade em que há distribuição de renda há mais geração de empregos e, por suas vez, mais circulação de dinheiro. Ou seja, quantas vezes vai ao ginecologista por ano uma mulher que ganha R$ 1.000,00? Quantas vezes vai ao ginecologista por ano uma mulher que ganha R$ 100.000,00? Exatamente a mesma quantidade de vezes. Ou seja, para quem é dentista, médico, advogado, engenheiro, etc vale mais a pena ter uma sociedade onde existam um monte de pessoas que ganham entre 2 e 5 mil reais. Ou seja, quanto mais distribuição de renda mais emprego para a classe média e mais empreendimentos da classe média tornam-se viáveis.

As leis são organizadas para a classe alta e as grandes empresas pagarem pouquíssimos impostos. Como a classe média, que é cega e boba, ganha algumas migalhas ela acha que está levando vantagem. Observe uma lei que garante a quem aposenta por invalidez isenção do Imposto de Renda (IR):

a) quem não paga imposto não tem direito a este benefício (os mais pobres)

b) quem ganha 3 mil reais/mês, tem alguns benefícios (dependendo da situação algumas centenas de reais, em outras alguns poucos milhares, mas a maioria tem benefício de centenas de reais).

c) Quem fatura 50.000,00/mês tem uma monstruosidade de benefício, que supera a barreira de 100 mil reais por ano.

Onde a classe média perde: ela perde de duas formas, pois costumeiramente precisa usar o serviço público quando tem problemas de saúde de alta-complexidade que a maior parte dos planos de saúde não cobram e descobre que o dinheiro ficou com os mais ricos, os muito ricos (nesta hora - dos custos do tratamento- a classe média descobre que é pobre). Perde também quando os limites de deduções não são aumentados e quando a tabela de cobrança do imposto de renda não é corrigida segundo a inflação (nos anos FHC-PSDB a tabela ficou vários anos sem correção).

Toda as vezes que fizerem uma campanha contra imposto é bom ficar atento, pois são divulgadas somente as soluções que vão beneficiar os que estão no topo da pirâmide social e as grandes empresas. Pense sempre: vai gerar distribuição de renda? É bom para os pobres e para os que ganham menos? Quase sempre os interesses da classe média é igual ao interesse dos mais pobres.

Quase sempre os interesses da classe média é igual ao interesse dos mais pobres.

Saiba mais:

Golpe contra a classe média: fim da CPMF

CPMF e a mídia agindo em causa própria

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