Réplica aos "orientalistas"

A descoberta da Filosofia é algo que, antiteticamente, constrói e destrói ao mesmo tempo. Constrói, porque depois de rasgados os véus dos mitos o ser humano, diante de uma verdade filosófica e impertérrita, vê-se intimado, por sua consciência, não só a trilhar um novo caminho conceitual sobre a Verdade, como também a construí-lo, a posteriori, este novo trajeto; e destrói na medida em que, encontratada a veritas maximus, de nada mais servem as explicações e mitos anteriores, portanto, o surgimento da Filosofia no homem representará, sempre, uma reviravolta, do contrário não é amor à sabedoria o que está se processando no pensamento desta pessoa.De exemplos do que é esta transformação conceitual e existencial do ser humano que passou a ter uma postura filosófica, a História está repleta: o próprio iniciador da metafísica e da ética ocidentais, filosoficamente falando, o Sócrates é uma demonstração clara deste fenômeno(em plena velhice, depois de auto-indagações profundas este homem extraordinário abandonará o sossego do seu lar para entregar-se a uma missão filosófica por todos os recantos de Atenas) e já na era moderna, veremos mais uma vez do que a forçada da Verdade é capaz, na atitude, já clássica, do filósofo holandês Baruch de Espinosa, que mesmo excomungado da comunidade judaica à qual pertencia, não retrocedeu em momento algum nas suas colocações, decisão esta tão louvável se a compararmos com o caráter de um importantíssimo pensador, contemporâneo seu, Leibniz.

Ao colocar-se ao lado dos hodiernos pesquisadores da História e da Arqueologia, Marilena Chauí, no seu capítulo II, da obra "Convite à Filosofia", argumenta que sob influências orientais os gregos foram, pouco a pouco, desenvolvendo o pensamento filosófico e chegando até, a transformarem os mesmos conceitos orientais que exerceram suas ascendências sobre a cultura grega. Entretanto, se mergulharmos na História, iremos nos deparar com a seguinte situação: o filósofo como ser humano, como cidadão, será sempre um espírito questionador, chegando, às vezes, a viver à margem da sociedade e da própria cultura em que está inserido(vide os casos de Sócrates,Diógenes, o cínico, Epicuro, Espinoza, Giordano Bruno, Nietzsche e em, até certo ponto,Wittgenstein, Sartre e os existencialistas). A Filosofia nunca representa o fruto, colhido de uma árvore, já semeada e crescida; será sempre o gérmen de uma verdade que, após sua sitematização e comprovação, tornar-se-á numa árvore frondosa e imensamente frutífera, portanto, o que os gregos fizeram no campo do pensamento ocidental, não foi uma simples adaptação ou reformulação(como querem os novos pesquisadores) das influências orientais, mas uma criação única e singular em toda a História, como inusitado é, o próprio poder de transforamação do pensamento filosófico em qualquer ser humano comum. Foi a leitura de "Vontade e Representação" de Schopenhauer que decidiu Nietzsche a tornar-se um filósofo; foram os avanços técnicos, o advento da navegação(que derrubou inúmeros mitos alimentados pelos rapsodos gregos), a melhora da economia e um maior acesso aos saber, até então cercado e monopolizado nas mão de sacerdotes e anciãos, que levou o povo grego a levantar indagações, até então nunca praticadas e assim, des-co-bri-rem(não inventarem) a Filosofia. Uma análise mais acurada da sociedade grega quando da época áurea de Sócrates e Platão irá revelar que os mitos, mesmo com o surgimento dos primeiros pensadores, continuaram existindo a ponto de os próprios filósofos participarem das cerimônias que reverenciavam a mitologia tradicional, sem que estas práticas, interferissem em suas posturas filosóficas(vide o clássico episódio de Sócrates que ao participar de um ritual no templo de Delfos foi cognominado pelo oráculo, ali presente, de "o mais sábio dos homens").O próprio conceito de que o filósofo é um mestre, transmite-nos a noção de um homem que descobriu algo superior, uma magna veritas; de uma pessoa que contrariando a praxe do raciocínio comum com suas já previsíveis conclusões, resolveu abordar a questão por um ângulo novo, mais reflexivo, ponto de vista este que não pode ser experimento pelos outros homens, simplesmente por estarem, ainda, à sombra de inúmeras influências culturais, morais e éticas.

Fortim-Ce., 06 de setembro de 2007.

André Breton

11:44h