Abordagem sobre o conceito de paisagem pela Geografia

Aires José Pereira

Há na Geografia um tratamento dicotômico sobre o conceito de paisagem, apesar de se tentar unir as duas grandes áreas dessa ciência, quais sejam: a Geografia Física e a Geografia Humana, uns geógrafos tendem a trabalhar a paisagem do ponto de vista “natural” e outros que discutem a paisagem a partir da ação antrópica nesse quadro natural, quer dizer, levam a cultura em consideração ao se trabalhar com esse tema.

Tradicionalmente, os geógrafos diferenciam entre paisagem natural e a paisagem cultural. A paisagem natural refere-se aos elementos combinados de terreno, vegetação, solos, rios e lagos, enquanto a paisagem humanizada inclui todas as manifestações feitas pelo homem, como nos espaços urbanos e rurais. De um modo geral, o estudo da paisagem exige um enfoque, do qual se pretende fazer uma avaliação definindo o conjunto de elementos envolvidos, a escala a ser considerada e a temporalidade na paisagem. Enfim, trata-se da apresentação do objeto em seu contexto geográfico e histórico, levando em conta a configuração social e os processos naturais e humanos. SCHIER, 2003, p. 80.

Milton Santos também vai discutir paisagem fazendo o contraponto entre a característica da geografia física e a da geografia humana, mas possibilitando uma dialética entre ambas as formas paisagísticas. Inclusive ele nos alerta sobre as intenções políticas existentes nestas ou naquelas paisagens.

A paisagem artificial é a paisagem transformada pelo homem, enquanto grosseiramente podemos dizer que a paisagem natural é aquela ainda não mudada pelo esforço humano. Se no passado havia paisagem natural, hoje essa modalidade de paisagem praticamente não existe mais. Se um lugar não é fisicamente tocado pela força do homem, ele, todavia, é objeto de preocupações e de intenções econômicas ou políticas. Tudo hoje se situa no campo de interesses da história, sendo, desse modo, social. SANTOS, 1997. p. 64.

Por outro lado, há também quem tenta discutir paisagem na ciência geográfica como um todo, de forma holística. Essa holisticidade vai além da simples observação/contemplação da paisagem; se ela é natural ou humana. É preciso entender a sua essência enquanto tal e analisar cada elemento constitutivo desse todo e prosseguir uma leitura mais criteriosa acerca da mesma. É preciso utilizar a ciência a que se está utilizando, mas também, levar em consideração o “mundo” imaginário de quem construiu essa paisagem ora estudada.

Uma paisagem modificada pelo homem, não é, portanto, uma paisagem antinatural, mas uma paisagem cultural que deve atender tanto a critérios funcionais quanto estéticos. Assim sendo, não pode ser planejada de acordo apenas com prioridades econômicas rigorosas que levam a perda dos valores ambientais para, posteriormente, ser embelezada, num ato de redenção estética, pela inserção de elementos românticos pseudonaturais. LEITE 1994.p. 07.

Na geografia, como em muitas outras ciências, apesar do interesse em estar estudando e tentando entender o espaço geográfico por meio da paisagem, ainda não se tem uma ideia pronta e acabada acerca da mesma. Mesmo porque, se uma ciência consegue “lapidar” esse ou aquele conceito sem mais precisar discuti-lo, essa discussão deixa de ser científica e se torna dogma.

Embora o conceito de paisagem esteja bastante assimilado pela geografia, a construção da ideia não está de todo acabado. Alguns aspectos são comuns à maioria dos conceitos, mas ainda há dúvidas e discussões. Um dos pontos comuns é a afirmação de que a existência humana deve ser incluída no conceito de paisagem. Mas a frequência com que é repetida parece evidenciar a luta da geografia em não fragmentar estudos de paisagem em ciências específicas, que excluem de suas pesquisas a dimensão social, econômica e cultural, assim como as relações horizontais entre elementos. Outro aspecto sólido na concepção geográfica de paisagem diz respeito ao aspecto visual, como o contrário, ou resultado, dos eventos naturais e sociais. São as fisionomias e morfologia, de interesse da geografia e que ocupam determinado espaço. MAXIMIANO, 2004. p. 88.

A paisagem tem sido um tema recorrente à geografia desde há muito tempo, como forma de se entender as relações sociais que o homem estabelece com seu espaço, com o seu lugar e com outros homens de lugares distantes. É claro, cada cientista procura “defender” por assim dizer o seu mundo vivido, percebido, sentido e politicamente “correto” de acordo com seus interesses ou interesse de seu grupo.

A discussão sobre o conceito de paisagem é um tema antigo na geografia. Desde o século XIX, a paisagem vem sendo discutido para se entenderem as relações sociais e naturais em um determinado espaço. Dentro da geografia, a interpretação do que é uma paisagem diverge das múltiplas abordagens geográficas. Observa-se que existem certas tendências “nacionais” mostrando que o entendimento do conceito depende, em muito, das influências culturais e discursivas entre os geógrafos. SCHIER, 2003, p. 80.

Nessa grande panaceia discursiva, dependendo do momento histórico, político, ideológico, social, cultural, alguns cientistas se tornam o porta-voz desses ou daquele povo, tanto pode ser no sentido de emancipar ou manter um dado poder de um dado grupo sobre o outro. É muito comum haver manifestações desta ou daquela natureza a favor ou contra esse ou aquele grupo por meio de “leituras” interpretativas de cientistas que se destacam na sociedade. Em relação às interpretações sobre a paisagem deste ou daquele lugar não são muito diferentes.

A paisagem do cerrado brasileiro foi categoricamente “interpretada” pelos cientistas que estavam a favor da produção capitalista em larga escala, como “feia”, “exótica” e que o seu ecossistema era pobre, e que, portanto, poderia ser totalmente “despido” para produzir grãos e carne para o Sudeste do Brasil e para a exportação. Hoje todos sabem que é do cerrado que surgem os nossos principais rios brasileiros, por exemplo. Mas vamos ver como a paisagem tem sido discutida e trabalhada pela geografia no Brasil.

*Observação: este artigo faz parte de artigo publicado em Revista Científica de Geografia, bem como, de minha tese de Doutorado intitulada: LEITURAS DE PAISAGENS URBANAS: Um Estudo de Araguaína - TO, defendida em 24 de abril de 2013 na Universidade Federal de Uberlândia.

Aires José Pereira é professor do curso de Geografia e do Mestrado em Gestão e Tecnologia Ambiental da Universidade Federal de Rondonópolis, é coautor do Hino Oficial de Rondonópolis, possui vários livros e artigos publicados. É membro efetivo da Academia Rondonopolitana de Letras e da Academia de Araguaína e Norte Tocantinense.

Aires José Pereira
Enviado por Aires José Pereira em 30/01/2024
Reeditado em 31/01/2024
Código do texto: T7988593
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