Um estranho em meu corpo. Por Meraldo Zisman

…Há um desassossego, intranquilidade ou indisposição para com o próprio corpo. Passam a se sentir como estranhos dentro do próprio corpo…

Masculino e feminino são características que abarcam fatores distintos.

Sexo é o conjunto de caracteres, estruturais e funcionais, segundo o qual um ser vivo é classificado como macho ou fêmea. Gênero é a flexão pela qual se exprime o sexo real ou subjetivo do ser. No caso precípuo o gênero é uma maneira de se sentir masculino ou feminino, nada havendo com o sexo anatômico. O bebê nasce com as genitálias próprias e cogita, sou homem, sou mulher. Quando não ocorre tal congruência somatopsíquica passa a ser considerado disfórico (do grego dysphoría, mal-estar, indisposição). No caso, seriam os portadores de disforia de gênero. Tais crianças mostram preferência e inclinações para ser do sexo oposto ao que nasceram.

As coisas podem caminhar silenciosamente durante o período da infância, porém, eclodem na puberdade quando surgem os caracteres sexuais secundários. Há um desassossego, intranquilidade ou indisposição para com o próprio corpo. Passam a se sentir como estranhos dentro do próprio corpo.

A Medicina oficial, seja por preconceito ou por ignorância, esqueceu do seu dever precípuo diante dessas pessoas: curar às vezes, minorar o sofrimento, sempre.

Assim abandonados e não sendo consideradas portadores de doença mental são vítimas de preconceitos e discriminações de todas as ordens e passam a fazer parte de movimentos gays de todas as nuances. O emprego de hormônios, cirurgias, psicoterapias, atenção religiosa, assistência social e maior esclarecimento não trouxeram um grande avanço para minorar o sofrimento.

Mesmo as cirurgias transexuais de melhores resultados cosméticos não resolvem o padecimento dessas pessoas. Chega de omissões e tabus. Os denominados trans masculinos [homens para mulheres] ou trans femininos [mulheres para homens], podem, com a ajuda médica, alcançar uma harmonia existencial. Somos de opinião que o problema não está relacionado exclusivamente com a sexualidade.

Isto é, se a pessoa é homossexual masculino (gay) ou homossexual feminino (lésbica) ou que seja transviada, pouco importa a adjetivação, necessitam ajuda.

Seria ser simplista demais com assunto tão complexo olhar unicamente a sexualidade. Temos atendido pessoas que se a submeteram a dolorosas e custosas cirurgias com ótimo resultado estético e não melhoraram a condição. Não estão bem consigo mesmas. Muitos países aceitam um novo certificado de nascimento e nem com isso o preconceito diminui. Apesar de estarem protegidas por lei quanto ao direito ao trabalho, às escolas, iguais oportunidades, contraírem matrimônio, permanecem discriminados.

A Medicina não pode mais se furtar em ajudar e aliviar o sofrimento dessas pessoas. Será que o leitor conhece quem esteja mais bem preparado que o Médico Psicossomatista para cuidar do indivíduo que se sente estrangeiro dentro do seu próprio corpo? Vale mais do que nunca o aforismo: “Sedare Dolorem Opus Divinum Est “: “Sedar a dor é obra divina”.