CABO-DE-GUERRA

QUANTO CUSTA UMA VIDA NUM PAÍS CAPITALISTA?

Depois de ler essas reportagens é possível tirar algumas conclusões a respeito do sistema capitalista selvagem em que vivemos. Pior que não é só aqui no Brasil, mas, aonde o capitalismo tomou conta, o valor da vida passou a ser medido pelo valor do dinheiro ou das riquezas.

Vivemos uma época de disputas acirradas, onde não mais as crianças brincam de CABO-DE-GUERRA, mas adultos gananciosos. A miséria e o luxo, a fome e a fartura, as mansões e os casebres, a cidade contra o morro, a periferia contra o centro. O nosso Brasil tão cantado e decantado nas marchinhas antigas e que inspirou a música “Brasileirinho” tem se transformado num palco de disputas e brincadeiras, porém, no lugar das crianças são os homens que brincam de cabo de guerra. Trata-se de uma luta entre os fracos e os fortes; oprimidos e opressores, enfim, é preciso refletir: De que lado você está? Em qual das pontas? Ah! Só um lembrete: a classe média não existe, ela se junta aos que estão na ponta dos abastados e os fortalecem, apenas um ou dois mais conscientes vão para a ponta dos pobres.

A metáfora do cabo-de-guerra serve para ilustrar duas situações ocorridas:

- O caso da estudante de Pedagogia que morreu por falta de 10 reais e o caso do indo Galdino!

Com certeza Viviane Brito e Galdino Jesus dos Santos estavam entre aqueles que puxavam a outra ponta do cabo-de-guerra social e econômico que lança milhões sob o solo frio da miséria todos os dias. Veja trechos das reportagens e depois tire suas conclusões. Será que devemos continuar omissos? De que lado você está?

Sem R$ 10 estudante morre de asma

Atendentes não venderam remédio porque faltava dinheiro

Estudante de pedagogia, casada e mãe de dois filhos –– uma menina de 9 anos e um menino de 5 ––, a recepcionista Viviane Brito Barbosa, de 29 anos, morreu por não ter R$ 10 a mais no bolso na hora de comprar um remédio para asma. Moradora do bairro periférico de Fazenda Grande do Retiro, em Salvador (BA), Viviane começou a ter um ataque asmático em casa, na noite de quarta-feira. Sem conseguir localizar a “bombinha” –– equipamento que dispara um jato de broncodilatadores diretamente nas vias aéreas do paciente –– no imóvel, resolveu seguir para a farmácia mais próxima (chamada Farmácia Popular, apesar de não fazer parte do programa homônimo do governo federal) para comprar outra.

Vendo a urgência da situação, o padrasto dela, o aposentado Renê Moreira, prontificou-se a ir junto, mas esqueceu a carteira em casa. ‘Chegando lá, Viviane viu que só tinha R$ 12 no bolso –– e o remédio custava R$ 22’, lembra Moreira. De acordo com ele, a crise foi se agravando e as duas funcionárias da farmácia não se mobilizaram para vender o medicamento, nem quando ele se ofereceu para deixar os documentos do carro.

Vendo Viviane com os lábios arroxeados, Moreira resolveu levá-la diretamente para o centro de saúde. Ela desmaiou no caminho e sofreu uma parada cardiorrespiratória. (Jornal de Piracicaba Oline, Sábado, 22 de Dezembro de 2007)

E o índio Galdino?

Abril não é tempo de festa para um grupo de índios que vive no sul da Bahia, não muito longe de onde aportaram as primeiras caravelas portuguesas. Há três anos, um de seus líderes foi incendiado por cinco jovens enquanto dormia, e a fatalidade fez de Galdino Jesus dos Santos o mais famoso entre os pataxós hã-hã-hãe, mas não seu único morto. Pouco mudou na rotina de sua família pobre, que continua chorando perdas e brigando pela posse de terras secas, enquanto aguarda a justiça dos brancos.

As chamas do índio Galdino Jesus dos

A cova de Galdino na noite do enterro; o túmulo, na aldeia Caramuru, fica próximo ao do irmão morto a golpes de facão

Santos, queimado por cinco jovens enquanto dormia num ponto de ônibus, em 20 de abril de 1997, continuam ardendo no sul da Bahia. Na ocasião em que se celebram os 500 anos de descobrimento, não é difícil entender por que os 1.800 índios agrupados nas aldeias Barrethá, Panelão e Caramuru, entre eles a família de Galdino, são avessos a comemorações.

O pataxó hã-hã-hãe morreu em Brasília dois dias depois do Dia do Índio, "dia de festa só para os brancos", nas palavras de sua mãe, Minervina Maria de Jesus. Um ano depois, no fatídico Dia do Índio, um pataxó foi baleado por socorrer outro irmão de Galdino, o índio Valdir, que apanhava de policiais na entrada da aldeia. Luis Titiá, filho de uma liderança local, perdeu um dedo e ficou com o joelho comprometido. Valdir escapou ileso. Sorte grande numa região onde já foram mortas 24 lideranças indígenas.

Galdino não era um índio qualquer. Tinha audiência marcada na capital do país para tentar avançar numa luta antiga -recuperar o território que os índios dizem ser seu. A disputa pela posse das terras já tinha feito uma vítima na família. Nove anos antes, um irmão de Galdino, o cacique João Cravim, foi morto a golpes de facão. Para Minervina, a morte de um, assassinado a mando de fazendeiros, está entrelaçada com a tragédia do outro. A morte de João teria agravado na aldeia o sentimento de revolta diante de uma injustiça histórica: os primeiros habitantes do país ficaram sem terra.

Galdino estava em Brasília com o pai, Juvenal Rodrigo, para pedir rapidez no processo de expulsão dos fazendeiros de uma área de 750 hectares, que os índios já haviam conseguido recuperar através de uma liminar de 1996. A área, que englobava cinco fazendas, acabou sendo devolvida em 23 de abril de 1997 - dia do sepultamento de Galdino. Seria restituída de qualquer modo, mas a tragédia apressou a reintegração.

Hoje 280 famílias ocupam as três aldeias. Na maior, Caramuru, vivem os pais e uma filha de Galdino -a 230 quilômetros de onde aportaram as primeiras caravelas portuguesas. Desde 1982, eles conseguiram recuperar 2.100 hectares - pouco para quem quer de volta os 54 mil hectares do território original, região remanescente da Mata Atlântica, situada nos municípios de Itaju do Colônia, Camacan e Pau Brasil, demarcada em 1926 como território indígena pelo Serviço de Proteção ao Índio (SPI).

"Fomos lá pedir a nossa terra e recebemos um caixão"

Minervina, mãe de Galdino e João Cravim, teve 20 filhos. Hoje são nove filhos vivos, 58 netos e 12 bisnetos -uma conta que toma tempo para ela fazer. O pai dela, Leôncio, tem 88 anos e também vive na aldeia Caramuru -no seu quarto pendurou o rifle, memória de que os conflitos estão lá desde sempre. Quando Minervina nasceu, há 60 anos, Leôncio havia fugido do local temendo as ameaças dos fazendeiros.

"Acharam que por meu filho ser pobre, tinha pouco valor"

Não esqueço como meu primeiro filho morreu, também não esqueço como se foi o segundo. A derradeira morte foi até mais difícil de aceitar. Fizeram ingratidão com ele porque acharam que como pobre, tinha pouco valor. Eu não tenho medo mais de falar o que penso. Quando cheguei na aldeia trazendo o caixão, perguntaram se eu ainda tinha forças para um dia voltar a Brasília. Eu disse: 'quando tiver precisão volto", afirma o pai de Galdino. Mas Juvenal adoeceu e quis ficar um tempo longe de manifestações de caráter político - raras ocasiões, fora dos rituais, em que ainda usam tanga e cocar. Angustiado, não queria comer e nem tinha força para trabalhar nas roçadas de mandioca, arroz e feijão. (BRASIL » NOTÍCIAS, 14/12/2007 » 20h49)

Até quando pessoas irão morrer nessa disputa entre possuidores e despossuídos?

Tem coisas que nunca irei entender: como pode uma América Latina pobre sustentar os países ricos? O Brasil é celeiro pra sustentar com grãos cavalos de raça e gatos de madames norte-americanas. Temos 8,5km de extensão territorial num país-continente! O Brasil cabe muitas Suíças juntas, e Suécias, nem se fala, só não cabem os brasileiros. Tem lugar para japonês, alemães, norte americanos, chineses e todas os estrangeiros vêm pra cá. Só não tem lugar para pessoas como Galdino e Viviane!