Polícia: grupo de extermínio?

Os problemas envolvendo os desmandos e o abuso de membros da Polícia Militar – em São Paulo ou em qualquer outro estado – não são novidades. Apesar das denúncias e dos flagrantes da imprensa, as sanções administrativas ou penais não surtem efeito. Policiais ainda transgridem seguramente os limites da ética e dos Direitos Humanos para aliviar a tensão animal presente em qualquer pessoa. Eles poderiam exteriorizar tal tensão animal nos cidadãos?

O debate sobre o comportamento da Polícia Militar – e também da Civil, da Federal, das Casas Legislativas e das Forças Armadas – deve acontecer em todas as cidades. Poucos não são os abusos cometidos por aqueles que, em nome do Estado, deveriam preservar a ordem, mas atingem outras finalidades.

As agressões, os desmandos e a invenção da realidade criminosa ultrapassam o bom senso e as limitações geográficas não sendo mais privilégio de capitais populosas como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador ou Porto Alegre.

Se para muitos 2007 representou um ano de bons resultados, para outros não passou de um ano de arbitrariedades. Policiais militares de Bauru (SP) protagonizaram dois espetáculos lúgubres.

No primeiro deles, um motociclista supostamente burlara a barreira de fiscalização. Caiu ao chão aos tiros. As frágeis alegações de fuga e eventual porte de droga poderiam ser aceitas como verdade caso a mãe do morto mantivesse silêncio diante de provas incontroversas da execução pública, posteriormente comprovada por laudos do Instituto Médico Legal. Além da execução, os policiais militares supostamente tentaram criar um cenário que evidenciasse a culpa do motociclista e os isentasse do assassinato.

Para a mãe corajosa, ainda é possível lutar por Justiça, denunciar bandidos metidos na polícia e possibilitar que outras pessoas, espelhando-se nela, assumam seus papéis no exercício pleno da cidadania no Estado Democrático de Direito.

Dúvidas a respeito da ação dos policiais militares envolvidos nesse caso ainda podem ser levantadas e, dependendo da situação, se transformar em convicções e verdades. Mas como aceitar o argumento de que precisavam matar uma pessoa para simplesmente parar uma moto?

Outro fato – falhamente tratado pela imprensa daquela cidade – despontou nas redes de televisão do país, nos jornais e revistas de grande circulação e nas páginas de notícias da internet: o extermínio de um jovem negro na periferia.

Uma denúncia de roubo de moto incentivou a invasão de uma casa na periferia de Bauru por policiais militares. Mantidas sob a vigilância e as ameaças de um policial na sala de estar, mãe e irmã desesperavam-se ao ouvirem cinco policiais espancarem, darem choques elétricos e torturarem o suposto acusado no quarto de quem, segundo os mesmos policiais, drogas foram encontradas. O garoto morreu no hospital horas depois da tortura. Desde quando a Constituição Federal permite aos policias “baixarem o cacete” para conseguirem confissões ou obterem respostas? Quem acredita no depoimento desses “policiais”? Quem acredita que realmente havia drogas no quarto do garoto?

Policiais Rodoviários Federais pertencentes à Delegacia Federal em Marília foram presos em novembro sob acusação de condutas inaceitáveis. Segundo informações obtidas em agências de notícias e em jornais, os policiais rodoviários federais, acompanhados de outros policiais e de fiscais de agências reguladoras, defendiam interesses de algumas prováveis empresas de turismo. Como faziam isso? Paravam ônibus das empresas adversárias nas estradas, apontavam defeitos que não existiam, aplicavam multas e supostamente introduziam drogas nas bolsas dos passageiros numa inacreditável prática de concorrência desleal e criminosa.

Neste momento, pessoas perambulam nas cadeias sem saber como a droga alojou-se em suas bolsas. Outras estão em presídios, condenadas mediante o falso testemunho de policiais rodoviários, agentes do Estado, que gozam de “presunção de veracidade dos fatos por eles narrados”.

As denúncias contra os policiais militares “exterminadores” em Bauru procedem integralmente. Pelas provas robustas e incontroversas apresentadas, devem ser julgados, condenados, aprisionados, demitidos da Polícia Militar.

Os gritos de socorro, de repúdio e de denúncia em Bauru acentuaram-se, tomaram forma, ganharam o Brasil. Quantos gritos de socorro, de repúdio e de denúncia estouram nas cidades do Vale do Paranapanema sem ainda serem ouvidos?

*Publicado no Jornal de Assis (Assis – SP) de 15 de fevereiro de 2008.