O AMOR TEEIMOSO NAS ASAS DE (GERALDO RAMÓN)

– O Amor Teimoso nas Asas de (Geraldo Ramón)

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Escolhemos, para estas considerações sobre o acadêmico Geraldo Ramón Pereira, o seu livro Álbum de Sonetos, dentre as obras que ele publicou, pela peculiaridade de focar e manter no centro o amor na dinâmica dual homem-mulher, significando um ensaio fantástico em que se dá um salto para o amor universal, mas, curiosamente, obriga-se a resumir o impulso expansionista, dada a atração, um pelo outro, condicionada ao tempo, ao espaço-matéria e às idiossincrasias de dois seres submetidos aos deleites, restrições, medos e sofreres dos corações que se entrelaçam. Ele quer trazer o céu para a terra; brinca com o impossível e beija-o, miraculosamente.

Escritor aplicando estilo expressionista nesta obra expõe exageradamente o que há na gota do amor a dois resumindo o amor universal. Em linguagem cosmogônica, a parte resume o todo quando se fala em essencialidade de existência. Digo, nesse caso o grão quântico reflete a mesma coisa da pétala ao roseiral, do cisco à totalidade do deserto, do gemido ao trovão, do infinitamente pequeno ao infinitamente grande.

— Preso ou liberto a dois, quantas formas há para se amar, e até quando, Ramón? Quem ou o que o leva a ousar no entregar-se aos aspectos dessas formas? Aprender as sutilezas desses aspectos? Amadurecer prostrar ou rejuvenescer avivar?... Filandras dessas sutilezas a inventar? Quantas e quais potencialidades energéticas para extrair fiapos com que tecemos as redes da nossa alma?...

Qual conhecimento poderia explicar o fenômeno de a paixão, sendo quente como o inferno, ao mesmo tempo fazer parte do céu do amor? O poeta aguça o lápis para dar transcendência ao significado daquilo que para nomear a sua eleita é muito mais que uma palavra: “Teu nome é luz que surge em céu nublado /Depois que a lua em densos nimbos some...”.

E lá se vai esse enlouquecido de amor a identificar, em seu soneto “Essência da Vida”, o cheiro natural da mulher amada como sublime, doce e divinal. — Sim, os cheiros!... Nenhuma pessoa deste mundo exala de si exatamente o mesmo cheiro de outrem. Nenhum cheiro de gente é igual a outro cheiro de gente. Isso é particularíssimo, Deus é individual. Na sublimidade Geraldo Ramón insere a festa dos sentidos: cor, sabor, sensualidade. A doce ilusão sôfrega desafia a realidade. Quereria poderosamente reter no tempo, após a fêmea “ser sua”, “a paz do depois”. E afirma, em função da intimidade alcançada com seu “bem”, ser a realidade ainda mais bela que o melhor sonho.

Tem olhar único para uma curva única: todas as curvas da mulher amada, apreendendo o eterno em uma fração de segundo como nos dizeres da peça “Guerra do Amor”. Tocado nas cordas invisíveis das emoções, um simples “oi!”, proferido pela musa faz dele um milionário das sensações ouvindo “o tinido de alianças num escrínio de amor azul-anil...”. Daí apegar-se à “Teimosia do Tema” colado às delícias da comunhão a dois conforme elege de variados modos. Chega a anunciar uma “poupança de felicidade” construída por ambos, em simbiose, com saldo suficiente para retardar a chegada da dor.

Entretanto como um índio, ausculta o chão que estremece quase imperceptivelmente ainda, com o cavalgar de acontecimentos dolorosos desde ao longe se atropelando para chegar-lhe às portas do coração amante. Sente-se sondado pela partida indesejada após as subidas de beijos e abraços. Assume que “Se tanta coisa anima na ascensão, /Só a saudade pega em minha mão /E me ampara na dor, descendo a escada!”.

Cismando, avalia que o amor poderia ser um “mal” e, se for “... na minha vida uma doença, /Teu amor é meu único remédio!”. — E oferece: “... Mesmo morto me hás de ver a luz, /Vislumbrando, nos braços de uma cruz, /Minha imagem sorrir, te abrindo os braços!”.

Aflições pequeninas se lhe agigantam no campo interno: asfixia-lhe por vezes a expectação da fuga repentina daquilo que é o erótico saboroso desejado e libertador do mútuo bom. Ronda-lhe a morte em “Campo Santo”; e ainda que timidamente, a sombra do ciúme. Agora em Ramón o amor sofre por antecipação. “Vivendo com só um coração” (no amor a dois), em “Trilogia do Amor” entrevê a dor do adeus, as lágrimas, a separação...

Geraldo Ramón Pereira, nascido em Maracaju, ocupa na Academia Sul-mato-grossense de Letras a cadeira nº 39, cujo patrono é João Tessitore Júnior. É romancista, contista, cronista, poeta sonetista e compositor; violeiro com o nome artístico “Gê da Viola”.

Cirurgião dentista pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS); pós-graduado em fisiologia e biofísica (Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP); mestre em biologia nas áreas de fisiologia médica e biofísica (Unicamp – Campinas – SP). Professor na UFMS (biofísica e fisiologia médica) durante 23 anos. Ex-professor (fisiologia) na Universidade Católica Dom Bosco em Campo Grande (UCDB).

Gravou CD, participou de vários programas de televisão, integra diversos projetos culturais. Escreveu e publicou os livros Poemas Íntimos (1966); Poemas Íntimos II (1974); Estrelas de Sangue (poesias e pensamentos, 1976); Caroço de Manga (romance, 1977); Discurso de Posse (discursos, 1987); Álbum de Sonetos (1989);

Contrastes da Vida (contos e crônicas, 1994); Caderno de Sonetos (1998).

O poeta está preparando a obra Sonetos de Agora e Sempre, certamente imbuído do permanente desejo de trazer o Céu a Terra.

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GUIMARÃES ROCHA

*membro da Academia Sul-mato-grossense de Letras

Guimarães Rocha
Enviado por Guimarães Rocha em 27/04/2008
Código do texto: T964162