(imagem: esboço meu, feito sobre o joelho, agora mesmo...)

NESTAS ASAS EM QUE ME CRUCIFICO...



-CARTAS À MINHA VIDA-

Minha querida Vida...

Tenho tanto amor no peito!...
Porque, então, não sou melhor do que sou?...
Porque não faço da minha alma cheia de amor, a minha força, saio de mim o melhor, me faço una, vontade e ser, querer e fazer!?...
Porque me enfraqueço à luz, porque não trago de dentro a coragem de me erguer?...
Porque sou duas, uma que te sabe, outra que te enfrenta, em cambaleante passo de trémulo círio?...
Porque não sou melhor mãe, melhor mulher, melhor pessoa... melhor querente, melhor amante!... (tenho tanto amor no peito!...).
Porque não te faço lição prática, e te não faço táctica de guerreira audaz?!... Tu não tens culpa, Vida, eu sei... Foste até boa mestra, ensinaste-me pelo amargor, pela dureza, pela experiência da ferida na própria carne! E eu até sei de cor as lições!... na ponta da língua, no fundo da alma. Mas não sei...
Não sei por em prática o que me proponho, amordaçam-me as luzes cruas do amanhã que sempre adio! Amanhã, amanhã... Amanhã vou ser Eu, amanhã vou ser Melhor, amanhã eu redimo-me, amanhã vou FAZER...
...e o Amanhã nunca espera por mim, nunca me dá o tempo, passa logo a Ontem...
E do Hoje eu faço Esperança, mera esperança, feita em versos de sereia que nunca se mostra MULHER... Sempre na dualidade de não ser carne nem peixe... Sempre no jejum de ser a Sexta-feira santa em que não pecou... ou de ser a promessa de ser o ídolo profano que nunca foi...
Vida!...
Tenho tanta boa vontade no peito!...
(Mas já de longe se diz: "O Inferno está cheio de boas intenções"!)
E eu ardo no fogo das intenções que ateio e depois não sei apagar... ou melhor, alimentar, porque o que me falta é a lenha da força, não a chuva das lágrimas!...
No peito, guardo-me o melhor...
Consigo até ser sublime, estremosa, forte, corajosa, amada, amante, sábia... mas não sei que força, Vida, minha Vida, me enclausurou tesouro escondido de que não sei a cruz de assinalar, só a cruz de sofrer... arca de riquezas de que não sei sair-me, evadir-me, dar-me por inteiro, SER-ME... Talvez por medo de me achar arca de Pandora, sei lá...
Do peito, só a poesia consigo extrair, através duma fresta clandestina... as palavras que me ditas, o canto que te encantou, minha Vida, numa quietude morrente que me desespera o querer....
O amor, também. A força, essa!...

Vida!!!
Não me deixes ser marasmo!
Não me sejas serpente!...
Não me sejas só no canto, só no vítreo encanto com que me tolhes o olhar!
...(afinal já nem sei que digo, sou eu que te encanto, ou tu me enfeitiçaste a mim?)...
Vida, dá-me a força que preciso!...
...enquanto, querida Vida, for ainda tempo de eu estar VIVA...
...cá dentro deste meu peito!...


P.S. Sabes, esta doeu tanto, que leva lágrimas agarradas...