FRANCISCA CLOTILDE

Francisca Clotilde Barbosa Lima nasceu em São João dos Inhamuns, hoje Tauá, Ceará, aos 19 de outubro de 1862. Filha de João Correia Lima e Ana Maria Castelo Branco. Do sertão dos Inhamuns a família se mudou para a Serra do Baturité e de lá, a menina passou a estudar em Fortaleza, capital da Província, no Colégio Imaculada Conceição, de onde saiu apta para o magistério, segundo nos informa CUNHA (2008:148):

"Deste esboço de uma possível história de vida, sabe-se que nasceu em 1862, no sertão dos Inhamuns e que era de família abastada. A infância foi marcada pelas paisagens do sertão e experiências que se tornaram motivo para composição literária. Ainda no interior, Clotilde cursou o primário provavelmente em escolas caseiras. Na capital matricula-se no Colégio Imaculada Conceição para completar seus conhecimentos, como era o costume entre as meninas da elite ou classe média. Depois, já como professora da Escola Normal participa de acontecimentos significativos da Província. Paralelamente às atividades do magistério, consolidou seu nome na pauta diária da imprensa, expondo-se a comentários de mestres, colegas e alunos. Afinal de contas, por serem raras as mulheres que apareciam no cenário cultural, sua presença no espaço das letras poderia ser motivo de orgulho e exemplo a ser seguido pelas demais."

Em 1884, por concurso público foi nomeada com o título de professora para a Escola Normal de Fortaleza. Concomitantemente ao trabalho de educadora, colaborou na imprensa em verso e em prosa: Cearense, Gazeta do Norte, Pedro II, O Libertador, A Quinzena, A República, Almanaque do Ceará, no Ceará; também na imprensa de outros estados brasileiros, como por exemplo: Almanaque das Senhoras Alagoanas; O Lyrio, de Recife; A Família, de São Paulo e Rio de Janeiro etc. Ao ser demitida da Escola Normal (sua pena incomodava os poderosos) fundou externato próprio que funcionou em Fortaleza, depois em Baturité, de onde continuou colaborando na Imprensa, e por último em Aracati.

Além de poetisa, foi também contista, cronista, jornalista, dramaturga e romancista. Com a filha funda a revista A Estrella:

"Mas, para além e aquém de 1916 – o ano de seu decênio – há muito a ser contado. Ao todo, foram 15 anos de publicação, totalizando quase 200 exemplares. Intenso trabalho entre os anos de 1906 e 1921. Pelas páginas de A Estrella passaram dezenas de mulheres e homens de letras, redigindo textos nos mais variados estilos e formatos, contemplando temas que iam desde a singeleza das flores e da natureza até a “grosseria” com que os homens tratavam as mulheres..." (Idem, p. 97)

Em 1902, Francisca Clotilde publicou o romance A Divorciada. Livro que chocou a sociedade por se tratar de um tema tão antifamiliar. Pioneira no tema “divórcio” na Literatura Brasileira.

A escritora, em 1908 transferiu-se com a família, o externato e a revista A Estrella para a cidade de Aracati, onde passou 27 anos de sua vida dedicados à educação da Zona Jaguaribana. Fundou nesta cidade o Externato Santa Clotilde, cujo educandário (para meninas e meninos) foi considerado um dos melhores colégios da região jaguaribana por se destacar pela pedagogia aplicada, da utilização das artes, sobretudo o teatro nas atividades escolares, além do ensino da língua francesa.

Um dos prováveis motivos pelo qual o público leitor não teve uma boa receptividade da obra pode ter sido por causa do tema que é tratado no romance: o divórcio. A história fora escrita cerca de cinco anos após a mudança de Francisca Clotilde de Fortaleza para Baturité. Podemos dizer que diversas reminiscências evidentes da vida da escritora podem ser encontradas na narrativa, que, muitos consideram quase um livro de memórias, por ter algumas características autobiográficas. Detalhes dispersos e implícitos em algumas passagens do livro são de chamar a atenção do leitor, por causa das coincidências: o casamento, pois Francisca Clotilde se casou muito jovem, como também a personagem Nazaré; os vícios do marido (tanto o da escritora era viciado em jogatina e alcoólatra, como também o marido da personagem); a mudança da cidade grande para o interior; a distância da agitada capital, não querer morar na cidade; o estigma da mulher separada, em uma sociedade machista da época, na qual uma mulher separada do marido era considerada uma mulher sem respeito, quase uma prostituta; e a infelicidade de se perceber solitária e com filhos para criar, sem ajuda de alguém.

O interessante da vida de Francisca Clotilde: ela não sofreu o preconceito de ser uma mulher divorciada em Baturité e Aracati (em ambas localidades ela foi respeitada como mulher e professora). Enquanto que em Fortaleza ela perdeu o cargo de professora e seu educandário fechou após três anos de funcionamento por causa de suas ideias abolicionistas e de igualdade de direitos entre o homem e a mulher. No interior do Ceará, Clotilde implantou sua escola e esta funcionou até a sua morte. Ela era uma professora querida e respeitada pelos moradores. A alta sociedade local consentia que suas crianças deveriam estudar no educandário da professora Francisca Clotilde. A escritora no texto “A Mulher na Política” resgata

episódios bíblicos e históricos nos quais se destacam as figuras femininas: Débora, Judite, Ester, Clotilde, Joana D’Arc, Catharina de Médici, Théroigne de Mericourt, Mme. Roland, Carlota Corday – para embasar sua insatisfação com a colocação da mulher num plano inferior. Mais que isso, se insere na defesa da Liga Feminina, organismo criado para defender a candidatura do Coronel Marcos Franco Rabelo que, em conjunto com outras entidades da sociedade civil, teve papel decisivo na referida derrocada oligárquica (CUNHA, 2008, p.175).

Francisca Clotilde dedicou 53 anos de sua vida ao magistério, 27 deles no município de Aracati (CE), exercendo sua profissão até os últimos dias de sua vida. Faleceu aos 73 anos de um colapso cardíaco, a 8 de dezembro de 1935, em Aracati.

Referências Bibliográficas

ALMEIDA, Luciana Andrade de. A estrella – Francisca Clotilde e literatura feminina em revista no Ceará (1906-1921). Fortaleza: Museu do Ceará / Secretaria da Cultura do Estado do Ceará, 2006.

CLOTILDE, Francisca. A divorciada. 2ª ed. Ceará: Terra Bárbara, 1996.

CUNHA, Cecília Maria. Além do amor e das flores: primeiras escritoras cearenses. Fortaleza: Expressão Gráfica e Editora, 2008.

MOTA, Anamélia Custódio. Francisca Clotilde: uma pioneira da educação e da literatura no Ceará.Gráfica e Editora Canindé, 2007.

OLIVEIRA, Caterina Maria de Saboya. Fortaleza: seis romances, seis visões. Fortaleza: Edições UFC, 2000.