JK: Nũa mão o bisturi e noutra a pena
                 Sérgio Martins Pandolfo*
 
       Celebrou-se ontem, 12 de setembro, os 110 anos de nascimento de Juscelino Kubitschek de Oliveira, um dos maiores, se não o maior, presidente que esta Nação já teve.
     Muito se tem dito, falado ou escrito, sobre a figura proeminente do Juscelino político plural, renovador, reformador, transformador, pioneiro, estadista de proa, mas muito pouco, quase nada mesmo dele se sabe ou fala do médico e escritor profícuo e prolífico que foi. Por isso que vimos, daqui, exaltar estas facetas do grande homem público como médico competente e literato de méritos incontestáveis.
     Juscelino nasceu aos 12/09/1902, no primevo Arraial do Tijuco, atual Diamantina, filho de um caixeiro-viajante e de uma professora primária, responsável por sua instrução elementar. Concluídos os estudos secundários no seminário diocesano local, Nonô - terno apelido familiar – partiu para Belo Horizonte - a nova capital mineira, planejada e traçada havia somente pouco mais de duas décadas pelo consagrado engenheiro-arquiteto parauara Aarão Reis, sobre os lindes topográficos da antiga Curral-d’el-rei - a fim de realizar sonho que anelava desde menino: ser médico e trabalhar sério para a elevação das condições de vida de seu povo.
     Em BH, para manter-se, foi praticante de telegrafista, cargo auferido por concurso público, em 1921. Durante o curso médico, cumprido de 1922 a 1927, desde cedo mostrou excepcional pendor para a cirurgia, logo percebido pela unanimidade de seus colegas de turma, que até lhe cunharam esta quadrinha: “Dois nomes, eu estou certo/Vão pôr este mundo em xeque/No violino, Kubilik/ No bisturi Kubitschek”. Turma que incluía o notável juiz-forano Pedro Nava, “o maior memorialista brasileiro de todos os tempos”, a redizer Drummond, o menestrel de Itabira, amigo e intelectual integrante de sua geração, na mesma Belô de Nonô, ainda acanhada e impregnada de forte atmosfera roceira. 
     Formado, passou a clinicar ativamente na capital mineira, trabalhando também na Santa Casa e no Hospital São Lucas e como assistente de Clínica Cirúrgica e Física Médica da UFMG. Em 1930, sentindo a necessidade de alicerçar seus conhecimentos, partiu para a Europa, tendo em Paris, meca da medicina à época, realizado Curso de Especialização no afamado Serviço de Urologia do Prof. Chevassu e curto, mas subsidioso estágio no velho Hospital Charité, em Berlim. De volta à metrópole convolou núpcias com Sara Luiza Gomes de Lemos. Foi admitido como capitão-médico da Força Pública, na qual chegou a tenente-coronel, tendo assumido a chefia do Serviço de Urologia do Hospital Militar. Atuava ademais como médico da Beneficência da Imprensa Oficial do Estado e em seu consultório particular atendia a crescente e seleta clientela privada. No aceso da revolução constitucionalista de 1932 destacou-se, sobremaneira, servindo nos chamados hospitais de sangue no front da sangrenta batalha, com invulgar destaque.
    No exercício da presidência, a formação médica, de que nunca abdicou, fé-lo prover a implantação da primeira bomba de cobalto para tratamento do câncer no Brasil. Escolhido patrono da Sociedade Brasileira de Urologia.
     No âmbito literário alcançou a imortalidade com a eleição para a Academia Mineira de Letras (1975), deixando obras de grande expressão como monografias, publicações avulsas, artigos (médicos e literários) em revistas e jornais, despachos administrativos, sendo sua composição de maior realce “Meu Caminho para Brasília” (memórias, 3 volumes), mas também “Por que construí Brasília” e “A marcha do amanhecer”. Questões de cunho político obstaram seu ingresso na Academia Brasileira de Letras, em desfavor da literatura pátria. Ganhador do Prêmio “Juca Pato”, mais importante premiação literária nacional (1975).
     Em muitos aspectos Juscelino, nas diversas fases de sua vida, reflete suma parecença com o imortal Luís de Camões, que em versos de sua obra perenal, Os Lusíadas, se autoproclamou um peregrino na defesa da vida e no amanho das letras: “Nũa mão sempre a espada e noutra a pena” (Lusíadas, VII, 79).

     Muito mais teríamos a usufruir desse excepcional brasileiro não fosse a fatalidade de um acidente automobilístico que ceifou sua frutuosa vida, ainda em pleno vigor, em 1976.

Na foto acima JK, capitão médico da Força Pública de MG, no front de batalha em Passa Quatro 

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*Médico e escritor. ABRAMES/SOBRAMES
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Sérgio Pandolfo
Enviado por Sérgio Pandolfo em 14/09/2012
Reeditado em 17/09/2012
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