De: Silvino Potêncio >>> O Pau da Bandeira na Rua do Mourel...

(um conto extraído do Meu Livro “Curriças de Caravelas – Trovas Comentadas”)
 
O Povo de Caravelas,  (Parte II)
 
O povo de Caravelas,
Joga ó “fito” e joga à "malha"; (1)
Deixou ir p’ra Mirandela,
O ouro das “sete talhas”! (2)
 
        -- Diz a lenda muito antiga,
    que tinha no bairro do “mourel”;
-- Um pote de ouro e fina liga,
                   Enterrado... ele está lá, com “mel”!!!.
 
Ali ao pé da Fonte da Mina,
Em domingos ensolarados...
A malha redonda ia e vinha,
E os pinos eram tombados!

(1) são jogos populares dos anos 50-60 que hoje já nem se praticam. Uma vezes porque a diversão hoje é muito diferente mas a mais das vezes porque as Aldeias só teem gente da Terra em algumas semanas do Verão.

(2) ​​conta-se ainda hoje que, nas Fragas do Mourado onde se encontram ainda algumas pedras do Periodo Pré Histórico em forma de Anta, foram encontradas umas 6 ou 7 Talhas de Barro com muitas moedas de ouro. Teóricamente também podem ter sido ali escondidas durante a ocupação Romana pois que na Aldeia ainda temos várias entradas de Minas as quais podem ter sido exploradas também pelos Mouros. Daí a lembrança da Rua do Mourel...  

                                  *****
O Povo da nossa Aldeia, todo sem excepção, no nosso conceito pessoal claro, sempre foi lembrado por nós como uma sociedade convivente e harmoniosa, enquanto visto em um conjunto de pessoas solidárias!,  de Amigos dos seus Amigos, o quanto bastasse
 - Sempre fomos um Povo ordeiro, e cumpridor dos seus deveres cívicos e morais, pelo menos do que eu me lembre.
Desgraças houve, como em tantas outras Aldeias por onde passámos, e glórias também!... Talvez  por obra e Graça dos méritos de cada um.
- Por tudo isso, nós mencionamos aqui o nome de alguns conterrâneos, Filhos de Caravelas,  com todo o respeito e boa  memória daqueles que já lá estão!...
... Certa vez, lá pelo ano de 1955 ou 1956, por alturas da realização da Festa de Caravelas,  estavam lá os homens da Aldeia a abrir um buraco no chão, à entrada da Rua do Mourel, quando nos aproximamos, nós os garotos, que estávamos a brincar ali perto, da borda do buraco... para ver se já estava muito  fundo!?...
- Levado pela curiosidade natural de querer ver o que estaria lá no fundo poço, eu alonguei o pescoço e espreitei lá para dentro, no exacto momento em que o homem que estava a cavar com a “picareta”, desceu ela em cima da minha cabeça e me atingiu a testa.
- Naquilo que foi o movimento do homem a levantar a picareta para mais uma picaretada no chão do buraco, por sinal bem duro, pois só Deus sabe há quantos anos, séculos... por ali se passavam as pessoas, os animais e os carros de bois, enfim,... era preciso força e habilidade para cavar o buraco da Bandeira. (mudava-se de lugar a cada ano) 
O homem, morador do Mourel de quem o nome já não lembro, ele não me viu chegar pelas costas dele, e nos acertou o bico da picareta bem no alto da testa a poucos milímetros da “moleirinha”...
- Momentâneamente, e creio que apenas por alguns segundos eu acho que, de repente me ficou tudo escuro!,... os outros garotos fugiram com medo ao me verem todo ensanguentado...e, o homem, agora totalmente aflito,ele  saiu do outro lado do buraco, e me levantou do chão!, tapou-me o buraco na cabeça com as mãos, mas... O sangue não parava de jorrar da testa!...
Certamente, ele, desesperado por me ver a sangrar, gritou para alguém ir chamar a minha Mãe! que,... a essa altura, provávelmente ela não estava em casa, e sim de lá veio a minha Irmã Maria, toda aflita com um avental que me amarrou em volta da cabeça.
O buraco na Minha cabeça era muito grande, e eu não conseguia segurar o sangue!... mesmo assim ainda corri até perto da nossa casa e fui me esconder debaixo duma figueira,... onde a minha irmã a   “ Ti Maria Bica”,  me foi buscar todo encharcado de sangue, já práticamente desacordado.
- Era maior o medo de que a “Ti Julheta” me batesse, por ter fugido de casa para ir “p’ró Terreiro” a brincar,  do que do buraco na cabeça.
Assim que eu descansei um bocado debaixo da figueira ali perto da fonte do Terreiro e quando me equilibrei nas pernas, fuji lá para o cimo do povo, com medo de apanhar algumas lambadas, coisa que jamais a minha Mãe o fez... e certamente não o faria se ali estivésse.
- Horas mais tarde alguém me encontrou na Eira do Cimo do Povo e me trouxe até à varanda da nossa casa onde me lavaram numa bacia de esmalte, com muita água. Depois a minha mãe me fez um curativo com umas “mézinhas caseiras” que ela sabia fazer, e uns dias depois já estava na rua a pular e a brincar como sempre. 
- Fizeram-me um tipo de atadura com uma pomada por debaixo, na cabeça raspada,  e assim me ficou a marca na testa daquele que foi o meu atrevimento de ir  a espreitar no fundo do buraco da bandeira,... a ver se lá aparecia um tal  "Pote de Ouro" que, segundo diz a lenda;...  ali estaria enterrado desde o tempo dos Mouros, que deram origem ao nome do bairro do mesmo nome, o “Mourel”!... em Caravelas de Mirandela.
 

 Nota do Autor: a foto que aparece aqui agora mostra a tal cicatriz!
Silvino Potêncio
Enviado por Silvino Potêncio em 25/03/2015
Reeditado em 22/03/2018
Código do texto: T5183011
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