Belarmino Ferreira Lins (PARTE VII)

A CHEGADA DE BELINHO EM FONTE BOA

Passava-se das 23 horas do dia 07 de janeiro de 1907, quando a embarcação Cruzeiro do Sul, apinhada de mercadoria, redes e gente, aportou na vila de Fonte Boa. Anos depois, para Belarmino esse dia se tornou “especial”, pois chancelou em seu peito o timbre de uma data marcada no calendário perene de suas lembranças.

Assim, enquanto o orvalho da noite desprendia suas gotículas de sereno no ar, ainda assustado com a imensidão de tudo aquilo que suas retinas contemplavam, entre uma leva e outra de nordestinos, Belinho desembarcou em Fonte Boa. Ao descer a rampa do barco, o jovem arigó portava à mão apenas uma amiúde mala, cujo interior se amontoavam poucas mudas de roupa e outros pertences pessoais. Contudo, dentro de si, no rosário da força que o guiava, trazia muitos sonhos, esperança e sentimento de fé.

Na ilharga do ancoradouro, a espera, alguns parentes do Cel. Siqueira Cavalcanti, que por recomendações expressas o acolheram e o levaram até o “barracão” de propriedade da família. Lá, inicialmente, fixou residência. No outro dia, cumprindo o rito formal, Belinho foi apresentado a outro coronel, o sr. José Amaro Coelho Cintra, conterrâneo, que comandava a administração municipal. Dele, há razoáveis referências, inclusive, as muitas idas a terra natal, bem como de ter sido um homem de posses e prestígio, tanto em Fonte Boa, quanto em Milagres. Amaro Cintra, quando viajava a bordo dos vapores, certamente desfrutava da primeira classe, na companhia do som do piano e todo o luxo disponível. E, para atravessar o sertão, de Fortaleza até a vila de Milagres, provavelmente dispunha de carroças vistosas, ou de um alazão vigoroso para seguir viagem.

Quando Belinho chegou em Fonte Boa, a vila era iluminada à base de acetileno, e a avenida principal, conforme notas diversas, se fazia bem arborizada, correndo nas laterais pequenos jardins que embelezavam a cidade. Rodolpho Índio de Maués, que era o delegado da sede, e o senhor Joaquim Freire de Lima, irmão da pequenita Zulmira, logo se juntaram ao rol de suas amizades.

Dias depois de estabelecido, escreveu a primeira carta a sua mãe. Nela detalhava seu espanto pela grandeza da selva e das águas existentes na região, um cenário tão diferente do ambiente antes vivido. Ao contrário das vastidões desérticas do seu querido e saudoso sertão nordestino, aqui se opunha a imensurável hileia. E, diferente dos riachos e córregos de lá, na região amazônica se espraiavam os paranás, os igarapés, igapós, rios abarrotados de águas, matupás, peixes e animais sem fim. A fartura de comida e a abundância de terras férteis dispostas nas várzeas, da mesma forma, faziam parte das crônicas familiares. De igual modo escrevia a respeito das doenças tropicais, e sobre a falta que sentia do cariri cearense, este, companheiro fiel de suas angústias e alegrias de menino.

Seu primeiro aniversário longe do berço familiar foi marcado por um revés de emoções tomadas de tristeza, saudade e solidão; sensações, bem sabemos, que inspiram os poetas. Tais sentimentos, por vezes, foram marcas timbradas nas cartas escritas à querida genitora. Do outro lado, sua mãe, em resposta, rogava para que mantivesse a fé em Deus, São José e Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, o encorajando sempre, ao dizer, que os frutos de seu trabalho logo deveriam prosperar, e assim, dias melhores não tardariam trazer a luz e a força necessária para que pudesse vencer a desesperança e a tristeza. Também clamava por paciência e tolerância, uma vez que, após as procelas do tempo, haveria de surgir a sua frente os caminhos da bonança. E, quando esse momento chegasse, colheria os frutos das vitórias.

LINS, Eylan Manoel da Silva. OS PIONEIROS: raízes da Família Lins no Município de Fonte Boa, 2023

Eylan Lins
Enviado por Eylan Lins em 10/10/2023
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