Mensagens Orkutianas

P: ainda sobre os sentidos da pontuação, as reticências bem podem nos sugerir o aproximar-se rápido de certas curvas acentuadas, onde será preciso a intervenção das vírgulas e pontos e vírgulas à redução de nossas interrogações ao exato estabelecimento dos travessões, que nos garantirão aquele deleite sereno de interrogativas manhãs entre aspas. Deixando de lado brincadeiras, é bom mesmo exercitar o relacionamento virtual. Por aqui se pode realizar muita coisa, fazer bons contatos e amizades. O negócio é ser criativo e ter algo a dizer, o que nem sempre é fácil quando, às vezes, o melhor é calar. Lá vou eu querendo filosofar. Mas é assim mesmo: afinal, ninguém é perfeito. Continuemos. Beijos.

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A: Muito obrigado por me diminuir. Eu já vinha me sentindo pra baixo, agora, graças às imagens que você me mandou por e-mail, fui atirado pra cima a ver de fato toda minha insignificância! Vou me suicidar, finalmente, como sempre desejei; sair desse vai não vai sei lá pra quê, sem saber quem vem lá ou não vem. Brincadeira a parte, adorei o e-mail. Acho que foi você quem me mandou aquele que a gente sai do universo e depois volta até entrar no interior dos átomos de uma folha. Muito boas lembranças tais imagens nos trazem! Hoje dei uma oficina de percussão numa escola municipal e usei todos os recursos disponíveis a fazer com que os interessados apreendessem a musicalidade de todos os movimentos e sons existentes em volta deles; pedi para que percebessem a harmonia oculta nos ruídos do mundo e que se esforçassem para manter o silêncio profundo à atenção, sendo o silêncio fecunda essência da música em seu vir a ser sonoro, melódico, harmônico, tendo o repouso como também outra essência das manifestações de seus vários ritmos. Aquietar a mente e ouvir a música do mundo. Primeiro exercício. Grande abraço. Encontramo-nos de novo em breve.

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“Certa manhã, devo escrever urgentemente uma carta ‘importante’ – da qual depende o sucesso de certo empreendimento; em vez disso escrevo uma carta de amor – que não envio. Abandono alegremente tarefas desinteressantes, escrúpulos razoáveis, condutas reativas, impostas pelo mundo, em benefício de uma tarefa inútil, vinda de um Dever remarcável: o Dever amoroso. Faço discretamente coisas loucas; sou a única testemunha da minha loucura. O que o amor descobre em mim é a energia. Tudo que faço tem um sentido (posso então viver, sem me queixar), mas esse sentido é uma finalidade inatingível; é somente o sentido da minha força. As inflexões dolentes, culpadas, tristes, todo o relativo da minha vida é revirado. (...) Estou, portanto só com minha força, condenado à minha própria finalidade”. Roland Barthes em “Fragmentos de um discurso amoroso”. Palavras que faço minhas.

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Caro X: Notei que você me enviou uma série de e-mails nos últimos dias. Infelizmente, uma das razões de nossa vontade de morrer tem fundamento: perdemo-nos no caminho da construção de nossos paraísos e há muitos perversos no mundo. Mas, serão perversos apenas simples ignorantes e, como queria Jesus, portanto, dignos de compreensão e perdão? Há muitos que exercitam as artes do mal a nos enviar vírus devastadores, por exemplo, que aniquilam parte considerável dos registros de nossa história pessoal, arquivados em nossos micros. Por isso não atendi prontamente ao seu apelo, pela forma impessoal – (@%@%@*&...) – como você se apresentou em meu e-mail. Apesar de também às vezes considerar inútil guardar minha história pessoal (já que, no fim, como nossos primeiríssimos pais, irmãos e suas histórias pessoais, tudo virará pó), seu problema é complicado resolver porque é um problema de suas relações íntimas, essenciais, subjetivas, pessoais com o mundo. O que você considera, pode considerar ou não valioso no meio de toda “falta de sentido” da presença de tudo no vazio determinará sua permanência nessa imensa e inescapável fábrica da Criação chamada “Vida”. Ou, por outro lado, lhe estimulará a encontrar uma forma eficiente e indolor de “voltar” para o vazio de onde, em minha modesta opinião, muitos nunca deveriam ter eclodido. Entretanto, pus as aspas na palavra voltar porque, pessoalmente, não acredito que possamos “voltar” a lugar algum. Se você procurar sentir bem, onde ou quando estiver que estejamos, verá que somente vamos para frente; mesmo que, algumas vezes, precisemos estar caminhando para trás, e que somente será assim ao impulso de novos saltos para o futuro. Penso que a morte não é nada e que, por isso, ela não sucinta em você (ou em mim) grandes dificuldades de enfrentamento. Não sei sobre o que exatamente lhe motivou o desejo de “cair fora da Vida”, mas creio que nosso maior problema a motivações existenciais é compreender a Vida mesma, Sua insistência em Se fazer presente no vazio, através de tudo e de nós. Porque entre uma de Suas infinitas manifestações e outras – das quais, ao que o Tudo indica, não podemos nos dar ao luxo de escapar – temos que enfrentar nossa própria ignorância e nossas próprias dores, sempre em relações com a ignorância e as dores dos outros, das dores que consciente ou inconscientemente possam ainda nos provocar, ou nós a eles, até que possamos sentir que, de fato, temos usufruído mais prazeres do que dores durante nossa estada neste mundo. Apesar de nossos desejos de ajudar os próximos (hoje, também com a ajuda da Internet, cada vez mais próximos), no fim (e por princípios) só podemos ser íntimos agentes de nós próprios no enfrentamento de nossas dores, resultados de nosso estado de espírito (ou, mais acertadamente considerado, do estado daquilo que chamamos Espírito em nós) e em nossas relações com o mundo. Poderia ainda escrever muitas coisas cuja intenção seria convencê-lo (como convenci a mim) de que, como muitos, você precisa olhar-se no espelho, bem de perto, a procurar ver refletido em seus olhos a janela de seu quarto, ou a porta de sua sala por onde o mundo também entra e sai. Porque então talvez você, através dos cinco sentidos que nos auxiliam a sensação da Vida, perceba-se também existente à tarefa de, como “ínfimos” partícipes da Criação, gerar outros sentidos melhores à administração da sua vida e, por tabela, da Vida de tudo o que passou a existir no vazio. Grande abraço.

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S: tens razões que teu coração reconhece.

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C: na verdade, Darwin deveria ter considerado que seu nariz, assim como outras "imperfeições" existentes no mundo, estava em fase de evolução, uma vez que a imensa força criativa que tudo gera, também ainda em evolução, faz Seus experimentos engendrando-Se em infinitas formas de seres à conquista da excelência de Suas criações a representações de toda Sua perfeição. Acredite: é assim; assim é. Grande abraço.

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L: não comparo forças. Digo apenas que os fortes são fortes e os fracos são fracos. Mas, para perceber e compreender onde estão essenciais fraquezas e fortalezas, há uma breve história que certo mestre Ninja conta aos seus discípulos, para conscientizá-los sobre a questão: um lutador superior não luta com um inferior porque irá derrotá-lo. Um inferior não luta com um superior: será derrotado. E se os dois compreendem isto, nunca haverá luta entre eles. Uma verdadeiramente santa semana pra você e sua família: que todos possamos refletir sobre a necessidade do jejum ou sobre como, com a ajuda de Deus, desenvolver a vontade de não ter certas vontades e o desejo de querer o que Deus quer que mais substancialmente desejemos: Sua graciosa presença em nós a iluminar nossos corações sombrios. Grande abraço.

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A: de Norte ao Sul dos mundos, passando por seus Lestes e Oestes, divinamente orientados, que sempre vivam artistas entre nós. Grande abraço.

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Caro B: você não faz, em absoluto, o "trabalho sujo" - a menos que tenhamos considerado inversões de valores capazes de por novamente “o mundo de cabeça para baixo". Nada é mais digno do que lutar por exemplos de integridade Humana, de solidariedade, de Amor, de Justiça, o que requer daqueles capazes de produzi-la generosas doses de obstinação a práticas dos melhores verbos tornados carnes. Mas, por outro lado, a história mostra o que acontece àqueles que erguem bandeiras onde estão estampados os próprios rostos: podem chegar à glória do reconhecimento e gozo de suas benesses inevitáveis, mas frequentemente são perseguidos e, quando não assassinados, forçados a qualquer tipo de exílio que, no fim, inevitavelmente os leva à tristeza, a solidão e ao abandono. Hoje, como nunca, é fácil eliminar uma pessoa (sem que seja necessariamente preciso matar-lhe o corpo), mas não as idéias que motivam as pessoas a reagirem a injustiças e reconquistarem o que lhes é devido. O problema é saber exatamente o que nos é devido, e há muitos desejos e necessidades historicamente inventadas, engendradas por um complexo que nos quer tão transitórios e descartáveis como os valores que produzem pra nos seduzir e cegar. Daí minha preocupação em considerar os "benefícios" que nossos políticos têm - ou usufruem - graças a suas posições "privilegiadas" na sociedade, seus poderes e influências a determinação de nossos destinos. Particularmente, por ter conhecido considerável parte representativa de outras realidades sociais ao redor do mundo – entre as quais políticos de altos escalões de governos internacionais (entre eles um primo colecionador de títulos, através de quem parte desse mundo me chegou), perdi o interesse pela conquista de certos valores e posições sociais cultuados pela maioria dos que sonham pisar em tapetes vermelhos. Por tabela, não creio necessário estar em guerras para ajudar outros à conquista da possibilidade de que possam pisar neles. Sei que você vai dizer que não se trata de lutar por tapetes vermelhos e diamantes, mas apenas por dignidade e pelo “pão de cada dia”, um direito de todos; e eu vou dizer que também a história nos mostra que a fome dos “homens” não tem limites. Além disso, como ainda no passado, nosso atual mundo político é ainda estranhamente perverso. Neste universo, sou um incompetente, absolutamente incapaz de comungar das motivações dos que ambicionam participar dele.

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C: em meus pensamentos e lembranças, revejo momentos de nossa infância em reuniões na casa de nossos avós, quando vocês chegavam de passagem vindo de algum lugar distante. Quando eu ia a Recife, ficava mais na casa de A. do que entre vocês. Fora o fato de que tia B. era a irmã mais velha de nossos pais – a companhia de quem ele achava que devia mandar os filhos, um tanto para “dar trabalho” à tia B. (já que a assistência a vovô ficara sob a responsabilidade de papai), A. sempre fora metido com Arte, provavelmente a coisa de que mais gosto na vida, e muito me influenciou no desenvolvimento de alguns de meus talentos de família. O fato é que visitei A. há pouco tempo atrás, como sempre fiz ao ir a Recife – tendo ido visitar algumas vezes também tia C. (referência de contato entre nós) e D. (outra de minhas maravilhosas primas por quem, na verdade, desde criança, sempre fui apaixonado) – mas quase nada recebi a visita dele quando por essas bandas; ou de vocês, que resolveram ir para mais longe ainda. Para não dizer que não fiquei com meus queridos primos por perto, primos e primas do lado materno suprimiram minhas carências primeiras. Mas vocês estavam certos: nada como ter disposições de conhecer o mundo, arrastar nossas raízes por novas terras na esperança de que lá também possamos dar bons frutos. E foi o que vocês fizeram. Abraços.

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E: grata surpresa encontrar um e-mail seu depois de algum tempo sem recebê-los. Às vezes não tenho certeza se a turma recebe minhas mensagens, já que quase ninguém me envia um e-mail de confirmação, de agradecimento ou crítica por elas – como procuro fazer. O livro sobre Joana d’Arc está em andamento. Tenho sessenta e tantas páginas escritas e gostaria de escrever trezentos, embora eu comece a sentir que talvez seja melhor terminar a história com minhas habituais cem. Quanto à questão sobre se ainda temos uma "Santa" Inquisição, tenho certeza de que nunca a tivemos. Se a tivéssemos tido, se verdadeiramente Santa tivesse sido, todos os que foram por ela investigados e julgados teriam tido seus pecados perdoados. Grande abraço e sucesso. Sempre.

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I: penso saber o que você pensa sobre a Vida e a morte e haverá de me perdoar ausência de certos pêsames. Particularmente, cheguei à conclusão de que a morte não existe e que não mais existiremos depois dela. A única força realmente significativa, e que também nos dá a possibilidade de nos significar, é a Vida (eterna força de quem ou do quê ninguém escapa), junto com Suas alegrias e dores, únicas realidades que podemos sentir e saber existir. Lamento pela dor momentânea da perda que sentes. Infelizmente, ainda sentiremos muitas dores (e, felizmente, também muitas alegrias), e ainda sofreremos muitas perdas. Até lá, façamos nosso exercício de perda de ignorâncias e sigamos nos acreditando importantes nesta luta pela construção de um mundo melhor para as vidas que continuarão depois que não mais estivermos aqui. Grande abraço.

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J: obrigado por seu e-mail. Em agradecimento a sua divina preocupação, mando-lhe o resultado do que creio ter sido instrumento capaz de servir a Deus a falar sobre Si mesmo para um grupo de pessoas em certa época de minha vida – uma ambição acalentada desde a frustração de não ter tido a disciplina necessária para me tornar um monge ou um pastor. Grande abraço.

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J: enquanto em alguns locais do globo o mar avança, noutros recua. Uma amiga mora numa praia onde isto aconteceu. Ela diz que não havia a extensão de terra seca, com algumas piscinas naturais, onde ela mora há alguns anos e, hoje, existe. Quanto a nossas participações nos desequilíbrios do mundo, infelizmente não vejo como conseguiremos superar ignorâncias. Métodos de ensino trabalham para manter ou intensificar o status qüo e campanhas humanistas, naturalistas, ecológicas e semelhantes (que existem a partir dos poucos homens e mulheres de boa vontade no mundo), tem surtido pouco efeito. Mas, estou (ou estamos) entre aqueles que ainda se acreditam capazes de “mudar o mundo” para melhor a fim de podermos nos reunir em ilhas de boas convivências, antes do Apocalipse. Grande abraço.

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J: a bem da verdade, existem muitas questões intrigantes sobre assuntos como "aquecimento global" e "falta d'água" no planeta. Quando minha esposa observa que, em Manaíra (uma de nossas praias), o mar está invadindo o asfalto, conto a ela que desde criança vejo esse espetáculo, graças aos ataques de ressaca de nosso mar, e que naquela época o mar chegava a invadir a rua, o que não acontece mais. É certo que em muito as "civilizações" contribuíram e contribuem para a geração de certas dificuldades planetárias, mas nosso planeta tem sua própria vida e seus círculos de nascimentos, prazeres, dores, mortes e renascimentos, como tudo o que vive. É muita pretensão nossa considerar que somos "os principais" responsáveis por seus mal-estares - embora sejamos diretamente responsáveis por quase todos os nossos. Grande abraço.

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K: em meus parcos 49 anos de vida, a contar com as experiências de vidas registradas nos anais (e nos anus) da História, percebi que não se pode contar uma verdadeira história pelo simples fato de que ninguém pode apreender, na íntegra, as emoções e os vários momentos e circunstâncias que desenvolvem seus muitos capítulos. Qualquer historiador, a luz do que encontrou em suas pesquisas, se deparará com o problema de fazer suas interpretações dos fatos. Assim, estamos condenados a crer ou não crer naquilo que nos conta a Literatura, de onde personagens reconhecidamente fictícios às vezes nos parecem mais reais e necessários do que muitos dos que viveram ou ainda vivem sobre este mundo.

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M: obrigado por seu retorno. Não acho que ainda estejamos no caos, embora o caos tenha sem dúvida sido o fundamento promotor dos “organogramas” (a bem da Burocracia) que nos constituem, como a tudo. Como nos lembra sempre o Poeta, "há multidões dentro de mim", e as tribos que nos formaram e deformaram pouco a pouco desaparecerão a dar lugar ao que outras tribos considerarão a necessidade de construir uma civilização que seja uma representação do “império do Sol".

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M: apesar do aparente contra-senso, o pastor Edir Macedo (entre outros) age com coerência quando constrói o que constrói sobre a Terra. A posse do ouro (e tudo o que ele representa em termos de “poder mundano”) tem sido razão de contendas e submissões de todos os tipos. Para também demonstrar Sua potência e Sua verdadeira riqueza, através das histórias da Bíblia, entre outros livros sagrados, Deus tem dito que as “ruas” e demais construções de Seu reino que, segundo Jesus Cristo, deve ser estabelecido “na Terra como no céu”, são feitas com os mais nobres e raros materiais encontrados neste planeta, e em outros – os quais, entre outros nunca dantes imaginados, Ele possui em abundância em Seu grandioso universo, ao mesmo tempo em que nos dá motivos para desprezá-los como “lixo”. Guardadas as devidas proporções, como faz Deus (que, segundo a NASA, pôs em Seu infinito espaço cósmico um descomunal astro celeste constituído tão somente pelo mais puro diamante), também faz o pastor Edir Macedo a demonstrar o grande estoque de materiais nobres de que dispõe graças à doação dos que lhe são fiéis à construção de suas ainda modestas réplicas dos impressionantes castelos de diamantes de um milhão de torres de jade existentes nos infinitos reinos do Criador. Grande abraço.

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S: Sempre pensei em realizar um trabalho em parceria com um grande artista, como Flávio Tavares fez com Sergio Lucena na pintura, como fizeram tantos outros artistas daqui e de outras bandas da terra em muitas outras modalidades de expressão das artes. Quase cheguei a me apresentar junto ao coral que compôs o espetáculo "Os Imperdoáveis", eclodido de sua parceria com o maestro Eli Ery Moura, tendo participado da maioria dos ensaios às apresentações. Nnão me lembro exatamente porque não cheguei a me apresentar, já que Eli Ery classificou minha afinação vocal dizendo mesmo que seria capaz de cantar como barítono e tenor. Na maioria dos casos, estou mais disposto a participar de trabalhos de amigos do que eles dos meus. Entendo que existam certas limitações e muitos compromissos, mas, mesmo assim, ainda tento uma parceria a construir um trabalho. Aqui, então, quero convidá-lo a dividir comigo a criação de meu texto sobre as relações da vampira Charlet com a santa Joana d’Arc. Senão isso, gostaria que você escrevesse um texto crítico sobre a obra, e embora você seja uma referência importante no âmbito da produção artística paraibana, brasileira, provavelmente internacional (sendo sem dúvida um grande ganho para mim tê-lo inserido numa de minhas produções), confesso que meu interesse maior é saber qual a leitura crítica que você faz do texto. E você poderá fazer isso (se puder e se quiser) se pondo no lugar do personagem Auguste Bonnard, o qual deverá fazer as considerações finais sobre a obra que recebeu a pedido do irmão Pierre Renoir. Uma segunda etapa da produção da obra (mesmo que ela me custe ainda alguns meses, ou mesmo anos de trabalho) será traduzi-la para o francês. Tenho amigos na França interessados na obra. Espero poder contar com sua valiosa participação. Se não, vou entender. Em anexo, segue a história (ainda por concluir-se). Grande abraço.

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W: Muito obrigado, ou melhor, muitas graças a você pelo envio de seu comentário ao meu texto. Bom saber que Trovão anda investindo pra valer a desenvolver seu talento de compositor e intérprete. Quanto ao surgimento dos artistas, sem eles não há sentido para a imaginação, as sensações e as idéias de formar novos mundos, identidades, deuses, culturas. Com o educador indo-europeu Krishnamurti aprendi que o sentido da vida é viver. Assim, os sentidos de nossas vidas nos foram sugeridos por grandes místicos-artistas-filósofos-cientistas, que nos legaram o que somos e o que, além de carnes sobre ossos, ainda haveremos de ser. Grande abraço.

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H: certo dia, um arrogante discípulo, cansado de estar submetido às ordenanças de seu mestre, disse-lhe: “Pensas que tudo sabes a me ordenar: ‘faz isto, faz aquilo’? Enquanto ias com os cajus, eu vinha com as castanhas”. “É”, disse-lhe então o mestre, com um leve sorriso nos lábios: “Mas ainda ignoras o fato de que somos o Cajueiro”. Abraços.

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N: os assuntos que envolvem as lutas entre os ideais da igreja cristã no combate das chamadas “riquezas do mundo”, e seu secularmente imperial poder de sedução, sempre causarão muitas polêmicas. Mas, a bem da Verdade, os que contra-argumentam em favor da diversificação cultural e “livre” usufruto das “riquezas do mundo” nada sabem (ou querem saber, por razões várias) sobre certos necessários princípios de origem, sentido e identidade essencial defendidos por aqueles que, quer vinculados a organizações religiosas quer não, advogam a existência daquela infinita dimensão da Vida que tudo unifica. Quanto à questão específica sobre a tolerância da Igreja com os valores homossexuais, em seu argumento “Contra a homofobia”, Amador Ribeiro Neto escreve que “as igrejas sempre andaram em marcha a ré no curso da História”. Devo esclarecer que a expressão “princípios” diz respeito exatamente ao que quer dizer: porque ir “para trás”, a considerar certas manifestações de civilidade em certos tempos da História, poderá significar consideráveis avanços. O Princípio da Vida, em suas várias manifestações orgânicas e culturais, fundamenta-se em determinados princípios que, depois de séculos e séculos de experimentações diversas, mostram-se tão atuais quanto foram desde “o Princípio” que representam. Se as igrejas “andam em marcha ré”, assim consideradas a partir das observações sobre o que pensam e fazem muitos de seus maus representantes, é porque o que de substancialmente melhor se desenvolveu em termos de conhecimentos, sobre nós mesmos e nossas relações ainda insuficientes, continua a confirmar os efeitos nefastos da grande maioria dos resultados daquilo que, “heréticos”, fazemos por nossa própria conta.

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D: obrigado pelas informações. Não gosto de dar má notícia, mas você já soube do falecimento de M., filha de P.? Creio ter feito um pouco para ajudá-la (embora não mereça nada a mais por isso), mas o caso dela estava complicado e requeria maiores atenções e investimentos por parte de muita gente, não apenas de P., que tem vivido basicamente motivado por tudo aquilo em que bravamente acredita. Infelizmente, a despeito dos muitos vivos que solicitam atenções, temos dedicado maiores cuidados àqueles que já morreram. Mas sei o quanto nossos próximos mais próximos (incluindo nós mesmos) já requerem de nós constantes atenções e cuidados. Mas acredito na potência da Vida, no fato de que Ela esteve e estará sempre presente, e somente a promover alegrias e, infelizmente, também certas dores. Porque não saberemos de nossa própria morte. E embora provavelmente Mayra – como todos nós – não possa se livrar da Vida, Ela “termina” sempre a nos livrar, enfim, de Suas dores. Que procuremos viver Suas alegrias, então. E que perdoemos os ignorantes; e os impotentes.

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D: como em todos os setores da produção industrial, a Arte está a serviço da reprodução das idéias e de uma de suas conseqüências: o capital. Creio que realizar filmes com uma superprodução é sonho de todo cineasta alternativo. Entrar no mercado exige de nós mais do que simplesmente produzir filmes para diversão: é aproveitar bem as possibilidades da criação, da Arte e da diversão para falar de coisas substanciais. Todos pensam que Disney sempre "fez filmes para crianças" e que a PIXAR é apenas um seu apêndice. Poucos filmes “para adultos” me falaram tanto quanto o filme de animação “Os incríveis”, ou “Procurando Nemo”. O fato é que, com exagerada criatividade e alta tecnologia, pode-se criar todo um universo de idéias, valores e formas de novos mundos. Infelizmente, não somos nós, brasileiros, que comemoramos cem anos de produção de filmes. O chamado "cinema de arte" (geralmente europeu, embora haja bons exemplos entre a cinematografia norte-americana – como “Beleza Americana”, por exemplo) deveria ser melhor classificado, já que, para mim, todo filme é uma obra de arte . Se de boa ou de má qualidade, se “para o mercado” ou “pela Arte”, são outros papos, tendo eu em Woody Alen um dos que melhor souberam aproveitar a fusão entre Filosofia, Psicanálise, crítica de costumes e diversão à feitura de seus filmes.

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Z: É cômodo, e pode até ser divertido ser contra tudo; mas chega um momento em que você tem que ser a favor de alguma coisa.

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T: "Eis aí o ápice da fé", disse Lutero: "acreditar que Deus, que salva tão pouco e tantos condena, é misericordioso; que Ele é justo, embora, a seu bel-prazer, nos tenha necessariamente condenado à danação, de modo que parece comprazer-se na tortura dos miseráveis e ser mais merecedor de ódio que de amor. Se, por um esforço da razão, eu pudesse conceber o modo como Deus, que manifesta tanta cólera e tanta aspereza, pode ser misericordioso e justo, não haveria necessidade da fé".

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G: aprendi sobre Nietzsche com meu pai, que sempre me lembrava o filósofo “louco, agarrado a um burro em fins de seus dias a chamá-lo ‘meu irmão’". Mas há muito a pensar com ele, que terminou a ensinar a muitos a repudiá-lo por sua ousadia de dizer pequenas, grandes e incômodas verdades. Grande abraço.

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A: “Ninguém pode ser desleal a algo que tem dado conteúdo, significado e objetivo a nossas vidas. Tudo isso não seria possível se não fosse direcionado por um grande comando. Nenhum dirigente nos deu esse comando, mas sim Deus, que criou a nossa nação”.

Fragmento de um discurso de Adolf Hitler

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C: entre Deus e as nobres artes, obras que Ele nos possibilitou exprimir (e, em horas de transpiração e necessidades, também espremer), a Música tem sido nossa guia e nossa mestra. O que dizer do exemplo de todos aqueles tons semibreves e, finalmente, tornados breves que, compactuando harmonias e silêncios, nos possibilitam construir sinfonias? Lembremos o exemplo da música, pois, e nos tornemos também grandes harmonias de nós mesmos.

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R: obrigado pelo e-mail. Tenho algumas meras equivocadas opiniões sobre o valor da vida de um feto, mas reconheço que, entre os valiosos, um grão de areia contém um universo a ser preservado. Existem muitos tempos de vidas, e tempos e vidas na eternidade, além de espaço de sobra no nada para que a Vida prossiga Sua jornada gigantesca e Seu desejo incompreensível de permanecer para sempre. Quanto a nós, descobri que não podemos saber sobre a morte quando morrermos, e então somente a Vida terá sentido para nós. Um dia, de fato, Ela finalmente existirá sem sofrimentos. Grande abraço.

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R: tenho 49 anos hoje e sou o resultado de tudo o que vivi. Compreendo que devemos ser perseverantes a realização de tudo o que tem nos sugerido o Bem, mas, a despeito de que ainda hoje tente ser, ainda não sou o “santo” que gostaria. Numa conversa ontem com minha esposa - que apenas me conhece há 15 anos, não sabendo, portanto, o que me faz às vezes demonstrar também ser "um demônio" (e sem que saiba o que de fato seja um) - considerando meu "temperamento explosivo", ela reconheceu o quanto tenho exercitado a virtude da polidez. Acima de tudo, entretanto, considero fundamental a realização prática do maior Bem em todas as instâncias da Vida. E por isso agradeço àqueles que, como eu, compreendem serem produtos de constantes metamorfoses ao me concederem o perdão por, outra vez, eu ter demonstrado ser quem não quero a continuidade de tentar ser quem devo. Grande abraço.

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V: na verdade, já deveria ter ido à Natal, como recentemente tive oportunidade de ir a São Paulo. Felizmente não estava naquele vôo que, depois de passar pelo inferno, levou para o céu aquele povo todo. Enquanto continuamos por aqui, temos que acreditar no futuro e que ele será melhor, mesmo que a morte esteja em nosso encalço. É ainda do que trata minha exposição "Sombras que passam", em homenagem aos mais de 400 anos de existência da Cidade de João Pessoa e àquelas que, um dia, passaram por aqui – entre eles, minha avó, Clotilde de Noronha Picado, de quem meu pai e eu herdamos o gosto pela Literatura. Como Augusto dos Anjos, ela escreveu um único livro. Ela e meu avô paterno são as partes potiguares da família. Graças a isso, devo ter passe livre na ilha de Fernando de Noronha, já que, graças a meu nome familiar, por direitos hereditários, a ilha me pertence.

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J: "produção de vento em popa" é uma boa definição de como as coisas estão indo, mesmo porque, como nos lembrou Cazuza, o tempo não pára, sendo os artistas aqueles um tanto obcecados, possuídos, melhor dizendo, pela vontade de participar do fabuloso jogo da criação instituído por Aquele que sopra aos movimentos dos ventos de proa do mundo. Beijos.

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"Não foi por falta de vontade que me abstive de escrever-vos, pois, na verdade, vos desejo todo o bem; mas porque me pareceu que já se disse o suficiente para efetuar tudo o que é necessário, e o que falta (se é que falta mesmo alguma coisa) não é o escrever nem o falar – do que, de ordinário, há mais que o necessário – senão o silêncio e o trabalho. Pois ao mesmo tempo que o falar distrai, o silêncio e o trabalho recolhem os pensamentos e fortalecem o espírito. Por conseguinte, assim que uma pessoa compreende o que lhe foi dito para seu bem, já não lhe é preciso ouvir nem discutir, senão pôr-se com seriedade a praticar o que aprendeu com o silêncio e a atenção". Dito por São João da Cruz.