Carta filosófica

Caro Mário

Pensando um pouco em nossas conversas e rememorando alguma delas, descubro que existe em nós uma zona em nossas mentes que nos é desconhecida que chamamos de subconsciente, e uma outra zona lúcida que é nossa manifestação consciente. Além disso, entrevejo uma terceira zona a do superconsciente, em que tudo são expectativas, que funciona como um prelúdio do que será o amanhã: fase que funciona em nossos sentir como pressentimento e que se desenvolve nas causas que atuam no nosso presente.

Esta zona caracteriza-se por colocar a todos que a visitam em um estado de sincronismo inacreditável, na medida que todo o Cogito vivenciado pelo espírito humano acaba por aflorar de uma só vez, como um rio deságua na sua foz suas águas, assim também este Cogito converge, para um só ponto todo fluxo do seu tempo constituído dentro da experiência empírica da existência do ser. Desta forma, é possível imaginar o tempo futuro, e o imaginar diante do sincronismo que se vivencia, se tornar o presente do tempo momentâneo que se experimenta.

Em outras palavras, assim como ocorre tão corriqueiramente entre pessoas que imaginam algum conto fictício, tais como: romances, ficções científicas, novelas, contos, estórias e outras formas mais de literaturas. Da mesma forma, devido a este estado superconsciente pleno de sincronicidade, alguém de posse desta faculdade, pode estar imaginando perfeitamente o tempo que está se realizando.

Minerando no subconsciente, acharemos todo o nosso passado que ressurge nos instintos, nas tendências, nas simpatias e antipatias. Qual outra atividade poderia nos legar este diamante, senão “nosso” passado? Assim existem zonas ainda mais profundas, as dos instintos mais estáveis, onde se agitam os impulsos fundamentais da vida, tal como foi definido em suas fases mais distantes, onde a luta pela sobrevivência era uma constante. Instintos como a conservação, a defesa, a reprodução, que por vezes explodem de inopino em nossa consciência, que nos revela uma zona de mistério que desconhecemos, e que progride independentemente de seu conhecimento ou vontade. (Por exemplo: o instinto do amor que explode na juventude). Porque tudo o que existe traz escrito em si o absoluto do próprio ser, ou seja, cada fenômeno, ao meu ver, está completo em seu princípio, mesmo antes de sua manifestação. Há zonas de escuridão, em que nos desanimam e que não gostamos nem de se quer olhar, e que no entanto nos atraem, e que inutilmente interrogamos; e que não é senão o nosso próprio passado.

Um outro exemplo que me ocorre, foi quando você estava falando sobre o professor de Nietzche, quando expunha alguns de seus postulados a respeito da insatisfação que ocorrem dentro do espírito humano. Reconheço ali uma verdade imperecível e, no final das contas, o Cogito que me trouxeste só tem sentido por meu próprio Cogito, eu nada pensaria dele se não tivesse em mim mesmo tudo aquilo que precisaria ter para pode inventá-lo. Sou quem atribuo como meta ao meu pensamento o retomar de todo movimento no sentido de redescobrir o Cogito, sou eu que verifico a cada momento a orientação de meu pensamento em direção daquilo tu querias me transmitir, foi preciso então que meu pensamento se antecipasse a si mesmo, para já encontrar tudo aquilo que procurava encontrar antes mesmo do Cogito que me trouxeste. É preciso defini-lo por esse estranho poder que ele tem de preceder-se e de lançar-se a si mesmo, de achar-se nas partes já a totalidade de si próprio. Portanto, se o próprio pensamento não colocasse nas coisas aquilo que em seguida encontraria nelas, de outra forma ele não teria poder sobre as coisas, e não as pensaria, ele seria apenas uma “ilusão insólita de pensamento”. É como que todo pensamento de algo fosse ao mesmo tempo consciência de si próprio, na falta do que ele não poderia, objetivamente manifestá-se, uma que vez estaria ausente o objeto de sua materialização.

O encontrar deste manancial ilimitado de Cogito nos coloca em contato com este estado superconsciente, onde tudo já se encontra pensado no imaginar do mundo a ser pensado. Se o Cogito me revela um novo modo de existência – a consciência de si é o próprio ser do espírito em exercício – que não deve nada ao tempo, é como um campo transcendental, onde as fermentas de mineração para exploração da profundidade do ser já estavam ali postas. Tenho a impressão de que a consciência constituinte é por principio única e universal. Se se quer sustentar que ela constitui para cada um de nós apenas um microcosmo, tem-se que conservar no Cogito o sentido de uma experiência existencial, que a priori o ser já é o ser ciente de si mesmo.

Jung, também entendia este manancial de "Cogito" como o inconsciente coletivo, descrevi-o como acervo das experiências do espírito humano no estrato existencial, e que estaria disponível como uma enorme biblioteca, onde cada época se encerra em várias enciclopédias. Mas para que esse oceano de conhecimento possa ser navegado é preciso mudar a técnica cientifica de investigação, uma vez que a racionalidade não se presta para compreender a forma de sua comunicação. Pois a comunicação que se faz no plano do inconsciente alcança-se por intuição utilizando-se para tanto uma linguagem simbólica não racional: são os arquétipos ou imagens primordiais. É o que os cientistas chamam de memórias hereditárias e os teólogos de lembranças de vidas passadas.

Por outro lado, a linguagem desnaturaliza o homem na medida que o afasta da sua natureza animalesca, colocando-o em contato com o domínio da reflexão e da autoconsciência, mediante o qual o ser humano cria o mundo junto com os outros. Todavia, existem civilizações em que seus membros vivenciam a plenitude de seu simbolismo, com o qual conseguem desenvolver uma linguagem própria, porém desassociada de racionalidade. E mesmo assim alguns de seus membros são capazes ainda sim de antever o futuro e imaginar o presente (os Xamãs).

Omena.

Ohhdin
Enviado por Ohhdin em 09/05/2010
Código do texto: T2246163