Carta para Francisco Cotrim

Então hoje eu procurei, curiosa e amigavelmente, alguns nomes na internet. E procurei pela tua família. Qual não foi a minha surpresa ao saber do teu falecimento! O quanto isso me entristeceu!

Vizinhos nos anos 60 e 70 no bairro central da Aclimação, em São Paulo, nossas casas eram praticamente defronte uma da outra. E como era bom o tempo em que não havia lugar para malícias e outros desencontros.

Eu não me lembro de, algum dia, ter conversado com você, mas eu era colega de classe do teu irmão, o Zé Roberto, mas que todos chamavam simplesmente de Cotrim. O engraçado Cotrim, pouco afeito aos estudos, mas de muito bom coração.

E eu te admirava muito, Francisco, pelo teu empenho, as tuas muitas tentativas de cursar Medicina. Você lutou muito! Foi um guerreiro! Hoje poucas são as pessoas que lutam como você por uma causa tão bela como a de estudar com tanto afinco e acreditar na profissão, na bendita tarefa de amenizar dores, salvar vidas!

E eu gostava de observar a tua família. Aos domingos, o teu pai voltava sempre da feira com duas sacolas carregadas de frutas. Invariavelmente! A sua mãe era professora já aposentada. Mulher de muita classe, quieta e caseira. Aos sábados à tarde ia à missa do Padre Antônio.

Numa das tardes de janeiro, eu me lembro, me debrucei na janela do quarto da frente e vi você chegando de carro com a família, lá de Santa Adélia, no interior. Você, no volante, conduzia a família. Você estava – finalmente – careca. Entrei rapidamente e avisei a minha mãe: “mãe, o Chico entrou na faculdade!” E foi uma alegria grande, mas meio quieta, pois não havia aproximação entre as famílias, apenas a formalidade do cumprimento! Mas nós torcíamos por você! Quantas vezes te vi chegar com passos apressados e com o jaleco branquíssimo pendurado no braço!

Depois nos mudamos, não nos vimos mais. Mas eu tenho certeza de que, como médico, você foi um dos melhores, o mais comprometido, atencioso e hábil no trato com os teus pacientes. Posso até imaginar isso porque você foi muito consciente na tua escolha. De longe, te dou os parabéns e deixo aqui a minha admiração, o meu respeito, a minha consideração e o enorme desejo de que esteja em paz, colhendo algumas coisas boas que você plantou. Tenho certeza de que o mundo ficou melhor com você. Um abraço e qualquer dia a gente se encontra e aí sim eu possa dizer o quanto te admirei.

Vera Moratta
Enviado por Vera Moratta em 09/06/2010
Reeditado em 11/07/2011
Código do texto: T2309892