Todos os Dias

Todos os dias sinto o meu coração a transbordar de amor por uma mulher.

Sinto-a, todos os dias, presente, ausente, constante.

Todos os dias tenho de esvaziar um pouco o coração para que não expluda de tanto amor.

Então, como um hábito, um vício, uma necessidade, dedico-lhe tempo, telefono-lhe, preocupo-me, confesso-lhe amor.

Todos os dias me regressam memórias de provas de amor que ela me deu. Sem cronologia, sem rigor, mas as memórias voltam sempre mais fortes e ela, sempre ela, sempre presente.

Certo dia liguei-lhe, naquele tempo jurássico quando não existiam telemóveis, e disse-lhe que a minha primeira filha ía nascer. Minutos depois ela já lá estava, com a minha filha nos braços. Ela gigante, a menina tão pequena. Disse-me que tudo ía correr bem. Tudo correu bem.

Outro dia chorei, confessando que a mulher que eu já não amava tinha ido embora. Ela disse-me que o amor nunca vai a lugar nenhum e que tudo ía a correr bem.

Todos os dias me lembro desta mulher que me abraçou todos os dias da minha vida. Todos os dias. Ao longe, ao perto.

Todos os dias penso que o amor que lhe dedico é pouco, apesar do coração que rebenta quando não a vejo, quando não a beijo.

Todos os dias quero que todos os dias sejam assim para sempre, tanto é o amor que lhe tenho.

Outro dia falei-lhe das saudades de um amigo nosso que já morreu e que era difícil viver com essa dor. Ela falou-me dos nossos amigos vivos e da alegria de ser verdade precisar tanto de alguém.

Todos os dias ela me ensinou uma palavra nova e até receitas de culinária.

Todos os dias discutimos política e futebol.

Todos os dias me lembro de quando ela leu a minha primeira notícia editada num jornal e como me ralhava por eu não querer fazer os recados.

Outro dia mandou-me parar o carro para comprar maracujás na rua. Eu não queria, barafustei e disse-lhe que era um bairro cheio de bandidos que nos podiam assaltar. Nesse sábado comemos, todos em família, mousse de maracujá e falamos do Benfica que tinha ganho por dois a zero a uma equipa que já me esqueci.

Todos os dias me lembro como ela ouviu as todas as minhas pequenas mentiras para justificar todos os meus grandes erros.

Todos os dias me lembro como ela sabe ouvir, como sabe perceber.

Todos os dias fico ciumento, estupefacto, do amor verdadeiro que ela tem por tanta outra gente, de todas as idades, de todos os sítios onde ela vai.

Outro dia falou-me de gostar de mim e eu acreditei. Acreditei que fosse verdade esse amor. Sempre acreditei.

Todos os dias preciso dela, dessa mulher, e todos os dias lhe digo que a amo.

Hoje, neste dia, no dia que ela regressa para casa, para a minha vida, não me canso de repetir que o meu coração transborda de amor e para que não expluda, escrevo esta mensagem a essa mulher que amo todos os dias da minha vida com profunda devoção.

Do teu filho,