APENAS UM ESCLARECIMENTO...


Recebi de um leitor o seguinte email:
Ângela.
Você está pedindo para dar notas e fazer comentário.
Você escreveu uma bonita poesia moderna.
Muito boa sua inspiração, porém, está bastante longe de ser um Soneto.
No Recanto das Letras, nós temos inúmeros poetas que escrevem na forma de um soneto,
e pensam que estão escrevendo um soneto. Soneto, tem 3 regras que são obrigatórias:
Métrica, Rimas em locais determinados e Sílaba tônica, também em lugar obrigatório.
Não é qualquer 4-4-3-3, que só pela sua forma vira soneto.
Eu tenho um BLOG que ensina como se escreve um soneto decassílabo. Se você quiser aprender, entre em:" ---------------------------------------Não fique aborrecida comigo, eu sempre ajudo na correção de vários sonetos de vários poetas do Recanto. Em minha página, existe a explicação total de como se deve escrever uma trova, está em TROVA - 4,
Fazer uma explicação total sobre Soneto, não seria possível, tanto que no meu blog eu explico apenas o Decassílabo.
Sua inspiração é magnífica. Um forte abraço e fique com Deus.
Nota: não cito o nome nem endereço para não criar polêmica e citar o que não pedi licença para divulgar.
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A poesia em questão é o soneto Veneno do Tempo.
Como escrevo minhas poesias de forma espontânea, fiquei interessada em saber de um catedrático em Letras e Literatura como ele avaliaria minha obra. Recebi hoje a análise do ilustre professor João Ferreira, ex-professor de Literatura da UNB, a quem agradeço o trabalho:

O VENENO DO TEMPO
Ângela Faria de Paula Lima
19 de março de 2012

Tabaco, café, álcool, estricnina
Não passam de poções bem diluídas...
O veneno maior e infalível
É o Tempo, que governa as nossas vidas!...

Essa taça colocada em nossos lábios
Transforma-nos em seres encantados...
Ela abre os sentidos, dá poder
Povoa-nos de sonhos exaltados

Os que tomam altas doses se embriagam
Perdem força, beleza e sentidos
E terminam em sonhos de delírio...

E os poetas que adiam seus poemas
Descobrem, tarde, que o talento literário
É um frêmito infantil que jaz perdido!....

19/03/2012

CLASSIFICAÇÃO FORMAL DO POEMA
O gênero poético escolhido pela autora é o do soneto clássico, também conhecido pelo nome de soneto petrarquiano, formado por 14 versos, distribuídos por duas quadras e dois tercetos em decassílabos, com rima.

TEMÁTICA CENTRAL DO SONETO
A temática central do poema é o tempo. Metaforicamente, o tempo é comparado a um veneno que governa a vida do Poeta. Seu efeito é tão grande que transforma as vidas: abre os sentidos, dá poder, leva o homem a sonhar. À medida que o tempo vai avançando, o homem vai perdendo força, beleza e seus sonhos se transformam em delírio. O efeito do tempo sobre o poeta é tão nefasto que atinge sua própria capacidade de produzir a arte poética - o que o leva a descobrir bem tarde que "o talento literário é um frêmito infantil que jaz perdido".

COMENTÁRIO À TEMÁTICA CENTRAL DO SONETO
É difícil de aceitar que o talento literário seja próprio ou exclusivo da idade jovem. Admite-se que o tempo tem seus efeitos gerais sobre a atividade criativa do homem. Mas isso é relativo. O talento literário pode manifestar-se em qualquer idade, dependendo do estado de capacidade e de conservação das faculdades de produção e de disposição do artista e do poeta em escrever. O tempo assim como a experiência e o talento com amadurecimento são dados importantes que condicionam muitas produções literárias. Mas na verdade, o talento literário nasce, desperta e explode quando tem que nascer, despertar ou explodir. Há obras da humanidade escritas em idade avançada. Há poetas em todas as literaturas que criaram suas obras quando eram jovens e passaram depois a escrever prosa em sua idade avançada.E há também o contrário: poetas que foram ficcionistas, ensaístas, pensadores e filósofos e que produziram obra poética no fim da vida.
Dito isto, poderemos encontrar casos em que escritores descobriram em idade avançada que o tempo se escoou em suas cabeças e que não têm mais talento nem disposição para criar obras literárias, poemas, ou obra artística. Mas, ao lado, existem, contrastivamente outros poetas, ou outros escritores, artistas literários, teatrólogos, críticos e ficcionistas que continuam a produzir obra de grande qualidade em idade avançada. Gil Vicente, fundador do teatro ibérico, por exemplo, tem grande produção teatral ainda nos últimos anos de vida. Machado publica sua obra-prima Dom Casmurro com 60 anos (1899). Manuel Bandeira escreveu Itinerário para Pasárgada já com muita idade. Carlos Drummond de Andrade escreve poesia aos setenta e oito anos (A Paixão Medida, 1980).
Adiar a escrita, adiar a composição poética ou o sonho de escrever pode ser um propósito ou até um acaso. Mas não é necessariamente porque o "talento literário" seja privilégio exclusivo do "frêmito infantil".

João Ferreira
7 de abril de 2012