Ando procurando por rastros teus.

Cada gole de whiskey que tomava descia queimando minha garganta. Cada gole me trazia lembranças. Lembranças de como você costumava se embriagar comigo sentado no chão frio e marrom da minha sala, todos as vezes que a solidão batia em nossa vida sem graça, digamos, todos os dias. Me lembro de teus olhos profundos, dilatando a cada dose. Teu sorriso inebriado, inalcançável. Teus lábios com gosto de bêbado tocando os meus suavemente, se distanciando cada vez mais, sumindo em cada suspiro. Suas mãos sem rumo pelo meu corpo.

Mas hoje não te tenho mais. Hoje não tenho mais a honra de te ver estirado em minha sala na manhã seguinte de nossa farra, e sentir teu cheiro espalhado pelo corredor.Você foi vazando e me deixou em cacos, como a louça que você quebrou, no dia em que dormiu pela primeira vez na minha casa. Estava cansado, zonzo, tinha passado a noite em claro junto a mim. Lembro que passávamos várias noites juntos, na qual você me contava de como teu lugar preferido era a livraria e como a atendente morria de amores por você e o deixava ler os livros que ali se encontravam sem pagar por nenhum. Sobre como se aventurava pulando o muro da escola para comprar alguns cigarros. Sobre como você achava meu sorriso torto o mais belo, e se afundava em meu pescoço para sentir meu cheiro de flor.

Não sei como você conseguiu escapar pelos meus dedos fechados com tanta força, só sei que o seu suor ficou pelos meus lençóis e me recuso a lava-los. Ando vasculhando as bibliotecas por ai, para ver se ainda encontro rastros teus. Rastros teus que já não se encontram mais no chão frio da minha sala.