Cartas para Leila (Parte 1)

Os pássaros cantam, é madrugada. Nem estranhei o fato - hoje em dia, tudo é normal, afinal. A solidão bateu na porta, pediu licença e entrou. Sentou-se ao meu lado e permaneceu em silêncio. Resolvi escrever para Leila.

"Cara amiga,

Por aqui não se sabe se faz frio ou calor. Aliás, por aqui, nada se sabe, somente que o humano não é confiável. Sim, hoje tive mais uma prova disso.

No trabalho, mais um tapete puxado. E são poucos meses de empresa, hein, Leila. 'Muita corda dada, pessoa enforcada', já dizia a Dona Tereza da cantina... Agora, vou manter os olhos abertos e os sorrisos fechados. Ah que saudades das nossas risadas francas...

Mas vamos falar de coisas mais amenas... O final de semana foi repleto de sol! Lembra como brincávamos o dia todo depois da escola? Sinto saudades da tranquilidade da nossa cidadezinha. Fui passear num parque, onde havia antes um presídio. Soa um tanto estranho, eu sei. Mas o lugar é bem tranquilo, até. Observei as pessoas que passavam... casais, estudantes, moradores de rua. Um grupo barulhento - sim, eles estão em toda parte! - tocava algo que eles pensavam ser música (coitados dos tambores). Meninas semi-nuas se comportando como mulheres vulgares... Concluí que estou ficando velha. A sua Mary já não é mais a mesma. Tenho a sensação de que estou ficando para trás, deixada de lado, esquecida, velha, inútil. Onde estão os valores dessa gente, Leiloca? Tenho apenas 33 e parece que já passo dos oitenta!

Queria falar com o velho Richard... Suas palavras me guiavam, mas há tempos ele silenciou.

Me sinto perdida. A cidade me assusta. Mas vou tentar sobreviver.

Mande beijos para o Renato, diga que sinto saudades dos nossos papos ao entardecer, na varanda.

Beijos,

Mary - Marina"

Fernanda Bess
Enviado por Fernanda Bess em 14/08/2012
Código do texto: T3829337
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