Para o café (carta)

Só de brincadeirinha vou fingir que te verei amanhã; vou fingir que nada mudou e que ainda estás ao alcance dos meus abraços... depois, vou planejar o meu dia tentando não pensar. Vou viver cada minuto dessas 24 horas tentando fingir que nada mudou e esperando a hora de te ver, como todos os dias, após o término das nossas lutas diárias, há tantos anos...quantos? nem lembro mais...parece que são milhares deles; algumas encarnações... Mas houve um imprevisto, creio, e à hora de sempre tu não estavas lá. Mas ainda acho que vou dormir dentro dos teus braços, foi só um pequeno atraso...e chegarás de mansinho com cuidado para não me acordar, deitarás ao meu lado e passarás a perna esquerda sobre mim como fazes todas as noites; a tua perna pesa sobre o meu ventre e sinto vir à tona um calor que me sufoca e quase me consome, e se alastra fazendo crescer a labareda imortal que há entre nós. Mal penso em ti me sinto quase incapaz de controlar esse sentimento profano e inexplicavelmente sagrado. Sinto uma vontade quase irreprimível de te tocar, mas ressonas tão entregue e tranquilo que não consigo te acordar, e penso...penso que não tenho o direito de invadir a tua placidez quase inocente, e me deixas presa sob tua perna esquerda como se tivesses medo que eu pudesse fugir... Durmo aconchegada ao teu lado direito como se teus braços fossem asas a me abrigar; parecemos ter apenas um unico tronco tão unidos adormecemos...Então, abro os olhos de manhã, preocupada com o horário do trabalho e não te vejo, prendendo-me com tua perna esquerda...

Não chegaste? onde foste? deixei-te um bilhete; tu o leste? o sono me abateu antes que tivesses chegado...que pena, nem percebi o teu abraço e o aconchego do peso da tua perna...

P.S. Então, nos veremos amanhã para o cafe?

Guacira Maciel
Enviado por Guacira Maciel em 28/12/2012
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