CARTA A UM AMIGO!!!

O "Povo na Rua" me trouxe um saudosismo. Sabes que não sou disso. Mas entre um gole de uísque e outro, bateu-me uma saudade dos velhos tempos e me veio à lembrança alguns momentos que passamos juntos, como aquela viaje que fizemos ao Chile. Alguns episódios ainda estão bem vivos na minha mente, e creio que na sua também. Primeiro, o jato que íamos pego de surpresa por uma tempestade de ventos num céu de brigadeiro - íamos ser sepultados nos Andes -, depois o sequestro pelos estudantes chilenos.

Mas um gole e faço-lhe lembrar tudo:

Tínhamos saído do Rio de Janeiro e passáramos por Buenos Aires, a única escala prevista, num vôo absolutamente rotineiro, que transcorria num esplêndido dia de sol (com “céu de brigadeiro”), sem nenhuma turbulência. Pouco depois que saímos da Argentina, já nas Cordilheiras dos Andes, fomos surpreendidos por uma violenta tempestade de ventos cruzados que acometeram a aeronave sem qualquer indicação prévia; tanto assim que a tripulação desempenhava tarefas habituais como o recolhimento das bandejas já servidas para o almoço.

A experiência foi única para todos que estavam naquela aeronave: tenebrosa, mas divertida para nós, acostumados a brincar com a morte e vencê-la. Varrido pela fúria dos ventos o jato se transformou num incontrolável joguete, submetido a oscilações tão bruscas e poderosas que poderiam ter comprometido – como depois que tudo passou, soubemos – a sua estrutura metálica, partindo-o ao meio.

O descontrole do jato era tão absoluto que basta dizer – pra encurtar conversa – um dos passageiros, de meia idade, quebrou a perna quando surpreendido no banheiro. Você estava numa das janelas e morria de rir como um louco, enquanto a maioria estava apavorada. Na verdade nada entendíamos, porque o céu estava límpido, sol brilhante, sem nenhuma previsão de tempestades; a tripulação, surpreendida, fazia o possível para acalmar os passageiros enquanto a tempestade cada vez mais aumentava. Os ventos se cruzavam em sentidos diferentes com tal violência que o piloto não conseguia controlar a aeronave, que a cada momento poderia se partir ao meio e cair.

Todos estavam apavorados, menos você, que parecia desejar a queda do jato. Tamanha era a força da tempestade que as asas da aeronave oscilava para cima e para baixo como se fosse um pássaro ferido buscando equilíbrio entre aquela turbulência toda.

Após termos conseguido sair da zona de turbulência, da tempestade de ventos, o piloto nos disse que aquele fenômeno é muito raro acontecer, mas que tivemos sorte, porque a maioria dos aviões não suportam a tempestade e sãos partidos em pedaços. Chegamos ao Chile são e salvos.

Estava acontecendo um evento na Faculdade de Ciências Sociais, e resolvemos irmos lá. Nos apresentamos como jornalistas brasileiros, a hostilidade já na portaria dizia que lá dentro seria pior. O Chile estava fervendo de ideologia, pregava-se luta armada abertamente (particularmente os estudantes). Então cismamos de entrevistar um grupo que parecia mais radical. De repente fomos cercados por jovens armados que, nos empurrando, nos jogou num furgão. Todos estavam mascarados. Um só falava. Nos meteram um saco em nossas cabeças e pronto, apenas sabíamos que estávamos rodando por Santiago, ou talvez já fora da metrópole.

Chegaram em um lugar qualquer e pararam. Nos tiraram os capuz e nos empurram para uma sala onde estavam três estudante com barbas ralas, apresentando terem entre 18 e 20 anos. Tentavam falar grosso para intimidar: - Si usted és un agente imperialista nosotros le fuzilaremos! – Você sorriu e disse que éramos jornalistas de esquerda brasileiros. Por causa disso passamos 5 dias detidos por aqueles estudantes estúpidos. Podíamos tê-los matados... Mas eram crianças, não sabiam com o quê, nem com quem estavam lidando...

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Enviado por \\\\ em 02/07/2013
Reeditado em 02/07/2013
Código do texto: T4368136
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