Ainda sei sofrer por amor

Se não for pedir muito, sente-se e sinta o que tenho para lhe dizer.

Sei que nesse instante, segura minha carta, com as mesmas mãos que ainda possuem minhas digitais absorvidas em cada linha.

Sei que agora, sente o mesmo perfume que usei pela primeira vez ao nos encontrarmos.

Sinto que seu coração bate com a mesma intensidade com que eu ouvia, ao deitar em seu peito.

Pode abrir agora, e leia tudo. Leia os momentos de insegurança, o frio na barriga...

Veja que na terceira linha, relembro contente o dia em que rimos até doer a barriga em frente à tv.

Repare na segunda estrofe, como eu fingia ficar irritada, quando você bagunçava meu cabelo.

Olhe todas as vezes em que a gente se abraçava pra falar mal do mundo.

Alí no canto esquerdo, tem o desenho de algo que não sei bem o que é, mas que em algum momento representou a vontade de falar contigo todas as manhas.

E como conclusão, leia com atenção o que meu pulso se fez forçar pra se arrastar nessa alma de papel...

Eu tive de ir embora.

Precisei deixá-lo em seu mundo o qual eu nunca iria fazer parte.

Cansei de implorar um simples beijo, enquanto as veias de meu pescoço irrigavam uma esperança perdida de sentir seus lábios de encontro aos meus.

Ouço todos os dias, pessoas que se acham felizes, me dizerem que sou muito nova, que isso vai passar, que há dores maiores no mundo, que há fórmulas mágicas de o ter de volta.

Mas só quero ficar aqui, presa a esta carta que será a última parte de mim que você terá, não quero crer que o amor seja tão cruel a ponto de se perder a cada ano que se passa, não quero deixar de lado, meu direito de sofrer mais um pouco e de amar minha dor só por um instante.

Não quero ter de dizer o que era preciso para você ter me amado.

Não quero que me mantenha por mais tempo em sua memória.

Quero seguir, com meu pranto, com meu encanto, com meu dom de amar.

Quero ser diferente, e prometo ser guardiã da arte milenar do amor e, como só há um frasco, prometo ser justa e entregar pequenas gotas à quem provar ser um guerreiro.

À quem souber sentir o outro com o coração.

Sem fórmulas de realidade, sem ceticismo de pessoas atuais.

Só coração.

A carta está vazia, eu sei.

Aceito devolução.