Diagrama de Venn, Chapecoense, Rótulos e Ossos

Eu sempre fui uma criança deslocada. Até os meus 15 anos nunca fiz amigos e nunca me senti parte de um grupo. Se a vida fosse um Diagrama de Venn, eu seria o valor de fora, que só fica observando as diversas intersecções. A infância nem sempre é a melhor fase da vida de alguém. Eu sempre fui muito amado pelos meus pais, mas nós sabemos que criança nenhuma vive só de amor dos pais, e que as amizades do mundo à fora são necessárias para nos moldar como cidadãos. E justo nessa época, quando começamos nos moldar, muitas crianças acabam sendo más conosco. Não más por vontade própria, mas más porque é o que o mundo nos ensina, que nós sempre devemos ser melhores, e que os mais fracos serão subjugados. E muitas crianças e jovens foram maus comigo durante minha fase na escola, e acabei me afastando de todos por isso.

Nós sempre estamos em busca de aceitação, de fazer parte de um grupo. O que eu não entendia era que existem os mais diversos grupos por aí esperando para nos acolher, e que nós não precisamos mudar para nos encaixarmos em um grupo que no fundo não nos pertence.

No ensino médio eu fiz uma amiga, e ela tinha amigos. E eu fiz amizade com esses amigos. E essas novas pessoas na minha vida me apresentaram outras pessoas, e todas essas novas conexões me abriram as portas para um novo mundo. Um mundo que eu sempre soube que eu pertencia, mas que eu não conhecia. E foi ali que eu percebi que eu fazia parte de um grupo. Pode parecer bobeira, mas a alegria deles é a minha alegria, suas dores são a minha dor, sua raiva é a minha raiva e suas tristezas também são minha tristeza. Você percebe que você é de um grupo quando uma pessoa do outro lado do mundo está sofrendo e você entende e sente o sofrimento dela. Quando uma pessoa que você nunca viu na vida está feliz, e só de ver a felicidade dela isso já te faz feliz. Isso é empatia. Empatia por pessoas que você entende e que também te entendem.

OK. Agora eu finalmente tenho um grupo.

O avião do Chapecoense caiu. Eu passei a noite chorando por causa disso, e cada vez que eu via uma foto do acidente, um vídeo dos jogadores ou qualquer coisa relacionada ao acontecimento eu sentia uma dor horrível no peito. Mas espera. Eu não sou Catarinense, não sou fã do Chape, não sou da família de nenhum jogador. Por que eu fiquei triste?

E foi aí que caiu a ficha. Todos nós estamos em um grande grupo. A dor dos outros é a nossa dor. A alegria dos outros é a nossa alegria. Porque todos somos humanos. Se você é negro, branco, gay, hétero, cis, trans, gaúcho, cearense, ateu, judeu. Você é humano. Quando morremos, a pele vai e o que fica é osso, e no osso somos todos iguais. O que nos falta é um pouco mais de entendimento. Entendimento para ver que aquele grupo que nos é importante é muito menor perto do grupo que realmente faz a diferença. E o Grande Grupo faz a diferença. Quando ele foi ignorado surgiu o nazismo. O Apartheid. E ainda estão por vir outros movimentos que se baseiam no simples fato de que pessoas não conseguem enxergar que outras pessoas são pessoas!

Na minha opinião, é quando fizermos isso que teremos a verdadeira paz. Quando olharmos para as pessoas e não virmos mais rótulos, mas quando virmos ossos cobertos de vida. É aí que o "amar o próximo como a ti mesmo" vai ser realmente executado.