Uma carta para a mamãe

Eu sei que a princípio a mamãe não me queria. Passou tantas coisas em sua cabeça quando ela descobriu que estava me esperando. O momento foi de desespero. Pensou mil coisas não é mesmo? Eu senti aquele medo em todo momento. A mamãe realmente não me queria. Eu a culpo? Não! Quando descobriu que estava grávida ela surtou, chorou, não sabia o que fazer, teve medo. Não medo de mim, mas de como as pessoas ao seu redor iriam falar. Não fui planejado como vocês perceberam. Ela me teve em uma noite de porre, nem lembra como tudo aconteceu. Talvez o desespero não era em me colocar ao mundo, mas da forma como tudo aconteceu. Ela sentiu um desprezo, um nojo tão grande daquele homem que seria meu pai, que não quis ter contato algum com ele. Eu a entendo. Ter um filho de alguém que ela não amava, que não a respeitou era realmente desesperador. Quando a mamãe descobriu que me esperava, ela no ato de desespero quis me matar. Acho que ela nem tinha ideia do grau daquela situação. Aquele dia deve ter sido o pior de sua vida. Um amigo dela lhe entregou uma planta que era abortiva. Ela realmente não me queria. Ao chegar do trabalho ela fez esse chá e reservou. As vezes nesses momentos difíceis da vida, um amigo seria importante naquele momento, e foi isso que aconteceu. A mamãe comentou com uma amiga e ela lhe aconselhou. No fundo percebi que o que ela tinha era só medo. Ela não teve coragem de beber o chá. A amiga da mamãe se preocupou com a situação e a chamou para ir ao hospital. Ela estava sentindo cólicas e tinha sangramentos. O médico a examinou, medicou e pediu que ela voltasse para casa. Se as dores e o sangramento se agravassem era para retornar. Assim foi feito. Mamãe voltou para casa e manteve toda a história ainda em segredo. Sabe aquele chá? Ainda estava reservado. Ela olhou, pensou e desistiu de tomar. Naquele momento eu senti que ela não ia mais me matar. Eu fiquei aliviado. Talvez ela não me amasse naquele momento, talvez ainda fosse medo, não sei. Algumas horas depois mamãe viu que o sangramento aumentou, e a dor piorou. Ela mal andava. Ela chamou um amigo a qual gostava muito e pediu que a levasse ao hospital novamente. Naquele momento, os segredos iam deixando de ser segredos. Talvez desabafar a deixaria mais calma, o sentimento de culpa sairia da sua cabeça. E assim foi feito. Já era de se esperar que ela seria internada. Foi novamente examinada e naquele hospital ficou. Foi uma noite difícil, passou muitas coisas em sua cabeça. Acho que a ficha da mamãe estava caindo. Ela finalmente percebeu naquele momento que seria mãe.

Naquela manhã seguinte, ela não teve escolha e já não era mais um segredo. Ela precisava de pessoas ao seu lado. Naquele dia a mamãe fez sua primeira ecografia. Ela escutou meus batimentos cardíacos, eu estava vivo. O que ela não imaginava é que eu não estava em seu útero. Eu não ia poder viver. Não sei o que passou na cabeça dela naquele momento. Escutar meu coração e saber que eu não ia poder sobreviver, talvez teria sido um choque, ou ela nem sabia da gravidade do que estava acontecendo. Naquele momento eu imagino que passou uma fita na cabeça dela. Eu sei que ela não me queria, mas também não teve a coragem de me matar. Eu tenho certeza que ela ia se conformar, me veria crescer em seu ventre e já ia aprender a me amar. Ela é uma boa mulher. Eu a amava, e sabia que ela também me amaria, mas isso não aconteceu. A gravidez seria interrompida pelos médicos. Me conforta saber que seria por eles e não por ela. O que me importava naquele momento em diante era a saúde da mamãe. Agora era a minha vez de cuidar dela. Ela ficou internada por alguns dias, tomou uma medicação para a gravidez ser interrompida.

Deus estava com ela naquele lugar. Ele escutou as suas súplicas e seu pedido de ajuda. Ela sentiu tanta dor, tanto medo, chorava tanto. Ela não se sentiu sozinha. Uma certeza que ela tinha era que Deus estava ao seu lado, cuidando de toda a situação. Ela tocava em sua barriga, e me pedia desculpas. Eu não precisava perdoá-la. Eu sabia que toda essa situação era medo. No ato do desespero, as pessoas costumam fazer coisas erradas, e ela foi apenas mais uma.

Eu não sobrevivi mamãe, mas sei que você aprendeu com toda essa situação. Deus te ensinou porque ele realmente te ama. Não se preocupe comigo, estou bem. Não se culpe por nada, eu te entendo. Que você fique aos cuidados de Deus, porque eu sei que ele cuida bem de você. Eu sempre te amarei!

DEIDI
Enviado por DEIDI em 25/08/2019
Reeditado em 25/08/2019
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